Jornal de Opinião

São muitos os textos enviados para a Agência Ecclesia com pedido de publicação. De diferentes personalidades e contextos sociais e eclesiais, o seu conteúdo é exclusivamente da responsabilidade dos seus autores. São esses textos que aqui se publicam, sem que afectem critérios editoriais da Agência Ecclesia. Trata-se de um espaço de divulgação da opinião assinada e assumida, contribuindo para o debate de ideias, que a internet possibilita.

30/12/09

O ano é novo. Seja nova a vida!

1. A esta hora, estamos todos a pensar: como correu veloz mais este ano!
Sem darmos muito bem por isso, 2009 está a chegar ao fim. E, a avaliar pela expressão do rosto e pelo teor das conversas, a euforia destas horas serve mais de lenitivo para esquecer as amarguras passadas do que de esperança numa verdadeira mudança.
Nem que seja por instantes, o que, de facto, as pessoas querem é esquecer a dureza do quotidiano, a incerteza do emprego (ou a certeza do desemprego), os aumentos dos preços e a míngua dos salários.

O que as pessoas desejam é esquecer os sonhos desfeitos e as promessas não cumpridas.
O ar de resignação e o tom de comiseração parecem ser a nota dominante. A melhor maneira de não haver desilusões é, sem dúvida, não alimentar ilusões.

No início de 2009, o senhor Presidente da República já nos prevenira para o que já sabíamos e pressentíamos. Que o ano iria ser muito difícil. Que, por isso, era fundamental falar verdade. E, last but not the least, que as ilusões pagar-se-iam muito caras.

Na mesma altura, Timothy Garton Ash fazia uso de uma ironia afogada em sarcasmo: «Bom ano novo? Devem estar a brincar!».

2. Há uma sensação de desnorte e um clima de tédio. Até tivemos um Nobel da Paz que, ao receber o prémio, anunciou a continuação da guerra!

Inevitável? Porventura. Mas, ainda assim, não deixa de ser perturbador e revelador do estado a que chegamos.

E, mesmo a terminar o ano, não fomos capazes de conseguir um acordo motivador para reduzir substancialmente a poluição.

Em síntese, não estamos a ganhar o presente. E arriscamo-nos a perder o futuro.
Se bem nos recordamos, o Santo Padre convidava-nos, há um ano, a combater a pobreza e a lutar contra a exclusão.

Denunciou «uma pobreza que impede as pessoas e as famílias de viverem segundo a sua dignidade; uma pobreza que ofende a justiça e a igualdade e que, como tal, ameaça a convivência pacífica».

3. Para 2010, chama a nossa atenção para a nossa responsabilidade na salvaguarda da criação: «Se queres cultivar a paz — alerta o Papa —, protege a criação».
O mundo não é propriedade humana; é dom de Deus que foi confiado ao Homem, a todos os homens e não apenas a alguns.

Como revelou a recente Cimeira de Copenhaga, a nossa geração está a revelar um tremendo egoísmo para com as futuras gerações.

Os escuteiros têm, como preceito, deixar o lugar do acampamento em melhor estado que aquele em que se encontrava. Em que estado vamos nós deixar o mundo às gerações futuras?

Em causa estão não somente o ambiente natural, mas também — e acima tudo — o ambiente humano.

Pergunta Bento XVI com enorme pertinência: «Poderemos ficar indiferentes perante as alterações climáticas, a desertificação, a deterioração e a perda de produtividade de vastas áreas agrícolas, a poluição dos rios e dos lençóis de água, o aumento de calamidades naturais, a desflorestação das áreas equatoriais e tropicais?»

E alerta já para um fenómeno novo, emergente: «Como descurar o fenómeno crescente dos chamados refugiados ambientais, ou seja, pessoas que, por causa da degradação do ambiente onde vivem, se vêem obrigadas a abandoná-lo — deixando lá muitas vezes também os seus bens — tendo de enfrentar os perigos e as incógnitas de uma deslocação forçada?»

4. Não será a transição de um ano para outro que faz desaparecer as nuvens que toldam o horizonte do nosso futuro.

Sentimo-nos impotentes para fazer o que tem de ser feito. Mas vale a pena insistir. Se empreendermos a mudança em nós, se formos diferentes, estaremos a contribuir para a mudança no mundo.

Deseje, pois, feliz ano novo aos seus familiares, aos seus amigos e aos seus conhecidos.

Eu vou rezar por si. Passarei o ano na companhia de Deus, em oração, como é meu dever.

Pode faltar tudo. Tenha a certeza de que Deus não lhe vai faltar. O ano é novo. Que seja igualmente nova a vida. A sua vida. A nossa vida. A vida da humanidade inteira.


João António Pinheiro Teixeira
padre



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24/12/09

O nascimento é Dele, o Natal é para si

1. É possível que, a esta hora, o vá encontrar, estimado leitor, em viagem, a caminho de casa ou de algum supermercado. Provavelmente, ter-se-á lembrado de que ainda faltava alguma compra de última hora.

A azáfama é grande e as despesas já são muitas. Mas, lá no fundo, sente que vale a pena todos os sacrifícios para ter a casa cheia, a mesa farta e a família reunida.

É bonito -- muito bonito -- ver os mais pequenos felizes e os mais idosos a brincar com eles.

E como é reconfortante ter um intervalo de serenidade no meio do bulício desenfreado em que se transformou a rotina da nossa vida!

Vai correr tudo bem, estou certo disso. A noite de Natal possui, de facto, um encantamento único, intraduzível em palavras.


2. Não tenha problema em assumir que o Natal é a festa de Jesus. É a festa do Seu nascimento, embora não saibamos, ao certo, a data em que Ele nasceu.

Às vezes, o Natal parece um aniversário sem aniversariante. Pensamos em todos e cuidamos de tudo. Parece que só nos esquecemos d'Ele. Logo d'Ele que é a razão última desta festa.

Até foi preciso lançar uma campanha de estandartes com o Menino Jesus para que nos lembremos do verdadeiro sentido do Natal.

Para muitos, com efeito, quando se fala de Natal, a primeira figura que vem à mente já não é o Menino, mas o Pai Natal.

Há quem leve o escrúpulo a tal ponto que, em vez de desejar bom Natal, se limita a escrever o genérico boas festas ou até a optar pelo estranhíssimo felizes festas de Inverno! Porquê?


3. Fixe, por isso, o seu olhar em Jesus. Não arrume o Pai Natal num canto, se o tiver em casa, mas faça um presépio.

Se achar bem, ponha lá a árvore de Natal. Ponha lá os presentes para os seus filhos, mas, já agora, acrescente também qualquer coisa para dar aos mais pobres.

Não deixe, porém, de colocar bem no centro o Menino, o Menino Jesus. E, antes de começar a consoada, convide toda a sua família para contemplar um pouco este quadro,o quadro de um Deus que Se faz Menino e de um Menino que se faz Deus.

Se lhe for possível, vá à Missa do Galo. Porventura, está a pensar ir no dia de Natal. E faz muito bem. Mas, se puder, vá também na noite anterior. Não se arrependerá.

É certo que está frio e sabe bem estar em casa. Mas faça um esforço. Alargue a sua família à família dos outros.

O frio desta noite é um frio saboroso, é um frio que aquece. Quando faz anos alguém que nós estimamos, passamos por sua casa. Pois a igreja é a casa de Jesus.


4. Penso sobretudo em si que está afectado pela pobreza. Pois olhe que Jesus também nasceu pobre.

Penso particularmente em si que se sente diminuído por levar uma vida simples. Lembre-se que Jesus foi sempre simples.

Penso especialmente em si que se vê cercado de injustiças. Não esqueça que Jesus também foi vítima da injustiça.

Ele é a pessoa mais identificada consigo e mais próxima de si. Ele pensa em si, mesmo quando não tem tempo de pensar n'Ele.

O meu coração vai nomeadamente ao encontro de si que foi posto na rua, no desemprego. Olhe que é na rua que Jesus Se encontra.

Ele tornou-Se um de nós. Ele veio para nos reconciliar, para nos aproximar.

O sinal de que estamos com Ele é a bondade, a tolerância, a opção preferencial pelos pobres.

Que a paz de Jesus esteja consigo, estimado leitor. Seja feliz neste Natal. Seja feliz sempre.

O nascimento é de Jesus. O Natal é para si. Por isso, alegre-se. Comova-se. Chore. Sorria. Cumprimente. Abrace. E tente fazer do Natal um dia com 365 dias.

Difícil? Sem dúvida. Mas não impossível. Há muitos escolhos. Mas tem um aliado de peso: o próprio Jesus.

Ele veio também para si. Ele está dentro de si. E tenha a certeza de que Ele conta consigo para mudar o mundo!

