Jornal de Opinião

São muitos os textos enviados para a Agência Ecclesia com pedido de publicação. De diferentes personalidades e contextos sociais e eclesiais, o seu conteúdo é exclusivamente da responsabilidade dos seus autores. São esses textos que aqui se publicam, sem que afectem critérios editoriais da Agência Ecclesia. Trata-se de um espaço de divulgação da opinião assinada e assumida, contribuindo para o debate de ideias, que a internet possibilita.

31/10/11

Ao Compasso do Tempo - Crónica de 28 de Outubro de 2011

Os argumentos do anti-fascismo, por muitas desventuras cometidas em certo período histórico, tiveram a sua razão de ser (reparo aos que “vestiram” a pele de oposicionistas… para, oportunisticamente, “surfarem” a onda…). Mas, no imediato, todos se deram conta da exorbitância: tantos cidadãos que resistiram, sem terem obtido a oportunidade de, historicamente, serem conhecidos! E, só porque não alcançaram notoriedade, foram atirados para o “limbo” dos traidores.

Agora, volta-se ao mesmo… Do ponto de vista ético, começou por aconselhar-se a não falar mais do passado recente… O passado foi julgado, sem equívocos, nas eleições últimas. Porquê voltar sempre ao mesmo, referenciando a “tanga” em que fomos deixados (e os anteriores dois primeiros ministros não resistiram a esta argumentação)?
Destaco este dado factual pela simples razão de, nos últimos dias, ter lido artigos e emails, onde a tónica é esta: mas este ou aquele não criticou o último governo (li um dos últimos números do “Jornal do Fundão” onde Baptista Bastos critica um deputado europeu, que acusava um bispo por esse delito… E, afinal de contas, é um não crente que declara a esse parlamentar a sua não razão…).

Por isso é importante, não por uma questão de polémica ou de orgulho pessoal, conservar a documentação necessária para demonstrar a verdade… e a mentira, de quem nega dados factuais. A história constrói-se com documentos e seu arquivo. E há elementos documentais que “arrasam” a mais suave invectiva. Dou um exemplo: há dias o Senhor José Bonifácio (o nome é verdadeiro; o sobrenome, fictício) tornava público o delito de alguém, com responsabilidade na Igreja Católica, por não ter apontado os dislates éticos do Governo anterior, em contraste com os últimos reparos ao “desvio colossal”.

Pois bem. A pessoa em questão, com o à vontade de quem respira coerência, limitou-se a responder ao libelo, com a seguinte objectividade: “tenha a bondade de compaginar a nota de culpa de V.ª Excia com as declarações do visado, in Notícias de Beja, com data de 4 de Março de 2010, sob o título Portugal está a bater no fundo”
E “esta”?

Cito a seguinte saborosa passagem de sabedoria de um perseguido e vencedor (pela humildade da verdade), passagem esta tão oportuna para este momento da história de Portugal:
“Por isso a ideia da justiça está nas origens de todas as revoltas: - não há direito – e leva por diante todas as revoluções, mesmo nos seus movimentos mais injustos” (D. António Ferreira Gomes, Igreja na vida pública – Catolicismo português e historicidade, Porto, Fundação Spes, 2003, p. 39)

Realmente “não há direito”…

Lisboa, 28 de Outubro de 2011

D. Januário Torgal Mendes Ferreira
Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança


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Assis, orar a Deus como cada um o concebe, como A.A.?

As notícias diziam que no dia 27.10.2011 os representantes das religiões do mundo e o Papa Bento XVI teriam momentos de oração pela paz em Assis nos 25 anos do primeiro encontro . Era para isso que reuniam em Assis os 176 (Zenit) representantes das religiões: pedir juntos pela paz no mundo como “peregrinos da verdade e da paz”.


Um pormenor era, porém, referido de que os momentos principais de oração seriam em silêncio para respeitar as crenças de cada participante e não deixar a ideia de que uns se sobrepunham aos outros. “Cada um rezará do modo como acredita”. E haverá até não crentes no encontro. Cada um exprimirá os seus desejos de paz segundo as suas crenças. Cada um acenderá a sua lamparina com súplica pela verdade e pela paz.
Esta fórmula de cada um se dirigir a Deus, guiado pela procura da verdade e da paz, tal como cada um concebe Deus, nele acredita e com ele se relaciona, ou até do modo como não acredita, tem um antecedente na história de grupos de auto-ajuda, os Alcoólicos Anónimos (A.A.). Os seus fundadores praticam-na desde 1935 como recurso de reabilitação na sua dimensão espiritual. Foi encontrada para a fraternidade não se identificar com uma religião, pois não é de uma igreja nem é um movimento religioso mas de auto-ajuda aberto a todos os que pertencem e não pertencem a uma religião ou igreja e até para aqueles que não têm nenhuma religião e desejam deixar o álcool. Os fundadores descobriram que sem os álcooldependentes reconhecerem que eram impotentes perante o seu problema e sem recorrerem a um Poder Superior como princípio de cura espiritual da dependência do álcool, não se curavam do seu orgulho nem da doença alcoólica. O terceiro passo dos seus doze princípios ou passos diz: viemos a entregar as nossas vontades e as nossas vidas a Deus como cada um o concebia. Os prolongados contactos do autor com os A.A. em Portugal e em vários países deixou-lhe a convicção de que o principio é eficiente para os dois ou três milhões que o seguem os passos em todo o mundo.

Neste momento em que são redigidas estas notas o encontro de oração está a começar na Igreja de Santa Maria degli Angeli em Assis. O Poder Supremo, o Deus e Pai de toda a Humanidade vai ouvir e os representantes de tantas religiões. Será o segundo passo deste género para conseguir a verdade e a paz. O promotor do primeiro, Beato João Paulo II, lá do céu será um forte intercessor junto do Pai pelo sucesso espiritual deste encontro em união com S. Francisco o patrono da “Paz e Bem”. O Deus único e de todos aceitará a entrega da vontade e da vida dos que se sentem impotentes, por si sós, de conseguir a verdade e a paz.

Funchal, 27 de Outubro de 2011

Aires Gameiro


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Clamor dos pobres numa sociedade de ricos?

Portugal está a tornar-se um mundo complexo, de leitura difícil, cheio de contradições e interrogações, com muitos opinadores desencontrados, muitas ideias que se entrechocam, muitos interesses em jogo, muita gente que mal ouviu e tem logo, debaixo da língua, respostas de apoio ou de contestação.

Quando se trata de acertar caminhos que deverão andar juntos, as divergências em campo, não se percebe se por ideologias, se por interesses pessoais e partidários, logo se dividem as pessoas e se estilhaçam os propósitos mais urgentes, de ir ao encontro de problemas, que são comuns a todos.

A situação económica é grave, muitas pessoas, por vezes as mais débeis, estão fortemente atingidas, a classe média, que antes vivia com um certo desafogo, embora com regras, encontra-se em derrapagem. Os problemas multiplicam-se, tanto mais quando não se enfrentam em conjunto. Quem tem de decidir encontra-se ante forças antagónicas que ou apoiam ou nada encontram de válido nas decisões anunciadas ou tomadas.
O bem da comunidade vê-se sempre parcelado, mais a partir de ideologias diferentes que de interesses comuns. Assim, cada um agarra-se à leitura pessoal ou de grupo, aos seus compromissos políticos, a perspectivas e preconceitos, sem o aparente desejo de uma solução que empenhe a todos. Há na vida, e, mais ainda, na vida nacional, momentos em que têm de se arrear bandeiras e darem-se as mãos, sacrificando algo de pessoal a favor do bem possível de todos. A política é acção do possível e o ideal torna-se o possível em cada situação e em cada circunstância. Parece, porém, que isto pouco tem a ver com o debate parlamentar e as organizações corporativas.

