O ano é novo. Seja nova a vida!
1. A esta hora, estamos todos a pensar: como correu veloz mais este ano!
Sem darmos muito bem por isso, 2009 está a chegar ao fim. E, a avaliar pela expressão do rosto e pelo teor das conversas, a euforia destas horas serve mais de lenitivo para esquecer as amarguras passadas do que de esperança numa verdadeira mudança.
Nem que seja por instantes, o que, de facto, as pessoas querem é esquecer a dureza do quotidiano, a incerteza do emprego (ou a certeza do desemprego), os aumentos dos preços e a míngua dos salários.
O que as pessoas desejam é esquecer os sonhos desfeitos e as promessas não cumpridas.
O ar de resignação e o tom de comiseração parecem ser a nota dominante. A melhor maneira de não haver desilusões é, sem dúvida, não alimentar ilusões.
No início de 2009, o senhor Presidente da República já nos prevenira para o que já sabíamos e pressentíamos. Que o ano iria ser muito difícil. Que, por isso, era fundamental falar verdade. E, last but not the least, que as ilusões pagar-se-iam muito caras.
Na mesma altura, Timothy Garton Ash fazia uso de uma ironia afogada em sarcasmo: «Bom ano novo? Devem estar a brincar!».
2. Há uma sensação de desnorte e um clima de tédio. Até tivemos um Nobel da Paz que, ao receber o prémio, anunciou a continuação da guerra!
Inevitável? Porventura. Mas, ainda assim, não deixa de ser perturbador e revelador do estado a que chegamos.
E, mesmo a terminar o ano, não fomos capazes de conseguir um acordo motivador para reduzir substancialmente a poluição.
Em síntese, não estamos a ganhar o presente. E arriscamo-nos a perder o futuro.
Se bem nos recordamos, o Santo Padre convidava-nos, há um ano, a combater a pobreza e a lutar contra a exclusão.
Denunciou «uma pobreza que impede as pessoas e as famílias de viverem segundo a sua dignidade; uma pobreza que ofende a justiça e a igualdade e que, como tal, ameaça a convivência pacífica».
3. Para 2010, chama a nossa atenção para a nossa responsabilidade na salvaguarda da criação: «Se queres cultivar a paz — alerta o Papa —, protege a criação».
O mundo não é propriedade humana; é dom de Deus que foi confiado ao Homem, a todos os homens e não apenas a alguns.
Como revelou a recente Cimeira de Copenhaga, a nossa geração está a revelar um tremendo egoísmo para com as futuras gerações.
Os escuteiros têm, como preceito, deixar o lugar do acampamento em melhor estado que aquele em que se encontrava. Em que estado vamos nós deixar o mundo às gerações futuras?
Em causa estão não somente o ambiente natural, mas também — e acima tudo — o ambiente humano.
Pergunta Bento XVI com enorme pertinência: «Poderemos ficar indiferentes perante as alterações climáticas, a desertificação, a deterioração e a perda de produtividade de vastas áreas agrícolas, a poluição dos rios e dos lençóis de água, o aumento de calamidades naturais, a desflorestação das áreas equatoriais e tropicais?»
E alerta já para um fenómeno novo, emergente: «Como descurar o fenómeno crescente dos chamados refugiados ambientais, ou seja, pessoas que, por causa da degradação do ambiente onde vivem, se vêem obrigadas a abandoná-lo — deixando lá muitas vezes também os seus bens — tendo de enfrentar os perigos e as incógnitas de uma deslocação forçada?»
4. Não será a transição de um ano para outro que faz desaparecer as nuvens que toldam o horizonte do nosso futuro.
Sentimo-nos impotentes para fazer o que tem de ser feito. Mas vale a pena insistir. Se empreendermos a mudança em nós, se formos diferentes, estaremos a contribuir para a mudança no mundo.
Deseje, pois, feliz ano novo aos seus familiares, aos seus amigos e aos seus conhecidos.
Eu vou rezar por si. Passarei o ano na companhia de Deus, em oração, como é meu dever.
Pode faltar tudo. Tenha a certeza de que Deus não lhe vai faltar. O ano é novo. Que seja igualmente nova a vida. A sua vida. A nossa vida. A vida da humanidade inteira.
João António Pinheiro Teixeira
padre
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