João António Pinheiro Teixeira
padre

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23/12/09

Deus Omnipotente

Mamã, conta-me uma história.

Não, essa não; essa também não; a do soldadinho de chumbo. Mamã, leva-me ao jardim, quero ver as borboletas. Oh! Não gosto desse lanche! Quero chocolate no leite. Hum! Afinal quero o leite sem chocolate.

Manuela, com um doce sorriso a tudo aquiescia, prontamente. Nunca tinha um momento de impaciência, uma palavra, ou um gesto, que denunciassem a sua fadiga. O marido notava-lhe a palidez do rosto e as olheiras fundas, que lhe circundavam os olhos, e sugeria-lhe uma emfermeira, para que tivesse um pouco de descanso. Mas Manuela abanava a cabeça. O seu lugar era ali, junto do filho. Rodeado dos seus carinhos, não sentiria tão profundamente, a desdita de ter que viver amarrado áquela horrível cadeira de rodas. Nascera tão perfeitinho, o seu Paulo, mas seis anos depois, uma queda desastrosa, paralisara-lhe as perninhas rosadas. "Não voltaria a andar," haviam-no dito os médicos, peremptóriamente, mas Manuela, apesar da sentença proferida, alimentava a esperança, baseada nos seus sentimentos religiosos, de voltar a ver o seu filhinho a andar. Sempre que lhe era possível, encerrava-se no oratório e rezava com fervor, diante das imagens dos santos da sua devoção. Dispensava-lhes particulares cuidados: limpava-as carinhosamente do pó, substituía as flores das jarrinhas, mesmo quando ainda estavam viçosas, e vigiava o azeite da lamparina para que esta se conservasse sempre acesa. Nelas depositava toda a sua fé e encontrava o bálsamo para a sua dor, que ali expandia sem reservas, deixando verter as lágrimas contidas. Um dia, porém, sucedeu o que ela nunca prevera. Levantara-se muito cedo e de mansinho, dirigira-se à salinha destinada à oração. Ao abrir a porta o que viu deixou-a estupefacta. Todas as suas imagens estavam partidas! A gravura emoldurada de uma santa, que havia muitos anos pendia daquela parede, caíra, ocasionando tão grande destruição! Pobre Manuela! Intensificou-se-lhe a palidez do rosto. Trémula, apanhou alguns pedaços de faiança, espalhados por toda a parte, as flores que jaziam junto às jarras, feitas em cacos, e a lamparina, finalmente, apagada. Tomada de uma terrível sensação de desamparo, de vazio, de desespêro, deixou-se cair numa cadeira, chorando convulsivamente. Quanto tempo teria ficado entregue áquele desânimo, se o chilrear dos pardais a não tivesse chamado à realidade?! Amanhecia. Paulo não tardaria a acordar e a reclamar a sua presença. Levantou-se, olhou através das vidraças e instintivamente, como se buscasse conforto, no belo quadro da natureza que se lhe oferecia e em que tanto se sentia todo o poder do seu Autor, abriu as portas que davam para o terraço, transpondo-as a passos vagarosos. A aragem fresca e perfumada daquele dia de Primavera, que vinha a despontar, envolveu-a numa carícia. olhou a imensidade do mar, que brilhava aos primeiros alvores da madrugada, o arvoredo verdejante que se erguia à sua frente. Levantou os olhos ao céu, que clareava, e assim permaneceu algum tempo, contemplando o firmamente, para além do qual estava Deus Omnipotente, Aquele que criara o mundo e tudo o que nele existe, O Eterno. E movida de súbito, por um profundo sentimento de confiança, n'O que também é todo mesericórdia e amor, ajoelhou-se e pediu pelo filho, elevando a voz magoada que, pouco a pouco foi deminuindo de intensidade, extinguindo-se por fim. Caída em êxtase, Manuela deixara de ver e ouvir o que se passava em seu redor, só a voz de Paulo a arrancaria ao seu arrebatamento. Caminhando para ela, com o rosto radiante de felicidade, estendia-lhe os braços exclamando: - mamã, mamã, olha para mim, vê como eu ando! O Sol nascera deslumbrando toda a terra, porém mais resplandecente ainda, fora aquela luz bendita, com que Deus iluminara a alma de Manuela...

Susana Maria Cardoso


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20/12/09

Ao Compasso do Tempo - Crónica de 18 de Dezembro de 2009

Leitura semanal dos problemas do Mundo e da Igreja

O Prémio Pessoa tem o relevo que tem. Na sua particularidade, honra pessoas, capacidades específicas e instituições. Os já premiados, e seus grémios culturais, enformam uma já vigorosa tradição.
Desse claustro de excelentes, faz hoje parte, por mérito, obra e estilo de viver, D. Manuel Clemente, Bispo do Porto. A simplicidade do que é, afasta as “moscas”, que, ao primeiro fulgor, querem fazer seu o que nunca lhes podia pertencer: a independência do pensar, a defesa da liberdade, o cuidado pelos mais pequenos, a abertura em detrimento de grupos inchados, o primado de tradições e seus lugares…
A cultura não se reduz a uma arca encoirada de saber, sendo este conteúdo uma sua característica. Mais que um depósito (saber de “história”, de “artes plásticas”, de sociologia ou música, de poética ou filosofia), é um estado de espírito, uma memória comum, uma sensibilidade à Verdade, ao Bem, à Beleza.
Mas, na hora da escolha, a “ética” e a “exclusão” foram terrenos apontados como critérios e combates de distinção. O bispo do Porto tem todo o mérito e o júri é soberano.
Na Igreja em Portugal há “corredores de maratona” nessa especialidade, tão pouco cultivada e tão atacada nas pessoas que ousaram! Ainda bem que esses combates não se opõem à canonização…
Da minha parte – e em nome da enorme amizade e consideração que nos vincula – expresso uma alegria tão grande como a multifacetada personalidade que foi reconhecida. É tão importante expressar o júbilo pela “vitória” dos outros. É tão singular o nosso entusiasmo diante do reconhecimento público de alguém da nossa família!
A responsabilidade a favor de uma cultura de mudança, de acordo com o Deus feito Homem, no Seu Natal, é algo que nos compromete. Pode soprar o vento. Podem “simbolizar” “casamento”, apagando dichotes malcriados…
Podem pretender igualizar quem sempre fez gala de ser diferente.
O optimismo e a descontracção são virtudes que uma criança um dia nos trouxe. Um Deus adormeceu. Um Deus acordou nesta Terra, Sua Obra.
Bom Natal, querida “malta que nos lê, apoia e de nós discorda, neste “Diário do Minho”, tão querido por todos nós! Não se deixem invadir por qualquer pessimismo. Digam-no, uns aos outros, na noite de Família, em 24 de Dezembro de 2009!


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Sinal maravilhoso que enche o presente e o futuro

Tempos atrás, a palavra solidariedade não era muito do agrado de pessoas desconfiadas das palavras que mexiam com sentimentos, por se pensar, então, que elas eram pouco evangélicas e poluidoras de tradições religiosas.
Para a baptizar, dado que cada dia se generalizava mais o seu uso, acrescentava-se à solidariedade a expressão “fraterna”. Assim não havia confusões e tentava-se para ela uma nova matriz, porventura menos laica. Também a gente grande que andava menos pelos espaços religiosos pretendia impô-la como um valor republicano, a contrastar com a caridade, de que então se falava com desprezo e displicência.
Estas guerrilhas de gente pequena foram ultrapassadas pelo tempo, que não respeita senão o que merece ser respeitado.
“A verdadeira solidariedade começa onde não se espera nada em troca”, diz o autor do “Principezinho”, António Saint Exupery, um coração lavado que deu valor à paciência de quem sabe esperar, aos pequenos gestos de amor, à sabedoria em todas as suas formas. Publicou-se há pouco um livro, cujo título é ilustrativo e caminho aberto para quem olha os outros e o mundo com sentimentos de irmão e de pessoa responsável. “Não há futuro sem solidariedade” – assim se intitula. O autor é Dionísio Tettamanzi, arcebispo de Milão.
Mas mais do que uma discussão de palavras, embora já ultrapassada, interessam os gestos que as traduzem em vida. Acabamos de ter conhecimento destes gestos bem eloquentes e significativos.
Apesar do tempo ser de crise, o Natal aquece os corações e tira-os da indiferença. Foi assim que o Banco Alimentar contra a Fome recolheu 2500 toneladas de alimentos, mais de 30% do que no ano passado. Em 1992 tinham-se recolhido 17,4 toneladas.
A operação Natal 2009 contou com a participação de 27 mil voluntários. O voluntariado social é, também, uma forma de solidariedade que muitos vão descobrindo e lhes permite uma melhor respiração interior, que vem sempre ao encontro de quem faz bem sem olhar a quem, e sem esperar em troca senão a alegria de que muitos beneficiaram de uma ajuda, anónima e discreta.
Já existem em Portugal 17 Bancos Alimentares, integrados nos 282 que há no mundo.
A solidariedade social é um dos sinais dos tempos, mais visíveis e eficazes, ao alcance de todos os que andam por aí de olhos abertos e não dispensam, no seu horizonte habitual, os feridos da vida, que os tempos que correm multiplicam em espiral.
Milhares de instituições de solidariedade, sem fins lucrativos, respondem, diariamente, a carências sociais de toda a ordem. Têm elas de se guardar da rotina e do desvirtuamento, sempre perigosos e à espreita, quando alguns apoios vêm do Estado que, por si, não faz caridade e condiciona, muitas vezes, a solidariedade a burocracias com pouca gratuidade e a interesses nem sempre claros.
O espírito do Natal alimenta a solidariedade e os gestos de generosidade e fraternidade. Não há que tirar-lhe esta riqueza, antes fazer que ela perdure, porque em todos os dias há gente que precisa e gente que pode ajudar. Os pobres, por exemplo, estão sempre disponíveis para ajudar sem papeis, sem juros, sem prazos, os mais pobres que eles.
Não sei, porque normalmente não se diz, se na contagem dos milhões de lucros das grandes empresas, privadas ou estatais, há prevista alguma alínea destinada aos pobres ou às instituições que deles cuidam todos os dias. Dar a quem precisa é um gesto extraordinariamente rentável, do qual há gente que nunca não se apercebeu.
Nada como pôr em prática, porque é este o modo pelo qual se mostra o valor das teorias.