Certamente que os decisores devem saber ler objectivamente a realidade, escutar, sem preconceitos, os que devem ou podem dar achegas para ver mais claro e decidir com maior realismo. A democracia não gera dogmas, mas consensos, os possíveis, não os utópicos. A facilidade como se fala do povo vai-se tornando um ultraje ao mesmo.
As oposições que pensam e querem o bem da comunidade de algum modo também governam pelo contributo responsável e sério que delas é legítimo esperar. O clamor dos pobres depara-se, com frequência, com a barreira de inúmeros políticos e pensadores, de grupos e corporações, que mais deviam ouvir esse clamor e ajudar quem grita, que levantar muros de incomunicação. Nunca foi fácil, nem agradável, governar e decidir em tempos de crise. Estamos passando por uma situação igual àquela porque passaram outros países da Europa que, por fim, venceram, porque todos juntos foram capazes de procurar o melhor caminho possível e todos se decidiram andá-lo. Só as gerações mais jovens desconhecem talvez esta realidade.

A comunidade adulta, com memória e bom senso, não acredita e nunca acreditou nos que julgam saber tudo, terem toda a razão do seu lado e serem os únicos com lucidez para mostrar os caminhos certos. A verdade é que o poder democrático de decisão não está diluído. Tem rosto para poder ser responsabilizado, a seu tempo.

Tem feito falta julgar e responsabilizar quem governa e leva o país a situações dramáticas, como agora aconteceu. Os pobres não o são por opção, mas por um desgoverno que parece ter sido já esquecido, tanto por correligionários, como por opositores. Não há efeitos sem causas, e estas estão à vista. É normal que quem empresta ponha condições, e que quem precisa encontre um terreno de negociação limitado.
Certamente que é triste e duro ver o desemprego crescer, casais a entregar à banca a casa que não conseguem pagar, aproximar-se o Natal sem o habitual subsídio, diminuir no ordenado o que é indispensável para suportar despesas de educação inevitáveis, a mesma gente que perdeu também o abono de família e a bolsa de estudo… E muito mais por aí adiante… Mas tudo isto dará direito a alguém de se considerar o único defensor do povo a contrapor-se a quem se acusa ser o seu carrasco?

A sociedade de ricos é a daqueles que se julgam saber tudo, ter solução para tudo, negar-se à colaboração com os que apodam de criminosos, só porque estão no poder e as suas ideologias não se casam.

Os governantes não são génios, nem infalíveis. Mas também não o são os que parece que só sabem criticar. Se não formos capazes de ser inteligentes e colaboradores, a crise será cada vez maior e o clamor do povo sofredor não terá quem o ouça.

D. António Marcelino


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26/10/11

O «último segredo»... de Rodrigues dos Santos...

Ainda não li o livro, e não sei se o vou ler.
O que eu ouvi, foi a entrevista dada pelo seu autor na RTP 2, na noite de Sábado, 22 do corrente, dia do lançamento da obra. Ouvi-a, e achei tão despropositadas as suas afirmações que, primeiro, fiquei nervoso e irritado, mas depois ri-me, ri-me sem parar. As “patacoadas” do jornalista, ditas com tanta desfaçatez e prosápia, na mesa das entrevistas, primeiro pareceram-me jactantes, e depois, também ridículas.


Eu sei que não sou biblista, nem exegeta, nem teólogo, nem investigador dessa área, mas não é preciso ser nada disso para ser capaz de detetar a insensatez do visado e a ligeireza das suas afirmações, em questões tão sensíveis e tão graves.
Para mim, antes de mais, as suas afirmações são indício de uma enorme ignorância em assuntos religiosos.

Por falta de espaço, só três ou quatro, a título de exemplo:
-“Jesus nunca foi cristão”! Pois não. Que assombrosa descoberta! Como é que Ele havia de ser cristão? Cristãos são os Seus discípulos! Cristãos são aqueles que O seguem!
-“Jesus não se chamava Cristo”! Pois não. Que estupenda novidade! Toda a gente sabe que o nome indicado pelo Anjo anunciador da Sua vinda é apenas Jesus: Deus que salva. O nome ou o título de Cristo foi-lhe aposto pelos seus discípulos para significar a Sua missão messiânica, título que Ele aceitou e com o qual sempre concordou, uma e outra vez.
-“Os que escreveram os Evangelhos não conheceram Jesus”! Toda a gente sabe que o evangelista Lucas foi discípulo de S. Paulo e Marcos, de S. Pedro. Mas Mateus? E João? O Evangelho deles não conta? E não andaram os dois com Jesus? João até assistiu à Sua Morte no Calvário! E Lucas? E Marcos? Não ouviram o que escreveram, da boca dos que conheceram Jesus? Não terão ouvido mesmo muitas coisas sobre Jesus e a sua vida privada e pública, da boca de Maria que sobreviveu a Jesus?
-“José não era indigente”! Meus Deus, mas quem disse alguma vez que o carpinteiro era indigente ou andava pelas portas de Nazaré a mendigar?
-“Jesus foi racista e malcriado”! Só por brincar um pouco com a mulher que haveria de curar e libertar dos seus males, logo a seguir, usando a metáfora dos filhos e dos cachorrinhos?
Valha-nos Deus, valha!
Para alguém se tornar famoso e vender muito livros, é preciso entrar por esse caminho de afrontar a fé dos outros e de lançar a confusão entre pessoas portadoras de uma fé menos bem fundamentada?
A partir do século XVIII, legitimamente, têm alguns autores tentado escrever biografias de Jesus fazendo uma análise crítica dos Evangelhos, e fazendo ressaltar o “Jesus histórico” em contrabalanço ao “Jesus da Fé”. É útil que tal se faça e continue a ser feito. Muitos deles são gente séria, com amor à verdade e com objetivos honestos. Esses merecem todo o nosso respeito, e talvez até a nossa gratidão. Outros porém, fazem-no para se escaparem ao Jesus da Fé - o “Filho de Deus” feito “Homem” para nos vir salvar - que recusam e não aceitam, e acabam por descobrir em Jesus o que a cada um deles interessa ou satisfaz: entre estes últimos, já houve quem visse em Jesus um “sábio”, um “curandeiro”, um “profeta”, um “contador de histórias”, um “rabino”, um “marginal perturbador”, um “revolucionário” de esquerda, e até já houve quem o considerasse o primeiro “comunista” da história.
No caso de Rodrigues dos Santos, na fila de Saramago e de Dan Brown, deseja-se apenas, a meu ver, fazer sensação e dar escândalo, para despertar a curiosidade dos incautos e fazê-los correr às livrarias.
Será honesto e sério chamar ao livro romance e dizer depois lá dentro que, o que nele se contém, “é fruto de informações e investigações históricas genuínas”? Que brincadeira é esta? Trata-se de ficção, ou de história? De factos comprovados, ou de imaginação e sonho?
Essa de o autor se fazer filmar em Jerusalém e nos corredores do Arquivo do Vaticano, para mostrar que andou mesmo por lá à procura dos manuscritos, e para exibir depois os filmes na hora da apresentação do livro, fez-me rir às despregadas!
Que pobreza a nossa! Que literatura se lê e admira, hoje, em Portugal! Lobo Antunes tem razão e mais que razão no que disse há dias acerca Rodrigues dos Santos. Os grandes mestres da língua, Eça de Queirós ou Camilo, se pudessem cá dar um pulo, varriam todos estes aprendizes da escrita à vassourada.
Para além de tudo isto, doeu-me também muito ver um padre a fazer a apresentação de uma “coisa destas” e alinhar num truque destes, contribuindo também ele, ainda mais, para lançar a confusão entre os bons crentes. A escolha do apresentador não foi inocente!...e o sacerdote em causa, ou caiu num logro, ou também gosta destas coisas, o que ainda é mais lamentável.
O autor, tentando camuflar os seus propósitos, disse que o seu livro era “apenas um ponto de partida, permitindo aos leitores irem depois investigar…”. Até parece que o autor inventou agora a pólvora, que toda as pessoas antes dele, inclusive os verdadeiros investigadores, viveram na ignorância e no erro, e que a Igreja nada mais tem feito do que meter patranhas na cabeça dos católicos. Se não o disse claramente, andou lá perto!
As discussões acerca da personalidade de Jesus começaram cedo, logo nos primórdios do cristianismo: Jesus, Filho de Deus? Jesus, apenas um filho do Homem? Não foi Rodrigues dos Santos que lhe deu início. No Concílio de Niceia (ano 325), encontraram os cristãos os elementos fundamentais para a unidade da sua Fé e registaram-nos no chamado Credo ou Símbolo de Niceia. Não os inventaram ou forjaram…como disse o autor do livro em causa.
Também não estou a ver, a partir de agora, os católicos a correr os corredores dos arquivos de Roma e de Jerusalém à procura das ditas fontes e a decifrar os citados manuscritos, para verem se Rodrigues dos Santos tem razão ou apenas despejou algumas atoardas!
Valha-nos Deus, valha!