António Marcelino


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Falando a Jesus no presépio

Estamos a breves dias da celebração do Natal de Jesus – Ele é o festejado, não podemos nunca esquecê-lo – colocamo-nos agora em diálogo com Jesus Menino em situação de presépio.
De forma simples nos dirigimos – cada um a seu modo ou segundo as suas circunstâncias – ao Menino Deus.

* Como filhos sentimos que temos um longo caminho a percorrer para sabermos viver em conformidade com a linguagem que de Jesus é irradiada: Ele é frágil, está necessitado de atenção, precisa de carinho... Assim, nós, filhos deste tempo, precisamos de quem nos faça crescer na maturidade, na serenidade e na confiança.

* Como pais reconhecemos que temos de caminhar na responsabilidade em sermos pais dignos dos filhos que Deus nos concedeu: eles são uma bênção e um compromisso em fazermos crescer pela vida além, respeitando cada um e amparando cada qual... Deste modo, nós, pais desta época, precisamos de ser ajudados pelos nossos filhos, aproveitando os seus conhecimentos mais actualizados e as suas descobertas de novidade.

* Como mães aceitamos a exigência de permanente reformulação da nossa presença na família, na sociedade, na profissão e na Igreja pelo acolhimento do dom da vida (biológica, psicológica, moral e espiritual): através de nós se derrama a vida como dádiva, como entrega, como missão de serviço aos outros... Assim, nós, mães deste tempo, precisamos de compreensão e de afecto de pais e de filhos para cumprirmos ainda melhor a tarefa de sermos coração divino neste mundo, por vezes, tão frio e anónimo.

* Como irmãos entendemos, à luz de Jesus Menino, a fraternidade que nos vem de um Deus feito homem e do homem divinizado: n’Ele, por Ele e com Ele criamos (ou devíamos criar conscientemente) uma família, onde todos se respeitam, se amparam e se acolhem... Deste modo, à luz de Jesus Menino sentimos que somos chamados a viver, nesta terra, um projecto de maior comunhão com todos, nos círculos concêntricos das nossas relações pessoais, familiares, profissionais, sociais, eclesiais... em abertura à diferença de sexos, de culturas, de povos e de nações.

* Como avós desejamos contribuir para a harmonia de gerações, respeitando e sendo respeitados. Diante do presépio podemos ver ‘velhos’ em romaria de proximidade à tão esperada vitória de Deus sobre as coisas passadas. Também nós, velhos deste tempo – que fomos novos noutras épocas – queremos sentir o afago dos nossos descendentes, evitando sermos atirados para o lixo humano em maré de arrumação. Diante de Jesus Menino ansiamos ser valorizados – quais crianças segunda vez – por todos, mas sobretudo pelos que nós cuidamos... Não nos deixem cair, por favor!

Nada melhor para interpretar o espírito do presépio – tendo Jesus no centro com Maria e José acompanhando – do que valorizar o Natal em família... até que ela tenha valor.

A. Sílvio Couto



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14/12/09

Até Deus quis ser criança

1. No princípio, era a inquietação. A inquietação estava com Deus. E a inquietação (espero que não se escandalize) era o próprio Deus.
Com efeito, quem ama, não ama só em si nem para si. Quem ama preocupa-se, solidariza-se, sai de si.
O amor que é Deus não cabe em Deus. Explode na criação. O big bang terá sido realidade e é seguramente sinal: sinal de um amor que explode permanentemente no mundo.
O mundo criado por Deus não é bom; é muito bom (cf. Gén 1, 31). Só que o Homem, coroa da criação, resolve complicar. Deslumbra-se consigo mesmo e afasta-se de Deus. Quer ser como Deus andando longe de Deus.
Depressa, porém, se apercebe do logro. Sente-se mal e tem medo. Sabe que, por si mesmo, não consegue reencontrar a relação quebrada e a felicidade perdida.

2. Este já não era um problema de Deus. Acontece que Deus não é frio. A Sua justiça tem calor, está adornada pela compaixão. Decide, então, ajudar o Homem. Fala a linguagem do Homem. E, como se não bastasse, faz-Se Homem.
Como diziam os escritores antigos, Um da Trindade fez-Se Um de nós. Para quê? Para nos reconduzir à felicidade, ou seja, a Ele, a Deus.
Sto. Ireneu sublinha, com uma ênfase para nós inesperada, que «o Filho de Deus fez-Se o que nós somos para que nós possamos ser o que Ele é».
Deus leva o Homem a sério, muito a sério. Diria mesmo que é preciso ser Deus para amar assim o Homem.

3. Seria necessário tanto? Deus, para nos salvar, podia fazer um simples decreto. Não é próprio de Deus ter poder para tudo?
Só que Ele quis vir até nós, morar connosco. Mas, nesse caso, poderia aparecer num palácio sob a figura de um rei. Sempre seria uma forma mais condizente com Deus, o rei dos reis.
Aliás, o Messias era esperado como sendo o continuador de David, aquele rei que mais saudades deixou no povo eleito; aquele que sulcou, nas encostas dos séculos, uma nostalgia tingida de esperança.
Sucede que Deus decide aparecer não num palácio, mas num curral. Não tem soldados a protegê-lo, tem apenas a companhia de Maria, de José e, talvez, de alguns animais.
O sinal de Deus — dizem os anjos aos pastores — é um menino, um menino deitado numa manjedoura (cf. Lc 2, 12).
Tudo isto é desconcertante, sem dúvida. O normal é que o grande conviva com o grande. Esquecemos, porém, que isso é apenas humano. Divino não é que o grande caiba no grande. Divino é o infinitamente grande caber no infinitamente pequeno.
Fernando Pessoa acertou em cheio quando escreveu que «o melhor do mundo são as crianças». Até Deus quis ser criança.
Porquê? Guilherme de Saint-Thierry dá uma explicação muito luminosa: «Deus viu que a Sua grandeza suscitava no homem resistência. Então, escolheu um caminho novo. Tornou-Se um Menino. Tornou-Se dependente e frágil, necessitado do nosso amor. Agora – diz-nos aquele Deus que Se fez Menino – já não podeis ter medo de Mim, agora podeis amar-Me».
O conhecimento, disse Karl Jaspers, vem pelo espanto. Já o amor vem pelo encanto. Quem encanta como as crianças? E quem não se encanta com as crianças?

4. O bulício das crianças aproxima-as da inquietação de Deus. Na sua candura, elas sabem que, na vida, só vence quem se incomoda, quem se desinstala. Também elas já intuem que existir é desassossegar e amar é inquietar.
É por isso que as crianças estão no coração do Natal. É por isso que o Natal é das crianças. E dos que são como elas. Inconformadas!

João António Pinheiro Teixeira
padre


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Cristo Veio... mas a sua presença é incómoda

Esta sociedade europeia e portuguesa do século XXI celebra o Natal outra vez.
Saibamo-lo, ignoremo-lo ou escamoteemo-lo, o Natal, historicamente, não é outra coisa senão a celebração do Nascimento de Jesus Cristo. Para nós, os crentes, Deus que veio ao mundo para nos tirar do poço da ignorância e do abismo do pecado, e para nos abrir e ensinar o caminho de uma vida com sentido e de um futuro com esperança.