P.Scriptum. –Lamento ainda, e tenho pena, que tendo toda a gente ouvido Rodrigues dos Santos na televisão negar o dogma da Virgindade de Nossa Senhora, nenhum dos nossos bispos nem o Conselho Permanente do Episcopado tenham vindo em sua defesa. Para não darem ao autor a importância que ele julga ter e não tem?... Talvez. Mas a verdade é que, quem cala consente…ou pelo menos parece consentir, o que é muito prejudicial, por permitir mais uma vez a incerteza e a confusão na nossa Igreja. Os bispos, que me perdoem, mas são eles, por função própria, os vigilantes defensores da fé católica. Ou devem sê-lo. Não podem deixar o seu rebanho à mercê dos lobos salteadores que agora são muitos, se multiplicam como os labrestos, e abafam cada vez mais a semente da Fé e a flor da Caridade.
Ouvi alguns dos nossos bispos manifestar o seu protesto contra os impostos recentemente introduzidos…assunto que diretamente lhes não diz respeito a eles…E agora? Em assunto da sua responsabilidade, ficam retraídos, calados e desinteressados?

Perdoe-se-me o desabafo, mas é o que eu sinto. É assim que eu penso.

Resende, 25 de Outubro de 2011

J. Correia Duarte




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No xadrez da Missão... Uma Rainha e um Bispo!

Em uníssono com toda a nossa igreja, vimos todos celebrando mais um outubro missionário.
E bem, porque o campo de missão que antigamente eram as Africas, agora também é a Europa, Portugal, Lisboa, Lamego, e cada uma das suas comunidades. O desinteresse pelos valores espirituais e o desleixo na procura da Fé e da Palavra de Deus são tão frequentes que uma grande parte da nossa gente já não sabe nada de Deus, nem dos caminhos que até Ele nos levam.


Daqui a pouco, se a situação não se inverter, as nossas terras serão as terras da missão, e terá que vir da África e das Américas alguém que venha evangelizar-nos a nós.

Nesta circunstância, aproveito para trazer à colação a preocupação de uma nossa rainha e a colaboração pronta e generosa de um dos nossos bispos.

Em 17 de Junho de 1778, através da Secretaria dos Negócios do Ultramar, sedeada no Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, em Lisboa, a rainha D. Maria I – a ”piedosa” (agora preferem chamá-la “a louca”…), preocupada com a situação da causa missionária nas nossas “Conquistas do Ultramar”, e mais concretamente na nossa “Província de Angola”, onde, segundo as “Relações” enviadas a seu pedido pelos bispos aí residentes, “a administração dos Sacramentos, o Culto Divino, a Pregação do Evangelho, e todos os mais actos de Religião se acha(v)am quazi sem exercício e pouco menos que abandonados”, dirigiu uma carta aflitiva a todos os bispos do Reino, pedindo-lhes socorro para aquele “infeliz rebanho que Nosso Senhor Jesus Cristo remiu com o Seu Precioso Sangue e que, por falta de Pastores, morria à míngua”, e que exortassem os seus diocesanos a oferecer-se para servirem “nessa glorioza e santa impreza”.
O Bispo de Lamego, D. Manuel de Vasconcelos Pereira de Melo não se descuidou na resposta. Dez dias depois, exaltando essa exemplar preocupação da Rainha, dirigiu uma “Carta Circular” aos sacerdotes do bispado, nos seguintes termos: “ao vermos a dilatada seara do Senhor destituída de operários precizos para plantar, para edificar, e para arrancar e destruir, exhortamos a cada hum dos nossos Veneráveis Irmãos Sacerdotes que se achar animado do Espírito Apostólico, que preferindo a Glória do Deus Eterno na salvação das Almas do Próximo, às comodidades e descanso doméstico, e querendo dar o seu nome dentro em quinze dias depois da notícia desta Carta Circular, no-lo faça saber para assim o fazermos prezente à rainha Nossa Senhora, afim de se darem as providências precizas para o transporte e subsistência dos mesmos; e aos que não se acharem com o mesmo espírito, mandamos que, elevando frequentemente o seu coração ao grande Pai das Misericórdias, lhe roguem que mande operários dignos e que fação frutificar e renascer aquela seara quazi extinta.”(Livro de Pastorais e Capítulos de Visitações de Taboaço, 1776-1799)

Como fazem falta, hoje, reis assim!
O xadrez da igreja e do país estaria talvez bem melhor!

Resende, 18.10.11
J. Correia Duarte


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24/10/11

Manifestações/greves não afundam (mais) o nosso futuro?

Foi nítido e objetivo, um espanhol a trabalhar em Portugal, participante nas manifestações dos ‘indignados’, denunciou a manipulação dos protestos mais recentes contra as medidas do governo: há muitos membros das esquerdas – conceito anacrónico em era de globalização, tendo em conta a história após 1989! – infiltrados nas pretensas ‘populares’ concentrações...

Seja qual for o número apresentado – há muitas pernas e poucas cabeças ou muitos braços levantados e poucos com desejo de trabalhar – nota-se um razoável aproveitamento do ‘estar contra...’, pois, ao menos, parece haver, momentaneamente, ocupação para desempregados e sindicalistas, para arregimentados e militantes, para oportunistas e outros/as ‘istas’ do faz-de-conta... com cobertura noticiosa e (aparentemente) informativa... do ‘quanto pior, melhor’.


= Medidas duras: necessárias, urgentes ou irremediáveis?
Depois de termos, sobretudo nos últimos dez anos, vivido – mesmo sob a batuta de governos de cores diferentes – numa espécie de mentalidade de gastanço, endividamento, consumismo sem olhar a meios nem às consequências a curto prazo, descobrimos, de repente, que estamos na falência e sem meios de continuarmos a viver nessa falsidade de vida e dum certo forrobodó... pessoal, familiar, social e coletivo.

Foi preciso que viessem do estrangeiro – a dita troika: FMI, BCE e UE – traçarem-nos um plano de austeridade, que tem tanto de simples, quanto de amesquinhador da nossa inteligência: somos incapazes de nos sabermos governar e de nos governarmos corretamente.

Àqueles que nos colocaram nesta situação de insustentabilidade, urge levá-los a tribunal para pagarem pelos erros e más opções. As eleições, de fato, foram juízos de avaliação, mas não serviram para momentos de criminalização. Não basta sacudir o capote, deixando a outros a responsabilidade das consequências das más opções e de funestas decisões... políticas e partidárias.

Até os que foram acicatando a vontade de consumo – o povo deixa-se manipular por habilidosos e bem-falantes! – devem ser culpabilizados, pois tanto é ladrão quem rouba como quem instrui para a usurpação da fraude mesmo que capciosa, subtil e encoberta.

Infelizmente, se não forem tomadas medidas de contenção, de correção dos erros e de moderação nos gastos, muito em breve, seremos um país sem credibilidade... mesmo para nos darem ajuda e dinheiro a crédito.

Desgraçadamente, em certas posições alguns sindicalistas, parece que estão desfasados da vida real, pois talvez nem conheçam os preços das coisas nos mercados e até continuem a viver na jaula dourada das suas regalias, fomentando azedume em vez de concórdia, reivindicação em vez de diálogo e preguiça em vez de trabalho... honesto, participativo e comprometido.


= Justiça e boa fé: condições ou exigências?
Neste momento conturbado da nossa identidade coletiva parece ter chegado a hora de unirmos esforços de todos e para tudo quanto nos possa recriar com identidade nacional. Falar de nacionalismo não pode continuar a ser uma espécie de heresia e muito menos num rótulo ideológico: em tempos era (quase) prerrogativa dos setores conotados com a direita, agora são outros (ditos) de esquerda que se tentam apropiar de tudo quanto possa acirrar os ânimos mais derrotados.

Certas manifestações e greves deixam-nos um tanto confusos sobre qual deve ser a leitura de tais ‘direitos’, pois estes podem colidir com os mais elementares deveres de boa fé na defesa dos fragilizados da nossa sociedade. Na medida em que formos inteligentes de forma suficiente saberemos quem nos fala verdade ou quem nos tenta usar em ordem a conseguirem os seus objetivos, andando na crista da onda em vez de navegarem com rumo e enfrentando as marés mais adversas.

Por vezes certo barulho tenta confundir os incautos e até serve para disfarçar as mais tenebrosas intenções. É de justiça que nos esforcemos por contribuir para a boa harmonia entre todos, dando cada um de nós o nosso contributo mais sincero e audaz... começando pelo seu círculo de convivência e de trabalho.

António Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com)



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Santa Beatriz estrela da coroa da Imaculada Conceição em Congresso

Santa Beatriz estrela da coroa da Imaculada Conceição em Congresso
Santa Beatriz da Silva e os 500 anos da sua Ordem foram celebradas por 200 participantes no Congresso Internacional da Ordem da Imaculada Conceição em Fátima, de 14 a 16.10.2011.

A organização foi da responsabilidade de historiadores do CLEPUL da Universidade de Lisboa e outros académicos vindos de universidades de Espanha, Brasil, Rússia, Portugal. Os contributos da teologia, da história da arte, do teatro e dos testemunhos de contemplação de Irmãs, vindas dos mosteiros de Portugal, Espanha e Brasil enriqueceram os conteúdos de tão magna realização cultural.

Os dados da investigações realçaram o lugar, afirmação e originalidade de Santa Beatriz, a sua devoção à sempre Imaculada Conceição, o seu lugar na história das mulheres cultas dos séculos XIV, XV e XVI. Foram evidenciados os temas da relação de Beatriz com a figura única da Imaculada Conceição, da presença desta na identidade de Portugal e do papel privilegiado das Irmãs da Ordem da Imaculada Conceição para manterem vivo o carisma do seu culto e dar-lhe um lugar central na vida da Igreja nos séculos passados e no presente.

Debateu-se a união da Imaculada Conceição com o seu Filho Jesus, mesmo quando os seus ícones não o explicitam, com excepção das chamadas Imaculadas franciscanas em que tem Jesus Menino no braços. Não haveria Imaculada Conceição sem o Redentor Filho de Deus a ter pré-redimido, ficando nela como graça plena de redenção, como explicitou Duns Scoto. Este teólogo desfez dúvidas e fundamentou a isenção do pecado e a plenitude da graça em Maria Imaculada, “ a sempre inteira”, na expressão de S. João de Deus nas suas cartas. Imaculada Conceição em virtude da redenção antecipada do Filho de Deus e Filho de Maria, que lhe deu a carne Redentora. Jesus redimiu-a na cruz e fê-la em antecipação Imaculada cheia de graça desde o primeiro momento da sua Conceição, como o anjo a saudou e não apenas isenta de pecado. Aquela em quem Deus fez maravilhas.

Santa Beatriz, por sua vez, recebeu o dom de acreditar que Maria era a Imaculada, a enriquecida por seu Filho. E recebeu o dom de se entregar a Ela e de lhe entregar a Ordem que quis fundar. Vem à mente a Virgem Imaculada de Guadalupe, México, revelada em 1531, em imagem real aos olhos de todos, e aos olhos da cultura local, sem distância mesmo aparente entre Ela e Jesus. Maria imprimiu no manto de fibra de cacto do “Joãozito Diogo”, a sua imagem que logo se fez livro aberto para a cultura dos azetecas. Tem o cabelo solto, é virgem; tem o tronco cingido por uma faixa, é mãe. Virgem e mãe, Mãe já grávida de Jesus. Tapa o sol, é mais que o deus sol azeteca; pisa a lua serpente do mal, está acima dela; está ornada de estrelas no seu manto, é mais que todos os deuses estrelas; tem as mãos erguidas em oração a Deus, não se apresenta como deusa.

Naqueles três dias em Fátima os 200 participantes, orientados por dados da história, contemplaram a Imaculada Conceição com o seu Filho ao colo ou no seu seio, a partir da vida da estrela Santa Beatriz da Silva. Santa Beatriz com a numerosa corrente imaculista de fiéis anticipou-se à revelação que Nossa Senhora fez na medalha milagrosa em 1830, “concebida sem pecado”, à proclamação de Pio IX em 1854, e á própria confirmação de Lurdes em 1858: “eu sou a Imaculada Conceição”.

Santa Beatriz viveu as “escaramuças” entre franciscanos imaculistas e os dominicanos contra-imaculistas e não teve dificuldade de se situar ao lado dos que acreditavam no privilégio da Imaculada Conceição e se consagrar a Ela. Foi uma surpresa para muitos descobrirem no Congresso que a Ordem da Imaculada Conceição tem vocações jovens e 3000 Irmãs a viver em 155 Mosteiros dispersos pelos quatro continentes: Europa, América Latina, África e Ásia.

O Congresso teve um grande alcance histórico por ajudar a dar corpo, alma e espírito a esta mulher forte, Beatriz, tirando-a de algumas brumas da história em que tem estado encerrada com teria estado naquele cofre em que a rainha tinha planeado que morresse para se aliviar dos seus ciúmes doentios. Mulher situada na história, afirmativa e santa: uma inovadora pela Ordem que quis fundar e pela sua presença hoje nessa Ordem da Imaculada Conceição que deu à Igreja mulheres místicas de primeiro plano, e em que não faltam hoje jovens Irmãs da sua têmpera.

Fátima, 16 de Outubro de 2011

Aires Gameiro




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Ao Compasso do Tempo - Crónica de 21 de Outubro de 2011

Em que ficamos? Após uma entrevista minha ao canal televisivo nº 1, onde salientei mais uma vez (tinha lá estado em Julho último) as dificuldades/tragédias, nascidas do cumprimento dos objectivos da troika, conforme têm sido interpretados, dada a sua excessiva rigidez em ordem a concitar confiança junto dos “patrões”.