Ele é a imagem do Deus Vivo, o Filho do Senhor, e o Salvador de todos.
Infelizmente, e incompreensivelmente, esta sociedade europeia que foi gerada à sombra da Cruz, alimentada pelo Evangelho e organizada à sombra do Campanário, agora, não quer Jesus à sua vista.

Aqueles que governam a Europa e fazem as leis da Comunidade, não quiseram o nome de Jesus e as raízes cristãs mencionados no texto da Constituição, e agora, exigem que sejam retirados dos lugares públicos os últimos sinais de Cristo que ainda restam. Tudo com base no seu laicismo, e em nome do pluralismo, da liberdade de crenças e do respeito pelas diferenças. E assim, segundo a sua vontade, não vai ser possível manter em locais públicos qualquer objecto ou estrutura que lembre alguma crença ou qualquer religião: nem cristã, nem muçulmana, nem nehuma outra.

Mas, assim sendo, pelas mesmas razões e dentro da mesma lógica, vão ter que derrubar também as igrejas e as capelas, destruir as sinagogas e as mesquitas, abater as grandes basílicas e as enormes catedrais, apear as altas torres, calar os sinos, e derribar os nichos, os cruzeiros e as “alminhas” que povoam as nossas queridas terras portuguesas.

Não são tais estruturas sinais religiosos? Não estão todos implantados em locais públicos que toda a gente frequenta e onde toda a gente passa?

Dentro da mesma lógica, e proibindo na rua o uso do lenço muçulmano e nas escolas o uso do crucifixo, têm que proibir também as pessoas de usarem cruzes douradas nas voltas do pescoço ou de dependurarem terços nos espelhos dos automóveis, e até de usarem como apelido o nome de Jesus. Brincando um pouco (perdoem-me, por favor), o primeiro a sofrer as consequências vai ser o treinador do Benfica: não é admissível que o homem ande constantemente a correr, nervoso, as bordas dos relvados nacionais, ofendendo os milhares de adeptos que não são crentes ou são de outra religião, usando o nome de Jesus em locais tão públicos como são os nossos estádios…
É que todos esses sinais e adereços cristãos podem ofender os ateus, incomodar os agnósticos e os laicos que cruzam as nossas praças e magoar os crentes de outras religiões que passam pelas nossas ruas!...

O que me admira, entretanto, é ver que toda essa gente que anda tão interessada em fazer desaparecer dos lugares públicos os sinais religiosos, corre agora, nesta quadra natalícia (onde virá o Natal ainda?...), a iluminar as ruas das maiores cidades e das mais pequenas vilas, a construir presépios nos amplos jardins públicos, e a erguer no meio das grandes urbes gigantescas árvores de Natal, com biliões de lâmpadas, gastando milhões de euros, para celebrarem o nascimento de Jesus.

Que me desculpem, por favor, mas não posso deixar de considerar tudo isto uma enorme hipocrisia!

As iluminações natalícias das ruas, os presépios dos jardins e das praças e as gigantescas árvores de natal não são também sinais religiosos? Não são uma chamada de atenção para o maior acontecimento da história humana, que foi a vinda de Deus ao mundo com o nascimento de Jesus? Se não são isso, digam-me então o que são e informem-me do seu significado.

Pergunto mais: as ruas iluminadas, as praças ornamentadas e os espaços onde se erguem as soberbas Árvores de Natal não são também locais públicos, onde passam pessoas sem fé e gente de outras religiões? Dentro da mesma lógica, não serão esses símbolos para essas pessoas uma verdadeira ofensa à sua Fé ou à sua falta de Fé?
Passam essas pessoas a vida a aconselhar a todos a tolerância, o pluralismo e o respeito pelos outros e pelas suas diferenças…e bem. Então, porque se preocupam tanto em fazer desaparecer todos os símbolos religiosos, cristãos ou não cristãos? É assim que se ensina a tolerância às nossas crianças e aos nossos jovens? Defende-se a tolerância e pratica-se a intolerância?...
Sejamos todos um pouco mais coerentes…
…e tenhamos todos um FELIZ NATAL!

Resende, 12.12.09

J. CORREIA DUARTE


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Querem roubar-te o Natal, Senhor!

Normalmente não gosto desta altura festiva do Natal.


Querem roubar-Te o Natal, Senhor.
Querem ficar com a festa,
mas não querem convidar o festejado
Rui Corrêa d'Oliveira

Normalmente não gosto desta altura festiva do Natal.

Barulho por todo lado, compras, créditos e esbanjamento de dinheiro para as prendas e mais prendas. As pessoas esquecem que o Natal existe porque Jesus nasceu….Vimos um Natal travestido de Pai Natal, mais uma época que continua a lógica do Ter sobre o Ser…. E lembrar que Jesus nasceu num estábulo na pobreza!

Milhões de pessoas comemoram o Natal. Os pinheiros são enfeitados, as casas e ruas ficam cheias de luzes, ceias familiares são realizadas e muitos presentes são trocados. Mas, será que pode existir uma comemoração real sem a presença d´Aquele por causa de quem o Natal é festejado?
Vivemos uma época de decadência desenfreada rumo à capitalização e marketing desse dia 25 de Dezembro. Com o real significado do Natal cada vez mais esquecido….Vejo pelas crianças que já tem inteligência suficiente para saber que Pai Natal não existe, e que o Rudolph e os gnomos ajudantes são só uma continuação dessa mentira. E elas sabem quem é Jesus? Obviamente que não.

Mas coitadas das crianças! A culpa não é delas: a sociedade e principalmente os pais é que fazem essa “lavagem cerebral” ensinando aos filhos que o Pai Natal veio do Pólo Norte, que tem um trenó e tal, e simplesmente ignoram o nascimento do menino Jesus. Com o avançar da idade, os pequenos enganados descobrem que o velhote das barbas brancas não existe, e com isso, não fica nenhuma imagem de Cristo.

Para ajudar a esta situação, as lojas, mercados e indústrias aproveitam-se da data para vender, vender, vender. Vendem brinquedos, roupas, penduricalhos, comida para a ceia e principalmente os presentes, por que afinal, na cabeça das pessoas o que é o Natal sem compras? O Natal é justamente isso prendas e mais prendas!Sinto-me tantas vezes angustiado, numa época que deveria ser de comemoração do nascimento d`Aquele que mais amo, transformado no lixo consumista que se tornou esta sociedade que vivemos.
Temos um Natal transformado em dia de presentes e da ceia. E tantas vezes nem a ceia as pessoas sabem qual o seu verdadeiro significado.




Amigo Leitor, a verdade é que:Há 2000 anos, Jesus Cristo, o Nazareno nasceu em Belém. Agora ele quer passar o Natal com aqueles que O amam! No dia 25 de Dezembro o que se comemora é uma mensagem de Paz e Amor para todos.Realmente, sem Ele, o Natal perde o sentido! Sem um relacionamento vivo com o Redentor eterno, com Jesus Cristo, a vida é muitas vezes uma sequência de preocupações e aflições sem sentido.

Por isso, amigo leitor, neste Natal abra o seu coração. Deixe Jesus entrar na sua vida!!