Não há dinheiro. Há que reparar erros cometidos. Estamos no fim da linha… Após isto, só o abismo. É a medida necessária (Vítor Bento). Há que prosseguir, após o infausto do estilo passado (João Salgueiro). O Orçamento de Estado para 2012 parece mau demais para ser verdade. O cenário económico que o suporta prefigura a pior recessão desde 1975 (…) Se (Portugal) suportar os sacrifícios e procurar novas soluções vencerá a crise (João César das Neves, Agência Ecclesia, 18 de Outubro de 2011, p. 16). As medidas do Orçamento são duras, corajosas, indispensáveis. Mas não resolvem nada (José César das Neves, Diário de Noticias, 17 de Outubro de 2011, p. 54). Acrescento que as declarações de Vítor Bento e de João Salgueiro as ouvi na “Sic Notícias”, em 19 desta semana.

Um conhecido meu, que viajou pelo Norte, nos últimos dias, relatou-me que, dos contactos com pessoas afins, ou seja, da Igreja que constituímos, concluiu que aquelas estavam zangadas comigo!

Muitas me contactaram. Chamaram-me a atenção notícias no Facebook. Telefonaram-me. Mau grado a delicadeza da questão, ninguém me corrigiu a análise feita. Trata-se de terreno escorregadio. Tenho intuições, vou empacotando conclusões e apoios que leio de revistas e livros da especialidade e ouso aprender para ajudar. Mas só me chegaram apoios.

E, nesta contemplação tão árdua, onde, prioritariamente, me continuo a perguntar: para nos salvarmos economicamente, pedimos dinheiro emprestado e jurámos pagá-lo. Só que este transe acarreta um naufrágio tão forte, que os “mais pequeninos” vão-se afogar…

Ou seja, em vez de morrermos cerca de 9/10 milhões de portugueses (as), que sucumbam só 2 milhões, número patético de pobres que há por aí. Salve-se a maioria. Os outros, que construam jangadas e se aproximem das margens… Mas é assim?

Hoje (19 de Outubro) ao fim da tarde, ao escutar as posições do Presidente da Republica, afirmando que os limites do sacrifício já foram ultrapassados, sendo desrespeitada a equidade fiscal, com os cortes dos subsídios , pergunto-me diante da ciência económica: mas onde está a verdade? E, pessoalmente: onde o meu erro? Pagam os funcionários públicos (sempre bombos de festa. Por exemplo: os trabalhadores da RTP e da RDP não receberão os subsídios citados. Mas aos da Sic, não se aplicará essa determinação…) e demais trabalhadores… E outros? Mas a “arraia miúda” desaparecerá …
Patrioticamente por que não se dialoga nas mais altas instâncias? Por que não temos a fome do saber, em ordem à justiça, longe de primarismos emocionais e de emblemas clubísticos?

Dou-me conta de espantosa confusão em sectores primordiais! E, por prudência e sensatez, vou-me convencendo de que, em questões de recursos financeiros, começa a ser dita a certeza de que não há dinheiro. E chegamos aqui: pobre de quem nunca teve nada! E não é a Igreja a “Igreja dos pobres”, conforme a meditaremos no próximo “Ano de Fé! (11 de Outubro de 2012 a 24 de Novembro a 2013)?


Lisboa, 21 de Outubro de 2011
D. Januário Torgal Mendes Ferreira
Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança



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20/10/11

O maior desafio feito à Igreja

Gostaria de perguntar a muitos cristãos, leigos e clérigos, dos mais diversos meios e idades, qual consideram ser o grande, senão mesmo o maior, desafio que a Igreja enfrenta hoje.

Admito que uns falariam da crise das vocações, do desnorte das famílias, da idade avançada dos padres, da evangelização, assim em geral, como que a dizer tudo e a não dizer nada. Também se poderiam ouvir as dificuldades da linguagem usada para comunicar o Evangelho, os diminutos passos dados no diálogo com o mundo e a cultura emergente, da crise da vida comunitária das pessoas e das estruturas pastorais. Talvez ainda, apesar dos ecos favoráveis das Jornadas Mundiais da Juventude, em Madrid, falariam do desafio que os jovens constituem. Todos estes e muitos outros temas, em campo, constituem, por certo, problemas e desafios incómodos e difíceis. Mas qual o maior?

Não podemos deixar de concretizar, a ponto de incomodar, aquele que se poderá considerar o desafio mais englobante, no qual vão entroncar todos os outros. Será, talvez, a debilidade da fé dos que se dizem crentes e consideram a Igreja como espaço que ainda lhes diz algum respeito. Não há meios técnicos para medir a autenticidade e a verdade da fé das pessoas. Cada uma tem o seu itinerário religioso próprio, foram diferentes as oportunidades que se lhe abriram para crescer na fé, e, ao afirmar-se cristão, ninguém gosta que duvidem da sua religiosidade. A prova final é a vida de cada um. Há gente com grande coerência entre o que acredita e o que vive. Outra que deixa os sentimentos e as coisas religiosas para determinados dias, acontecimentos e lugares. Alguém disse que, tal como na sociedade actual, também na Igreja reina o caos, onde se encontra de tudo. Aí se expressam as maiores diversidades e opções em relação à prática religiosa, ao estilo de família, à intervenção social e política, para não falarmos já dos permanecem no templo e exprimem a pluralidade de caminhos de acção, da liturgia às estruturas de participação, dos leigos agindo quase por favor, àqueles que evoluíram e reivindicam, legitimamente, o direito à iniciativa, à palavra, à liberdade de associação.

É neste contexto, a meu ver, que emerge o grande problema: uma Igreja que, por sua natureza, é uma comunidade de crentes adultos e na qual muitos dos seus membros não o são, nem têm vontade ou motivação para o vir a ser. O ambiente é marcado por valores e tradições cristãs, que permitem humanização da vida e a sua dimensão transcendente. Porém, os dinamismos mais influentes na sociedade, nem sempre contrários à Igreja, processam-se, normalmente, à margem da Igreja, sem que se vislumbrem propostas alternativas. Dir-se-á que ainda há igrejas cheias. É verdade.

O pluralismo é um valor estimável, que nem sempre se vê assumido e promovido nas comunidades com marcas de um clericalismo serôdio. João Paulo II levantou a bandeira da “nova evangelização” para ir ao encontro dos cristãos tradicionais, adormecidos ou convencidos. Bento XVI caminha no mesmo sentido. Mas, a nova evangelização não vive de acontecimentos de massa, ou de iniciativas de passagem que podem comover, mas não chegam a converter. A pedagogia de uma evangelização com futuro é de promoção e aproveitamento das relações primárias, de modo a gerar motivação; de formação de líderes que testemunhem, com normalidade, a sua fé; da criação grupos, não nascidos por força de decisões superiores, mas propostas de reflexão serena, aberta e de confronto da vida com a Palavra de Deus; de uma prática orante adequada; de progressiva abertura aos outros e às suas condições de vida… Evangelizar as pessoas, pelo anúncio jubilosos de Jesus Cristo, Redentor e Salvador, exige que, ao mesmo tempo, para que o seja depois de modo mais alargado, tocar nos ambientes e nas estruturas da sociedade. Evangelizar não é fazer praticantes de culto, mas crentes adultos com testemunho de vida e compromisso apostólico.

Bento XVI fala de uma Igreja na Alemanha com muita organização e pouco espírito, com muito mundo e pouca espiritualidade. Também se pode falar nos países de tradução religiosa, como Portugal, de uma Igreja ainda mais voltada para conservar tradições e estruturas paralisantes e menos atenta a caminhos novos, exigidos pelas mudanças sociais e culturais, e por ser essa uma necessidade urgente de tornar o Evangelho acessível. Com esta apreciação pouco optimista, como se pode pensar, não se podem esquecer as muitas iniciativas válidas e promissoras, não se pode passar ao lado do esforço generoso de bispos, padres e leigos que, na sua vida e acção, animados pelo Espírito vão criando caminhos novos. Mas, até neste ponto, no conjunto nacional, dentro das dioceses e das paróquias, há estrangulamentos individuais lamentáveis. A evangelização não dispensa testemunhos comunitários e estes não se improvisam.

D. António Marcelino


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13/10/11

Fim das ilusões... chegou a austeridade

“Acabaram os tempos de ilusões. Temos um longo e árduo caminho a percorrer, para o qual quero alertar os portugueses de uma forma muito directa: a disciplina orçamental será dura e inevitável, mas se não existirem, a curto prazo, sinais de recuperação económica, poder-se-á perder a oportunidade criada pelo programa de assistência financeira que subscrevemos”, afirmou Cavaco Silva nas comemorações do 101.º aniversário da implantação da República.

Vindo de quem vem e na data que lhe é apropriada, temos de levar muito a sério esta prevenção... não aconteça de ontem já ter sido tarde começarmos a viver na contenção e sob a regra da temperança pessoal, familiar, social e política.
Respigando alguns excertos do discurso presidencial, tentaremos abordar aspetos de provocação cristã à nossa quase inconsciência de gastadores sem crédito.

= Letargia do consumo fácil
“Durante alguns anos foi possível iludir o que era óbvio... Perdemos muitos anos na letargia do consumo fácil e na ilusão do despesismo público e privado. Acomodámo-nos em excesso”, salientou o Presidente da República.
Agora é mais difícil aferirmos os nossos comportamentos, pois nos habituámos – depressa demais no tempo e excessivamente na mentalidade – a viver como se fôssemos ricos, embora só éramos subsidiados para que não invadissemos os países do norte da Europa. De fato, quisemos equiparar-nos na bastança com quem nos deu a mão para entrarmos na Comunidade Europeia, mas esquecemo-nos de viver na dinâmica de trabalho que esses países e culturas viviam e continuam a viver... para gerarem riqueza.
Ainda estamos a tempo de evitar a bagunça que vamos percebendo na Grécia. Por isso, precisamos que nos falem verdade e que vivamos na coerência sem falsos profetas da contestação a troco de maior miséria... a curto prazo. Nem a ditas ditas greves – a Grécia já vai em onze greves gerais só este ano! – ou as manifestações setoriais nos podem fazer esquecer do caminho a percorrer em ordem a sermos – novamente – um país de sucesso, de paz e de trabalho digno e dignificador.

= Austeridade digna
“A crise que atravessamos é uma oportunidade para que os portugueses abandonem hábitos instalados de despesa supérflua, para que redescubram o valor republicano da austeridade digna, para que cultivem estilos de vida baseados na poupança”, referiu ainda o chefe de Estado.
- Para quantos se reclamam do espírito republicano de igualdade e sem mordomias é chegada a hora de deixarem cair as máscaras de benesses e de regalias... de regime instalado.
- Para quantos se dizem cristãos – onde o espírito de pobreza, que é muito mais do que a pobreza de espírito! – é chegado o momento de procurarem viver em conformidade com o essencial e sem coisas supérfluas.
- Para quantos se tentam afirmar pelo ter, é chegada a ocasião propícia de centrarem a sua vida no ser... autêntico e verdadeiro.

Nós que já fomos pobres e honrados podemos e devemos ser honrados embora um tanto mais pobres, temos de saber interpretar a redução de coisas materiais, reaqualificando a nossa vida à luz do essencial, abrindo-nos à partilha e à (verdadeira) caridade.

António Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com)


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Festas religiosas como espaço do ‘átrio dos gentios’

Sem pretendermos dar quaisquer lições, importa situar as ‘festas populares’ na sua componente religiosa como atos de cultura, incluindo vários aspetos da nossa linguagem mais ou menos inteletualizada, com recurso a certos tiques de mito e/ou inseridas na vertente ritual.

Num tempo como este que estamos a viver, designado de ‘crise’, as épocas de festa tornam-se como que catalisadores ou escapes da nossa vida pessoal e mesmo coletiva. O recurso à descontração gera, em nós e à nossa volta, novos comportamentos, nem sempre perceptíveis na sua singularidade.
De fato, é na dificuldade que se reúnem todas as forças para que sejamos capazes de refontalizar a nossa ‘personalidade coletiva’… mais abrangente e profunda.

= Manifestações da religiosidade popular
Partindo daquilo que se diz no Catecismo da Igreja Católica (n.º 1674 a 1676) como que podemos alicerçar a nossa convicção de que as festas religiosas manifestam «o sentimento religioso do povo cristão», tendo várias expressões desse sentimento – note-se que não se diz da racionalidade nem da emotividade – desde as mais comuns, como as visitas aos santuários, as peregrinações e as procissões até às mais populares, como as danças religiosas – veja-se a expressão do folclore e das suas letras – incluindo-se mesmo os momentos de via-sacra e as recordações trazidas/levadas dos lugares visitados ou outros objetos religiosos… normalmente benzidos.
Citando o Concílio Vaticano II, na constituição sobre a Liturgia Sacrosantum Concilium (n.º 13), o Catecismo refere que as festas religiosas ou manifestações da religiosidade popular «são um prolongamento da vida litúrgica da Igreja, mas não a substituem. ‘Devem ser organizadas, tendo em conta os tempos litúrgicos e de modo a harmonizarem-se com a liturgia, a dimanarem dela de algum modo e a nela introduzirem o povo; porque, por sua natureza, a liturgia lhes é, de longe, superior’».
Por seu turno, no Directório sobre a Piedade popular e liturgia (n.os 245 a 247), falando das procissões, refere-se: «na procissão, expressão cultual de carácter universal e de múltiplos valores religiosos e sociais, a relação entre a liturgia e a piedade popular reveste-se de particular relevo».
Será que temos tido para com as várias manifestações da religiosidade popular uma atenção ou uma desculpa? Não será que, muitas vezes, deixamos correr as coisas para não termos problemas, embora saibamos que nem tudo está correto? Até onde poderá ir a nossa intervenção delicada, serena e cuidadosa para que, em particular, as procissões possam ser manifestações de fé e não de mero folclore com cobertura religiosa, mas não cristã?
Tal como se diz no Catecismo, «para manter e apoiar a religiosidade popular, é necessário um discernimento pastoral», seja para purificar ou para corrigir «o sentimento religioso subjacente a essas devoções e para fazer progredir no conhecimento do mistério de Cristo».
Por outro lado, o Directório diz: «Nas suas formas genuínas, as procissões são manifestações da fé do povo e têm frequentemente conotações culturais capazes de despertar o sentimento religioso dos fiéis. Porém, do ponto de vista da fé cristã, as ‘procissões votivas dos santos’ [levando processionalmente as relíquias ou uma estátua ou uma efégie dos santos pelas ruas da cidade], tal como outros exercícios de piedade, estão expostas a alguns riscos e perigos», tal como serem preteridas aos sacramentos, sobrepondo-as como manifestações exteriores e confundindo-as com um mero espectáculo ou num acto folclórico...
Não basta trazer para a rua as imagens e deixar correr, pois muitos dos que participam e, por maior razão daqueles que assistem, nem conhecem os santos ou santas em desfile!
Citando novamente o Directório é urgente reconhecer, aceitar e aprender, pois «para que a procissão conserve o seu carácter genuíno de manifestação de fé, é necessário que os fiéis sejam instruídos sobre a sua natureza, do ponto de vista teológico, litúrgico e antropológico».