Cláudio Anaia
claudioanaia@hotmail.com
www.relances.blogspot.com



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11/12/09

Chicotadas do Papa e seu sentido verdadeiro

O taxista que, pelas ruas do Porto, me levava à estação de Campanhã, percebendo pela conversa dos que me acompanhavam, que eu era homem da Igreja, lamentou-se da noticia publicada no jornal desse dia, que dizia que o Papa João Paulo II, segundo o testemunho de uma freira polaca, se chicoteava a si próprio, no seu quarto privado e na calada da noite.
E comentava: “ O senhor já morreu há tanto tempo, porque vêm agora os jornais com esta conversa. Ele fazia o que entendia, e ninguém tem nada com isso”. Pôs-me nas mãos o jornal do dia onde vinha o que se dizia do Papa. Lá lhe expliquei o que significavam essas chicotadas e que o que dissera a religiosa fora para justificar a santidade e a virtude de João Paulo II.
Compreende-se que, num tempo em que se idolatra o corpo, se fique chocado ao saber que alguém, ainda por cima o Papa, o chicoteava de quando em quando.
Cilícios, disciplinas, jejuns eram formas ocasionais de penitência pessoal, frequentes em tempos passados, não muito longínquos e, ainda hoje, ao alcance de quem livremente as quiser usar. Consideram-se meios de ascese cristã, porque de apelo à purificação e ao fortalecimento interior. Destes permanece ainda, na Igreja, como conselho de livre acolhimento e preceito duas vezes por ano, o jejum, como apelo à partilha com os pobres. Na sociedade, ele pratica-se, por vezes com exageros prejudiciais à saúde por razões estéticas. As disciplinas e os cilícios foram progressivamente esquecidos, como se se tratasse de instrumentos desumanos, capazes de envergonhar gente evoluída.
Pelos vistos, João Paulo II, não pensava assim. Eu também não o penso. Durante um retiro espiritual de 30 dias, que fiz em Espanha, já lá vão mais de quarenta anos, usei algumas vezes, poucas, a disciplina, ou seja, chicoteei-me, a conselho do orientador, um padre jesuíta, homem de virtude, que tem introduzido o seu processo de canonização. No início dos cursos de cristandade, década de sessenta, também usei algumas vezes o cilício, a exemplo dos dirigentes responsáveis, vindos de Ciudad Real, para nos ajudarem a minha diocese de então, no lançamento desse método evangelizador. Em nenhum dos casos senti que este uso ocasional me tivesse feito mal, me entorpecesse o sentido, me tirasse a alegria, me traumatizasse para a vida. Na corrente do tempo que se vive, não voltei a usar nem a disciplina, nem o cilício. Mas guardo-os para poder mostrar a quem nunca experimentou, nem viu, aproveitando para fazer a catequese da necessidade que todos temos de nos penitenciarmos, seja lá como for, como recomenda a Palavra de Deus e o ilustra a vida de muitos santos.
A vida mostra que só consegue perceber o valor e a alegria da humildade, que traduz a verdade que somos, quem voluntariamente se humilha ou aceita, com coragem, a humilhação que lhe sobrevém. Cilício e disciplina eram caminho para conter orgulhos e vaidades, e não deixar que os êxitos nos desvirtuassem. Hoje há outros caminhos, que só o são, quando andados e praticados. Paulo fala destes e do uso pessoal que deles fazia, Cristo deixou a advertência que, sem penitência, todos perecem do mesmo modo.
A instalação cómoda entorpece os ossos, não os revigora. Paralisa, não agiliza. .
A vida, assumida como dom e compromisso, é sempre penitência libertadora, para um coração que a fé orienta e a razão esclarece. A vida é, também, oração e louvor, para aqueles que não se esquecem que, ante Deus, são sempre todos mendigos agradecidos.
Fiquei contente e grato a João Paulo II, ao saber que ele, homem fascinante do nosso tempo, crente que dava a cara às adversidades, apóstolo que rompia fronteiras a proclamar Jesus Cristo, como único Redentor do homem, de quando em quando, se chicoteava a si próprio com a disciplina. Para Teresa de Calcutá o caminho foi o da serena aceitação da privação de consolações, humanas e divinas, numa vida longa doada aos outros e a quem só bastou a certeza do dever cumprido e do amor nunca regateado.

António Marcelino


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Escutando Jesus diante do presépio

Agora que caminhamos a passos rápidos para a celebração do Natal, torna-se um tanto essencial parar diante da ‘imagem’ do Menino Jesus – o festejado – para escutarmos, cada um a seu modo, aquilo que Ele nos quer dizer.
Em linguagem simples como que reproduzimos breves mensagens de Jesus Menino.


* A ti que és filho
Vês-me despido e sem grande encanto, pois sou uma criança.
Assim deixa que teus pais – dando graças, se tal for o caso, por tê-los ainda juntos e unidos – te amem, corrijam e acariciem.
Sabes como é bom ter pais biológicos, psicológicos e espirituais... pois, eles dão-nos segurança e a sua presença nos fortalece pela vida além.

* A ti que és pai
Olha-me como o teu filho mais amado – seja o primeiro ou o último – e dá-me a tua atenção, vendo-me como uma pessoa, diferente de ti, mas necessitado de carinho e de aconchego.
Dá-me tudo isso e outro tanto te darei em compensação.

* A ti que és mãe
Olha-me com essa ternura, que um coração feminino e materno é capaz de sentir.
Por certo sentirás a memória de seres mãe, antes e depois do parto.
No teu serviço à vida tu continuas a permitir que o dom da vida se propague neste mundo.
Ao veres-me como filho, suplica, hoje, o perdão para tantas que recusaram sê-lo, biológica, psicológica e (até) espiritualmente.
Quero perdoar-lhes infundindo nelas nova vida e vida nova.

* A ti que és irmão
Repara em meus braços abertos, querendo receber-te e abraçar, através de ti, os teus irmãos. Não lhes recuses o dom da fraternidade nem obstaculizes a correcta vivência da paz.
Mais do que coisas, Eu preciso de ser acolhido por todos, abraçando-os e sendo abraço de comunhão em paciência.

* A ti que és avô/avó
Na grandeza do amor feito bênção, quero servir-me da tua história para prolongar os benefícios divinos, tanto pela longevidade como pela sabedoria feita maturidade em crescimento.
Quando tantos se sentem em solidão e em isolamento, Eu quero confortá-los mesmo nas horas de maior silêncio em esvaziamento.
Como será importante deixar passar o tempo, saboreando-lhe as consolações e filtrando as amarguras... à luz de Deus.

Neste Natal de 2009, Jesus continua à espera de ser acolhido no nosso coração.
Que Ele tenha lugar em nós, na nossa família, à nossa mesa... e na nossa vivência em Igreja católica.
Vamos conhecer mais e amar melhor Jesus Cristo.

A. Sílvio Couto



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09/12/09

A Igreja é só 0,1%?

1. Quando falamos da Igreja, imediatamente pensamos em bispos e em padres. Concentramo-nos, deste modo, em apenas 0,1% da sua totalidade, deixando de lado os restantes 99,9%.
Quando um órgão de comunicação social quer saber a posição da Igreja sobre qualquer tema, pensa logo num padre ou num bispo. Nem sequer cuida de saber se há um fiel leigo mais abalizado acerca desse assunto.
Há mais de quarenta anos, o Concílio Vaticano II recordou-nos que as questões relativas ao mundo dizem respeito sobretudo aos irmãos leigos.
Também disse que os pastores devem «estar dispostos a ouvir os leigos, tendo fraternalmente em conta os seus desejos».
No entanto, continuamos a subalternizar o seu lugar e a subestimar a sua intervenção. Até parece que só contamos com a sua generosidade, com os seus donativos…
Há não muito tempo, alguém me fazia sentir a sua alegria por determinada organização estar «nas mãos da Igreja». Motivo? Estava um padre à frente dela.
Eu respondia que a presença da Igreja em tal organização estava assegurada pelos cristãos que nela se encontravam. Mas não consegui convencer o meu interlocutor.
Este arquétipo ainda está bastante difundido. Importa, pois, relembrar que é pelo Baptismo (e não pelo sacramento da Ordem) que nos tornamos cristãos.
Os padres e os bispos não esgotam a Igreja. Constituem, sim, um prestimoso serviço na Igreja. Por isso chamam-se ministros, isto é, servos.

2. Na Igreja, não pode haver a lógica dos agentes e dos destinatários da missão. Os padres e os bispos seriam os agentes e os irmãos leigos constituiriam os destinatários.
Esta percepção está implícita, por exemplo, na relação que se mantém com a Eucaristia.
Ainda se ouve dizer, com frequência, que se assiste à Missa. Ora, à Missa não se assiste. Na Missa participa-se. Aqui, o verbo a conjugar não há-de ser o verbo assistir. Tem de ser sempre o verbo participar.
Seguindo o pensamento de S. Paulo, que compara a Igreja a um corpo (cf. 1Cor 12), não pode haver cristãos de primeira e cristãos de segunda.
Todos têm um lugar importante na Igreja. De resto, a importância de um lugar na Igreja não se afere pelo poder. Pela simples e elementar razão de que, na Igreja, não há relações de poder. Pelo menos, não devia haver. Na Igreja, há serviço.
Daí que o Papa, enquanto primeiro servidor, se apresente como servo dos servos de Deus!
Aliás, é curioso notar como a Igreja chegou a ter um Papa que tinha sido escravo. Trata-se de S. Calisto, que foi eleito no ano 217. Ou seja, a Igreja escolheu alguém que estava habituado não a mandar, mas a servir!