= Saber ‘por que vêm’ ou perceber ‘como vão’?
Esta frase como que pode resumir, numa breve avaliação, sobre as razões que fazem tantas pessoas – mais ou menos conscientemente – irem à procissão. Neste ‘irem’ tanto pode estar a participação ativa como o simples ato de ficar a ver a procissão.
É digno de ser questionado quem compõe a procissão. De fato, muitas vezes os intervenientes pode ser do foro interno da Igreja, que a sair para a rua se faz exterior ou ainda da instância não estritamente religiosa. Aqui poderá começar-se um diálogo com os ‘gentios’. Com efeito, as (ditas) ‘forças vivas’ da terra podem e devem participar na procissão como expressão da vida humana, social, psicológica e espiritual de um povo... para além da expressão religiosa... católica.
Cremos que todos quantos representem associações de valor humano, desportivo, cultural, de setores sociais relevantes (reformados ou jovens)...deviam ser abordados para integrarem a procissão, como espaço de fé, consciente ou difusa, mais ou menos cristã.
Poderiam até vestir as suas roupas mais significativas e/ou seus estandartes…Bastará reparar nos ranchos etnográficos, folclóricos… que tinham as vestes de festa, normalmente para participarem na missa e nas procissões de festa.
Este diálogo é urgente ser feito para que não nos escapem para outras ‘procissões’ políticas, sindicais e/ou partidárias!

= Desafios ao diálogo Igreja/mundo
O diálogo feito ou a fazer tem de primar pelo respeito mútuo e aberto. Ninguém gostará de ser chamado para servir de enfeite a uma iniciativa – seja da Igreja católica ou outra – só por deferência mais ou menos tolerada. Por outro lado, a presença num ato público de uma procissão não poderá ser como se pretendesse ir ou estar, mas antes tendo dignidade para o ato e para a função daquilo que é representado…
Apresentamos, seguidamente, breves propostas para um diálogo Igreja/mundo:
- Diálogo sincero – cada parte não deverá usar de subterfúgios para vencer o outro, pois quem for vencido fica inferiorizado e a perder... podendo, com isso, ser impedida a prossecução do diálogo e da proximidade encetados.
- Diálogo construtivo – cada um dá o que tem, esperando receber do outro em abertura e em simplicidade. Com efeito, há ‘sementes do Reino’ em tanta gente e em muitas associações… de bem-fazer, de benemerência e com valores cristãos… mais ou menos difusos.
- Diálogo evangelizador – ir ter com os outros, estendendo-lhes a mão há-de ser para anunciar, no tempo oportuno e sem medos, a Pessoa de Jesus. Não interessa fazer proselitismo, mas antes abrir caminhos de verdade. Com pouco se pode fazer muito e com muito menos se pode estragar o pouco iniciado. Talvez aqui se possa incluir essa atitude de São Paulo: ‘fiz tudo para todos para conquistar alguns a todo o custo’.
- Diálogo cultural – da conjugação entre contexto social, referências à tradição e dimensão espiritual (particularmente imbuída dos valores cristãos) há-de poder surgir a possibilidade de cada um respeitar o outro, fazendo de cada momento de festa uma etapa de crescimento à luz da Palavra do Evangelho.

Será, no ‘átrio dos gentios’, que se poderá perceber um tanto melhor quem está disponível para aprender, respeitando e para crescer, aprendendo... uns com os outros.

António Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com)



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Resistências à mudança

Quem anda atento às mudanças sociais e culturais e não se esquece que a Igreja está ao serviço da sociedade e das pessoas tem consciência de que muitas coisas têm de mudar na acção pastoral. Nem sempre as mudanças são aquelas de que as pessoas falam, movidas por razões sopradas e pouco sabedoras do que na Igreja é essencial.

O concílio Vaticano II foi o acontecimento com maior força propulsora da mudança a operar-se na Igreja. Realizou-se para isso mesmo, segundo os objectivos anunciados por João XXIII, que queria não a continuação de uma Igreja clerical, mas o surgir de uma Igreja Povo de Deus, marcada pela Comunhão e pela Missão. Uma Igreja capaz de entender a sociedade e de dialogar com ela sobre o desígnio de Deus a operar-se na história humana. Uma autêntica mudança que toca em conceitos e critérios, em atitudes e projectos.

Não era fácil a conversão, sobretudo dos que, embrenhados nas estruturas e nos modelos tradicionais, teriam sempre grande dificuldade em se libertarem para poderem adquirir a liberdade interior sem a qual não são possíveis as verdadeiras mudanças. Quem viveu o antes do Concílio, e logo o seu depois, entende estas dificuldades porque as sentiu. Destes, os primeiros, dependia muito o rumo e o impulso conciliar. Foi-se, porém, pelo mais fácil e espectacular, passou-se, em muitos casos, ao lado dos grandes apelos à conversão, sossegou-se a consciência pensando que os outros é que tinham de mudar, deu-se lugar a superficialidades que não seriam inócuas, pôs-se patine em muitas coisas velhas. O ambiente era de cristandade e mera conservação, com sentença de morte anunciada a partir dele próprio, pensando-se, logicamente, que não sobreviveria. Acabou por ser ele mesmo marcar o ritmo da anti mudança. Com tudo isto, andou-se para trás e deram-se muitos passos em vão.

Bento XVI disse, recentemente, na Alemanha, que, na Igreja, “há mundo a mais e Espírito a menos”. E falou que, sem a conversão profunda do Papa, dos bispos e padres, dos religiosos e leigos, de toda a Igreja, não haverá mais lugar para o Espírito. Mundo a mais, quer dizer que os critérios profano e as preocupações temporais se sobrepõem à moção do Espírito, o Único que pode dar a vida.

O Concílio foi uma lufada de ar fresco para a Igreja, que tanto pode perdurar ainda, como ter sido esquecido uma mera recordação. Os textos conciliares deixaram de ser lidos, meditados, entendidos como rumo e caminho. Muita gente da Igreja voltou à velha rotina, a programar para conservar, sem se interrogar se por aí pode alguma vez passar o vento da renovação pastoral. Os esquemas pastorais, a utilização dos recursos humanos e materiais, a linguagem, mesmo com as novas técnicas, parecem permanecer ao serviço de um passado que nada diz às pessoas de hoje. A maioria destas teve acesso generalizado ao ensino, experimentou a democracia, tomou consciência do seu valor como pessoa, sente o direito e o dever de participar. Os tempos de cristandade sempre de sabor clerical. Por isso estão desadequados e fora do tempo. Teimar neles é produzir o vácuo religioso e eclesial, continuar a construir muros que dividem e valas intransponíveis. O problema não está em sentir a dificuldade das mudanças que se impõem, mas em teimar em não querer, nem procurar caminhos novos que permitam os rumos novos que urgem na Igreja.

Os decisores eclesiais, mesmo quando inovam, estão rodeados de caminhos de tropeços que não os deixam andar. Uns incómodos, outros acarinhados. Uns doem, outros agradam. Estes tropeços, tanto se chamam grupos corporativos, como costumes, bairrismos impensáveis, ânsia de honras e vaidades, que o Concílio execrou mas que continuam a prodigalizar-se. Não se entende, quando o grito evangelizador é insistente, que se perca tempo e se desgastem energias em banalidades e disputas que cheiram a mofo e sujam a imagem da Igreja.

As maiores recriminações de Cristo foram feitas aos conservadores interessados do seu tempo, que não queriam andar, nem deixavam que outros andassem. Parece que a história se repete, com prejuízo irreparável das pessoas e da sociedade. Ao repensar a acção da Igreja hoje, há que estar atento porque, em alguns casos, os falar-se de renovação e ao dar exemplo de coisas novas, o horizonte é muito curto, o que não admira pelo pouco que se estuda, lê e reflecte, se escuta, avalia e inova. Os que querem de verdade são sonhadores e utópicos. Os que parece que querem são agentes promovidos.

D. António Marcelino


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03/10/11

Riqueza da nossa gastronomia... em maré de crise

Há cerca de um mês, por votação eletrónica de todo o país, foram escolhidas as sete maravilhas da gastronomia portuguesa. O resultado foi o seguinte: alheira de Mirandela, queijo da Serra da Estrela, caldo verde, arroz de marisco, sardinha assada, leitão da Bairrada e pastel de Belém. Os votantes superaram mais de um milhão de pronunciamentos.

O processo de seleção, que teve início com cerca de setenta pré-selecionados, reduziu-se, na fase final, a vinte e um concorrentes, segundo as várias etapas de uma refeição à portuguesa... desde as entradas até à sobremesa, passando pela sopa e pelo prato de peixe ou de carne.

Serve esta nossa abordagem à gastronomia para tentarmos perceber a nossa riqueza, feita de coisas simples e populares... quando tantos se deixam ludibriar com ingredientes de supeita qualidade.

1.Coisas simples e saudáveis
Partindo da grande variedade de sugestões do nosso cardápio gastronómico, podemos dizer que as ‘sete maravilhas’ mais votadas são das mais simples e (até) das mais saudáveis: um pouco de engenho e alguma subtileza fez das ‘comidas’ vencedoras o regalo do povo... nos nossos dias e no tempo dos nossos pais e avós. Com feito, a possibilidade de ter umas sardinhas assadas eram uma vitória nos anos setenta e agora tem honras de serem bem pagas na ementa de muitos restaurantes. Um caldo verde, feito com as coisas mais rudimentares da horta serve de promoção a festas e romarias... dando a crer que, por ser simples, é bem melhor do que certas sopas da ‘nouvelle cuisine’.

Talvez estas ‘sete maravilhas da gastronomia’ tenham vindo acordar certos peritos – diz-se agora ‘experts’ – do fast food (tanto de mercado como dalguns restaurantes da moda) que nada tem de genuíno nem de português, criando uma nova vaga de sensibilidade ao que é nosso, deixando cair a máscara dessa mescla europeia de comidas de plástico, sem sabor, com pouca qualidade e fazendo bem pior à saúde.
A consagração de ‘maravilhas’ deu àqueles pratos nova projeção, numa espécie de exorcismo contra alguns novos-ricos que se iam envergonhando daquilo que é nosso, vendendo-se à internacionalização de certas modas, que mais não são do que uma certa globalização da mediocridade a começar à mesa...

2. Saber comer com qualidade e moderação
Atendendo ao mais recente desenvolvimento da obesidade em Portugal, vai crescendo a consciencialização de que temos de cuidar da nossa alimentação (dita) mediterrânica e que as ‘sete maravilhas da gastronomia’ como que a vieram colocar no devido lugar e na importância correta da nossa forma de comer. De fato, foi quando deixamos que entrassem certos ingredientes de duvidosa qualidade na confeção dos nossos alimentos, que crianças, adolescentes e jovens, começaram a ganhar peso, correndo riscos na saúde... atual e futuramente.

Não deixa de ser inquietante que continuemos a comer em quantidade – como se fossemos todos trabalhar no campo em esforço – sem o correspondente desgaste físico... E depois têm/temos de ir queimar calorias com exercício físico a pagar os serviços prestados!

Ora, nesta época de crise, como que podemos/devemos viver numa aprendizagem crescente da nossa condição neste mundo, que tem tanto de exagerado pelo excesso na comida como pela sua contenção. Com efeito, viver de forma equilibrada – físico/biológica e psicológico/espiritual – é tarefa que terá de evoluir... pela moderação e na temperança.

Efetiva e afetivamente é exigente viver de forma equilibrada... sabendo conhecer as nossas mais ou menos assumidas compensações (na comida, na bebida e noutros vetores mais subtis), sem desculpa, assumindo a verdade para connosco mesmos e para com os outros.

Verdade, a quanto obrigas!

António Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com)



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Ao Compasso do Tempo - Crónica de 29 de Setembro de 2011

Em tantos comentários oficiais (de sistemas de toda a ordem) tenho dificuldade em vislumbrar uma linha de cultura humanista ou humanizadora.
Nunca ouvi gratidão e saudade por Adérito Sedas Nunes, Abel Varzim, Joaquim Alves Correia, Manuel Rocha, Narciso Rodrigues, etc, etc, (com excepção dos domínios notáveis da Acção Católica e de organizações exemplarmente ligadas aos valores destes servidores da Humanidade).
Sou mais culpado que os silenciosos. Como cito de coração, muitos escaparam-me à memória.



Sinto-me espantado com a frieza e a oficialidade. Já tenho tempo de vida e de experiência suficiente para conhecer esses “estados de alma”. Quando responsáveis e empenhados (leigos/leigas/padres/religiosos/religiosas), desde há tantos e longos anos, batalharam ao serviço da justiça social, optando pelos meios mais pobres e ofendidos, sempre tiveram como resposta de “salão”, o menos interesse e entusiasmo evangélico.

Não nego uma multidão de casos particulares, onde residiram o fervor, a comunhão e a solidariedade com “os isolados” de posições. Pessoas e organismos (sobretudo, os da Acção Católica Operária) foram amados e venerados por contactos diocesanos, e por via disso, particulares. Com certeza que houve documentos hierárquicos a avaliar e a sublinhar a rectidão de comportamentos. Houve documentos oficiais a chamar à atenção a compromissos e empenhamentos laicais, os quais, sendo da Igreja, também, logicamente, eram de hierarquia.

Mas tomar posição, preto no branco, repetidas vezes, e nas horas de maior perplexidade, e até de calúnia persecutória (posições de movimentos católicos operários, no após 1974; Comissão Justiça e Paz; movimento “Pax Cbristi”, na altura de Guerra do Iraque; questões atinentes à “Metanóia” ou a movimentos de acções católicas referentes ao mundo estudantil secundário e universitário, etc, etc, etc.) tem sido muito raro.

Transpirou sempre a ideologia da conspiração.

Também os receios pelos que andavam sempre rápido e em frente. E, sobretudo, por aqueles que, em nome do “perfume” do poder, os acusavam. E dizer ao perfume que este era “água-de-colónia”, era oferecer os braços à crucifixão.

Porventura, estou a exagerar. Mas prefiro um passo em frente, do que o mesmo para trás.

Falta uma palavra de justiça, de candura familiar, de jovialidade fraterna, de sofrimento por quem não conta.

Patriotas no pagamento da dívida! Com certeza. E patriotas por aqueles de quem ninguém fala?

E há figuras de primeiro plano que nos aparecem na T.V. ou em outras expressões da comunicação social! Falem de quem fabricou “buracos”. E estendam as mãos a quem está a pagar as consequências!

MDN – Capelania-Mor, 29 de Setembro de 2011

D. Januário Torgal Mendes Ferreira
Bispo das Forças Armadas e das Forças de Segurança


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