3. Não é o povo que existe para os padres e para os bispos. São os padres e os bispos que existem para o povo: para o conduzirem até Cristo.
Um padre e um bispo não podem actuar em nome próprio. Junto do povo, eles são chamados a actuar em nome de Cristo.
Jesus Cristo é o modelo do servidor e da recusa do poder. O poder só Lhe trouxe problemas. E não será que, hoje, continua a trazer-Lhe dissabores?
Não é, por isso, curial que o padre e o bispo exibam uma pretensa superioridade intelectual.
Como nota Joseph Ratzinger, «a fé dos simples apreende o núcleo da fé de modo mais central do que a reflexão dividida por muitos passos e conhecimentos parciais».
Os padres e os bispos estão ao serviço da fé dos simples, que «permanece como o grande tesouro da Igreja».
Os padres e os bispos não são donos da fé, mas servidores da fé, que está alojada na alma sã do povo simples.

4. Temos muito a aprender não só nos livros, mas também na vida. Em matéria de fé, o povo é mestre: o povo simples, humilde e puro.
Nos santuários, nas igrejas, nas casas ou até nas ruas, há um exemplo de fé viva que nos deve levar a reflectir e a inflectir.
Às vezes, dou comigo a pensar que nem só os pastores deviam falar aos fiéis. Havia também de haver oportunidade de os fiéis falarem aos pastores. Também nos faz bem ouvir, calar, aprender. Com o povo.

João António Pinheiro Teixeira
padre


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México, Códice Náhuatl na Ícone de Guadalupe

Visitar Igrejas da Cidade do México, observar e participar nas celebrações da maior Catedral da América Latina, proporciona uma experiência estimulante.
Visitar Igrejas da Cidade do México, observar e participar nas celebrações da maior Catedral da América Latina, proporciona uma experiência estimulante. Contemplar na ícone de Guadalupe de cima de um tapete rolante, que não deixa engarrafar o fluxo contínuo de peregrinos do Santuário de Guadalupe, aquela cara morena de rapariguinha de 18-19 anos com as mãos erguidas em oração tal como em Fátima e Lurdes, deixa-nos em enlevo especial. Maria, em oração, apresenta-se como serva do Senhor, não deusa, a “perfeita sempre Virgem Santa Maria, Mãe de Deus”, e Mãe dos homens: “ Não sou Eu tua Mãe?”, como ela disse a Juantzin Diogo.

A história do México está cheia de práticas religiosas, templos, palácios e pirâmides. Nem faltaram os sacrifícios humanos para contentar os deuses, conseguir chuva e o pão de milho de subsistência. Ainda no ano 1487 foram sacrificados durante quatro dias na cidade azeteca do México 80 mil homens. Muitas crianças eram igualmente sacrificadas.

O destino inexorável do seu calendário, baseado na exímia observação dos astros, marcava o seu fim. A esperança dos Azetecas estava numa águia a devorar uma serpente sobre um cacto. Por isso ao verem no local esta cena construíram Tenochtitlan ou Cidade Azteca, a cidade que os conquistadores, recebidos como deuses e bárbaros, destruíram para construir a cidade actual.

Quando Nossa Senhora apareceu em 1531 em Tepeyac, 12 quilómetros a norte, ao humilde índio Juantzin, a pedir uma capela surgiu para muitos uma nova esperança. Os índios, humilhados e violentados pelos guerreiros idos da Espanha, antes ameaçados pelos sacrifícios humanos dos seus deuses, voltam-se agora para um novo sinal. O deus sol era destronado por Nossa Senhora de Guadalupe , de mãos erguidas em oração, a tapá-lo, a ornamentar-se com os seus raios e a pisar a serpente na figura de lua. Não era deusa mas revelava Deus verdadeiro.

O Juantzin Diogo em 1531 (de 9 a 12 de Dezembro), teve dificuldade em convencer o Bispo Frei Juan de Zumárraga do pedido de Nossa Senhora. Só à terceira vez as rosas da Senhora e o poncho do vidente transformado em tela do céu com o retrato da Senhora de Guadalupe foram convincentes para o Bispo e os que o rodeavam. A capela foi construída e desde então foram sendo acrescentadas mais quatro igrejas sendo a última a maior de todas para dez mil pessoas. Visitá-las é reviver a história do santuário.

Os guias atribuem uma frequência de mais de 50 milhões de peregrinos anuais ao santuário de Guadalupe, trono de Rainha de toda a América, e hoje o mais frequentado do mundo. A curiosidade e a devoção levaram-me a consultar alguns livros sobre este santuário. E fica-se impressionado como as revelações de Nossa Senhora têm continuado até hoje com as investigações da sua Ícone de fabrico extra-terreno.
Os investigadores não se têm cansado de examinar o quadro que ela deu a Joãotzin Diogo com as rosas que lhe mandou colher. Não foi “ pintado por mão humana” nem com qualquer tinta ou químico conhecido, nem tão pouco foi usado qualquer aparelho sobre a tela. Nem a tela de fibra de cacto maguey, “agave popotule” o suportava. Era o ayate, poncho ou tilma de Juantzin Diogo. Os tecidos com esta fibra são grosseiros, qual rede de malha larga de serapilheira, e duram poucas dezenas de anos. E contudo esta tem têm 478 anos! A fotografia a raios infravermelhos mostrou que houve tintas acrescentadas à lua e ao anjo tal como adornos dourados que se vão descascando. O que é original dura. Mais surpreendentes foram os resultados das ampliações dos olhos que não são pintura mas funcionam como vivos. Foram encontradas silhuetas nas córneas de cada um dos olhos, não iguais mas em cada um segundo a posição. Depois de bem examinados com técnicas computorizadas foram descobertas mais figuras na íris dos olhos da imagem: o Beato Juantzin, o Bispo Zumárraga, uma família de índios, uma mulher negra, etc. que estavam na sala em que Diogo mostrou as flores e o quadro da sua tilma ao Bispo.

Por outro lado os pormenores da imagem podem ser lidos segundo os códices da cultura Nahuatl: as estrelas do manto são exactamente as constelações visíveis no local no dia 12 de Dezembro de 1531 como a dizer que ela é rainha dos dois hemisférios. O cabelo solto indica que se trata de uma virgem; e a flor “Nahui ollin” à altura do ventre e a cinta indicam que está grávida; o anjo tem asas de águia e pássaro mexicano, (“águia que come a serpente”?); os raios do sol indicam que Maria é a mãe da luz, do deus sol, de Deus. Estar sobre a lua ou no seu centro indica que Ela é o centro do México, pois “Metz-xic-co” significa centro da lua, aquela que esmaga o deus lua (a serpente enrolada a quem os aztecas sacrificavam seres humanos). Estas algumas das maravilhas que se tem encontrado na imagem “não feita por mãos humanas”. Os autores, tal como os sítios da internete, referem outros pormenores do códice azteca. Vale a pena consultar.

Razão tem Vittorio Messore para dizer que se a Igreja no século XVI perdeu os povos de alguns países que rejeitaram a Mãe de Deus nas sua devoções; Ela, pela mesma altura, veio convidar os povos de todo um continente. Será que os povos protestantes só voltarão ao seio da Igreja pelas mãos de Maria quando re-aceitarem Maria com os privilégios, dons e as “grandes coisas “ que o Omnipotente n’Ela fez? Muitos pensam que sim. Agora que no dia 12 se vai celebrar o aniversário desta grande graça para as Américas e para todo o mundo, vale a pena conhecer melhor a mensagem de Nossa Senhora de Guadalupe adaptada à cultura mexicana.
México, 26 de Novembro de 2009
Aires Gameiro


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Pelo País do início da gripe A, H1N1

As apreensões eram muitas nos cerca de cem participantes que se deslocaram para o Capítulo Geral da Ordem de S. João de Deus neste país. Ao chegar ao aeroporto todos tiveram que preencher o impresso sobre dores de cabeça, febre, fluxo nasal, dores nas articulações e não me lembro que mais.

Não faltavam avisos dos procedimentos e boas práticas a seguir, bastante visíveis em placardes e lugares públicos. Sem eles esquecíamos que estávamos em tempos e em país de gripe. Também havia por aqui e ali a garrafa com o líquido desinfectante a que uns recorriam fielmente e outros se esqueciam de o fazer por se sentirem desobrigados.

Por Guadalajara não se ouviam muitas notícias sobre os afectados da gripe A. Apenas se ouvia que aqui e ali uns tantos iam aparecendo infectados e sucedia uma ou outra rara morte.

Das vezes que se passava por alguma cidade não se via mais que um ou dois com máscara. E ajuntamentos não faltavam no centro histórico da cidade dos 25 milhões, como por exemplo nos protestos contra nacionalizações do dia 23 e mais ainda no dia 26 em que os polícias na Praça Maior e à volta do Palácio Nacional eram quase mais que os peões para manter em segurança a vinda do Presidente ao Palácio. Impressiona ver chusmas de polícias e seguranças por tudo quanto é sítio mas não parecia ser por causa da gripe. Mesmo os funcionários de aeroportos, restaurantes, museus e lojas parecem ser sempre a triplicar para as necessidades.

No grupo da centena de participantes nos trabalhos do encontro internacional felizmente ninguém recorreu ao Irmão médico participante no mesmo por gripe.
Na cidade do México em dois ou três dias, para além de meia dúzia de máscaras e dos avisos de alerta por aqui e ali, não se notava a paranóia da gripe suína. Estavam a chegar quase no final do mês de Novembro as primeiras vacinas, em número de menos de um milhão que parecia ser gota de água para cem milhões de habitantes.
Entretanto na Cidade do México, os que quisemos visitar o Palácio na Praça Maior tivemos que passar pelo controlo da gripe: uma desinfecção das mãos e uma verificação de febre pelo calor da cara mediante aparelho de raios infravermelhos à distância de dois metros.

Na missa na catedral da cidade do México um dos capelães, mesmo no dia em que um grupo de “fanáticos” do ídolo, como lhes chamou a TV, mandou celebrar uma missa por Michael Jackson, lembrou que em atenção ao plano de contingência a comunhão continuaria a ser na mão e que o rito da paz seria apenas com gesto de inclinação de cabeça à distância. Este procedimento não era tão geral como isso noutras igrejas, mas foi repetido no dia em que participei na Missa no Santuário de Guadalupe no dia 24. Ainda a propósito da assembleia na missa por M. Jackson não faltava, ele ou ela, não sei, com um visual quase perfeito a imitar o do “ídolo” e acompanhados com quadros do mesmo.

Perguntará alguém: então e não houve nenhum caso de gripe A no grupo do Capítulo Geral dos Irmãos de S. João de Deus? Pois, que eu saiba, não aconteceu nada. Após 20 dias de trabalhos e de algum programa social os seus participantes regressaram aos seu vinte cinco países e lugares de trabalho, sãos e salvos. E tudo acabou abençoado por S. João de Deus e por Nossa Senhora de Guadalupe a “Dona” e Soberana” da América Latina.
Cidade do México , 26 de Novembro de 2009
Aires Gameiro


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04/12/09

Ao Compasso do Tempo - Crónica de 04 de Dezembro de 2009

Leitura semanal dos problemas do Mundo e da Igreja

1. Vimos há dois dias num canal televisivo o Papa Bento XVI a receber a maior autoridade política da Rússia em ordem ao acordo diplomático a assinar entre o Vaticano e aquele país, assinalando-se a abertura próxima de uma Embaixada. E de uma Nunciatura Apostólica em Moscovo? Há “saltos” na história com sabor a infinito, sem conceder a este um tónus estritamente religioso. Aludo a uma alteração impensável desde a idade em que nos conhecemos e começamos a soletrar o mundo. O impossível… é conceito a riscar, como se comprova em não poucos actos!

A responsabilidade da Igreja como ponte de reconciliação e de verdade, de promoção integral (e da Liberdade, sua condição primeira), do diálogo respeitador e de produtora da civilização, é apelo a prosseguir um itinerário, sem desfalecimentos.
Destes “saltos” da História são responsáveis numerosos cidadãos do mundo, lutadores a favor da liberdade do pensamento, através do repúdio de totalitarismos de extremos contrários. Entre aqueles alinharam heróicos “cidadãos da paz” (o exemplo tão próximo de João Paulo II é incontroverso!)

E a terapêutica da transformação foi sempre a mesma: “paciência” do conceito, empenhamento realista nas angústias sociais, virtude da paciência, a qual, longe da passividade, é fertilizadora da esperança (há que nos bater por impossíveis, tornando-os possíveis!).

Ao ler a magnífica biografia do Senhor D. António Barroso, da autoria de Amadeu Gomes de Araújo e de Carlos A. Moreira de Azevedo, intitulada “Réu da República – O missionário António Barroso, Bispo do Porto” (Lisboa, Alethia, 2009) ficou-me no palato o bom sabor de uma investigação honestíssima, pela fundamentação nas fontes, releitura interpretativa e conclusões abertas e sem receio. Não é um estudo menor, a provar, antes de mais, que o facto de se apresentar ao público um escrito (ou um artigo) não equivale a descobrir o ouro (quando pode tratar-se de latão…)
A propósito do último capítulo “Testemunhas unânimes da santidade”, da autoria do bispo Carlos Azevedo, evoquei meu querido pai, quando nos contava em família, a chegada do Senhor D. António Barroso a Lisboa, sob prisão, nestes termos:
“E lá, na capital, a canalha esperava-o”.

Muito mais tarde, vim a confirmar a descrição: “Quando D. António Barroso chegou a Lisboa, sob prisão, por ter cumprido e feito cumprir aquilo que fora combinado por todo o Episcopado, encontrou a recebê-lo… a carbonária e a canalha”
E remata o mesmo texto numa pergunta pertinente:
“Pois bem: a canalha, só a canalha a receber o Bispo em testemunho… Mas: onde estava a Igreja de Lisboa?!...” (António Ferreira Gomes, Ser bispo conciliar no exílio (1959-1969), Porto, Fundação Spes, 2007, p. 112)

2. Embora tardia, aqui deixo a minha homenagem fraterna ao Padre António Esteves, não há muito falecido. E uno-me, em comunhão de grande estima, com o Padre José da Silva Lima, a quem formulo votos do mais pronto restabelecimento. Os amigos são nossa família.

Lisboa, 04 de Dezembro de 2009

D. Januário Torgal Mendes Ferreira
Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança
http://castrense.ecclesia.pt


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Causa maior em missão de sorriso... neste Natal

O Natal comercial vai dando laivos de humanismo, servindo-se de figuras (mais ou menos) grotescas para atrair os interesses carunchosos de quem talvez tenha perdido – ou até desconheça – o significado do Natal... mesmo que (já) tenham sepultado o (simpático) Pai Natal.
Duas cadeias comerciais – embora ao que parece do mesmo dono – investiram forte nos intuitos benfazejos da Popota multi-viajada até à Leopoldina multi-cultural. De facto, nada há a opor a quem pretenda vender muito para recuperar as perdas acumuladas ao longo do ano (de crise) que está prestes a terminar. Com efeito, dinheiro atrai dinheiro e, se lhe juntarmos uns pozinhos de benemerência, talvez se possa acrescentar algo mais ao pecúlio sedutor.
No frenesim de preencher o vazio interior com (mais e mais) coisas materiais, por certo, muitos cairão no engodo de comprar um livrinho para ajudar ou porque está na moda... quase narcotizando a consciência em maré de comiseração engasgada pela vaidade de ocasião.
Ora, diante destes sinais de ‘humanismo’ comercial, ousamos fazer breves reflexões e colocar algumas questões, tendo em conta os slogans das campanhas.

* Causa maior: celebrar Jesus, o centro do Natal
Mais do que um roteiro de culinária – como é o livro da Popota – temos de centrar-nos na causa maior da celebração do verdadeiro Natal: o nascimento de Jesus, em Belém da Judeia.
De facto, para muita gente o Natal poder-se-á reduzir a uma festa horizontal mais ou menos conseguida pelo ambiente filantrópico de boas relações entre familiares, na versão no emprego ou na vertente de vizinhança. Mas o Natal é muito mais do que esse esboço humanista de mínima cordialidade. O Natal alicerça-se – a faz-nos alicerçar – na radical fraternidade de todos uns para com os outros, envolvendo até a dissonância com quem pensa ou vive de forma diferente de nós. Com efeito, pela força do Natal estamos intrinsecamente unidos uns com os outros em ordem à vivência de sermos cada vez mais e cada vez melhor ‘família humana’, cujo alicerce é Cristo feito homem connosco.
- Será que todos quantos se aproximam da Igreja católica para celebrar o Natal, têm consciência de Quem é o festejado?
- Mesmo com laivos de cristianismo, as nossas famílias têm no Natal um ponto de encontro e/ou de celebração?
- Os sinais usados no Natal – dentro ou fora das igrejas – reflectem a centralidade de Jesus ou vão disfarçando certos complexos de medo diante do aniversariante?

* Missão de ser sorriso: desafio actual para os cristãos
Para além da participação solidária na campanha, do slogan e da estória, temos de tentar acolher o desafio/provocação – no sentido cristão do termo – de sermos sinal de Deus, isto é, de levarmos um sorriso àqueles/as com quem nos encontrarmos... conhecidos ou ‘anónimos’.
De pouco adianta andarmos a lamuriar-nos sobre a ‘crise’, que não conseguiremos aliviar, antes pelo contrário, as dificuldades dos outros. De facto, o nosso nacional pessimismo/derrotismo tem vindo a criar um ambiente ainda mais pesado e nem os cristãos destoam pela (mínima) atitude positiva. Poder-se-á quase questionar a nossa fé, quando, ao sairmos da missa, em vez de incendiarmos de confiança quem nos rodeia, pelo contrário, empestamos de negatividade quem connosco se possa cruzar.
Ora é-nos confiada a missão de sermos um sorriso de felicidade de termos um Deus feito homem que nos veio salvar e investir na tarefa de darmos nova força – pois está n’Ele fundada – a todos quantos vemos, com quem falamos ou a quem tocamos... terna e afectivamente.
- A quem vou dar – ou devo dar – um sinal diferente neste Natal?
- Qual será o presente que alguém me pede que lhe dê... para além de coisas?
- Será possível recusar um sorriso – verdadeiro, simples e amigo – iluminando vidas e histórias tão sofridas?

Na caminhada do Advento continuemos a preparar o Natal de Jesus em nós e à nossa volta.

A. Sílvio Couto



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02/12/09

A si, que não vai com a cara do Papa

1. Queria dirigir-me especialmente a si. A si que, já por várias vezes, me disse que não simpatiza com este Papa.

Quando lhe peço um motivo, o mais frequente é dizer-me, após um furtivo encolher de ombros, que não vai com a cara dele!
Perante o meu esgar de espanto, acaba por me falar da situação da Igreja, que — dá para ver — lhe desagrada muito. Sucede que ao Papa também não agrada por aí além.
Aponta-me igualmente a atitude deste ou daquele padre, deste ou daquele bispo. Pois olhe que o Papa também está preocupado. E não o tem escondido.
No fundo, até há muitos pontos de contacto entre o Santo Padre e quem o critica. Mas os lugares comuns são assim. São como uma corrente que passa por nós e quase ninguém lhe resiste.
Não há dúvida de que há uma onda que não é favorável ao Papa. Só que, para mim, é um factor para que o admire ainda mais.
Admiro-o porque ele sabe que é contestado e, apesar disso, nada faz para ser popular. Não vacila. A sua palavra é clara e o seu caminho segue em linha recta. Não anda às curvas.

2. Para ele, o problema da Igreja é sobretudo interno. Desde há muito, está consciente de que a Igreja é uma oportunidade frequentemente transformada em obstáculo: «Se, antigamente, a Igreja era, incontestavelmente, a medida e o lugar do anúncio, agora apresenta-se quase como o seu impedimento».
Porquê? O mal não está numa deficiente integração no mundo. O mal está precisamente no pólo oposto, isto é, numa excessiva integração no mundo.
Não raramente, com efeito, «observamos um estranho oportunismo da Igreja diante das tendências do tempo, inclinando-se de repente para a adaptação quando deveria haver resistência».
Isto significa que, em vez de se assumir como a diferença e a alternativa, a Igreja se resigna a ser a repetição e a redundância.
Não é assim que se serve a humanidade. O então Cardeal Joseph Ratzinger disse, no magnífico Diálogo sobre a Fé, que a Igreja era chamada a ser «oposição à ideologia da banalidade que domina o mundo». Sucede que, por vezes, parece que se prefere fazer, dentro da Igreja, oposição à doutrina da própria Igreja.
Daí que «estar pronto para a oposição e a resistência seja, indubitavelmente, uma missão para a Igreja».

3. Não é pela tendência dominante que a Igreja se há-de nortear. «Não se pode contestar — nota Bento XVI — que a maioria pode enganar-se e os seus erros não se referem apenas a questões marginais».
Não é sequer «o clero que prescreve o que é ou deve ser a Igreja». O sacerdócio não é uma estrutura de poder nem tampouco uma instância de decisão. É, antes de mais, a sinalização «do vínculo da Igreja ao Senhor Jesus».
No sacerdócio, a Igreja supera-se a si mesma, mostrando que ela «não surge através de assembleias, acordos, erudição ou força organizativa». A Igreja deve-se sempre — e só! — a Cristo.
É Cristo que conduz a Igreja, «não são os homens que a moldam a seu bel-prazer».
Se permanecemos na Igreja é precisamente porque, apesar de todas as suas fragilidades, é «ela que nos dá Jesus Cristo».

4. Bento XVI verbera os pastores que, «para evitar conflitos, deixam que o veneno se espalhe».
A tranquilidade é uma aspiração de todos, mas não pode ser uma prioridade para o seguidor de Cristo.
Uma única paz lhe é lícito gozar: a paz da permanente inquietação!

João António Pinheiro Teixeira
padre


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Tequila, o vulcão mexicano

Tequila? Mas então não é uma bebida alcoólica de queimar as goelas? Pois, pode ser, mas a história fala de cinzas do vulcão Tequila, situado a cerca de 150 kms a noroeste de Guadalajara. Nelas cresce uma espécie de ananases bravios cujas folhas lhe ficam agarradas até lhas cortarem, chamados “ágaves azuis”.


Tequila? Mas então não é uma bebida alcoólica de queimar as goelas? Pois, pode ser, mas a história fala de cinzas do vulcão Tequila, situado a cerca de 150 kms a noroeste de Guadalajara. Nelas cresce uma espécie de ananases bravios cujas folhas lhe ficam agarradas até lhas cortarem, chamados “ágaves azuis”. Os seus frutos chegam a pesar 100 e mais quilos. Os homens sempre foram inventivos e de um fruto que não me soube a nada quando o provei, começaram a fabricar um produto que modifica o seu psiquismo, uma bebida inebriante em que o álcool etílico é a substância de base. O resto é paisagem de 34.658 hectares declarada Património da Humanidade em 13.07.06. Num campo destes frutos o guia turístico não se poupou a erudição para nos provar que a qualidade da bebida dependia de certos elementos das cinzas do vulcão Tequila. Mas depois lá foi dizendo que se fazia tequila noutros estados e cidades: Colima, Guantanato,Tamaulipas, Michoacan… Tequila sempre é um vulcão que pudemos fotografar ali ao lado. A bebida, essa, é uma fonte de receita significativa da cidadezinha Tequila que nem existiria sem as fábricas. Os terrenos do vulcão, incluídas as plantações, foram declarados património mundial a fazer lembrar as vinhas das lavas do vulcão do Pico nos Açores.
O marketing excedeu-se na visita guiada a uma fábrica. Os guias esgotaram o seu palavreado técnico e a paciência de alguns em que me incluo. Até obrigaram a enfiar toucas antes de penetrarmos na fábrica sem se saber para quê; e desligar os telemóveis, a não fotografar. Os tipos fizeram-se caros para criar impressão, tornar importante a bebida e a nós, mesquinhos. Ainda me passou pela cabeça que estávamos a fazer um favor por em número considerável de estrangeiros, das áreas da saúde, nos sujeitarmos a ser cobaias do marketing daquela marca e que iríamos merecer o almoço… Ilusão. O almoço teve que ser pago e serviu para continuarem o marketing mesmo após o mesmo com ida “obrigada” à loja para as compras. Sob influência de quatro horas de técnicas de influência social quem é que iria resistir. A julgar pelas experiências de psicologia social, poucos. Seria passar por rombo. Pois eu passei.

Para os não entendidos, como eu, as duas horas de visita tornaram-se uma seca com migalhas de curiosidade. Os entendidos até distinguem a boa tequila, enquanto para mim, ao prová-la mais me pareceu álcool de farmácia. O seu ardor combina bem com vulcão. De toda a maneira ficou-me a impressão de que há em cenas destas muitos paradoxos e contradições incuráveis do viver humanos. Ou se preferirem, armadilhas. A vaidade de se ser um “entendido” não é a menor.

Exportar esta bebida que atinge 65% de álcool puro para uma centena de países trás dinheiro ao país mas não anula outros problemas e prejuízos para o país. Nem de propósito. Ao chegar ao centro de encontros, o rádio a dar estatísticas sobre as mortes nas estradas do México devidas ao álcool. Um perito insistia que bastava um copo e condução para aumentar 20% o número de mortes por acidente. E isto, acrescento eu, quer o álcool tenha ou não tenha os elementos das cinzas do vulcão Tequila. Outra coincidência foi a de no dia 21 numa saída até ao lago Chalapa, o maior do México com mil quilómetros quadrados! No mercado da marginal uma em cada três tendas vendia bebidas, muitas delas alcoólicas e algumas concentradas. Alguns efeitos viam-se por ali nas pessoas passivas, sentadas pelo molhe e praças de cara sombria e olhar apagado, talvez também uma em cada três com efeitos das tequilas mais baratas da rua. Que mania, dirão, de ver a outra face da medalha! Desculpem os leitores, a medalha tem duas faces. O que vale é o México ter 14.000 grupos de Acoólicos Anónimos a funcionar os dependentes.

Tequila (Guadalajara), 15 de Novembro de 2009
Aires Gameiro


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