Jornal de Opinião

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04/08/10

Quénia numa encruzilhada…

Este é o início da minha postagem.



O Quénia prepara-se para um momento importante na sua história: o referendo sobre a nova Constituição da República a realizar no próximo dia 4 de Agosto.
Há quem tema que o país volte à desordem e destruição que viveu depois das últimas eleições em Dezembro 2007. Seguiram-se 3 meses de violência étnica que provocou cerca de 1350 mortos e centenas de milhar de deslocados. Uma percentagem dos deslocados continuam ainda hoje, passados mais de 2 anos, a viver em tendas improvisadas, tendas essas que se tornaram em habitações permanentes devido ao esquecimento a que foram votados pelo governo do país.
É verdade que o país necessita de uma Constituição nova e mais democrática. É verdade que a mudança das leis eleitorais como são propostas neste documento poderão ajudar a evitar tais derramamentos de sangue no futuro.
Mas não deixa de ser também verdade que muitos valores humanitários e fundamentalmente cristãos estão muito comprometidos na redacção da Constituição proposta a referendo no próximo dia 4 de Agosto.
Antes de mais nada a questão fundamental da vida: a permissão do aborto dentro de parâmetros muito permissivos, ainda que a redação do artigo tenha sido engenhosamente preparado para fazer crer que o aborto não é permitido. São os buracos das leis que também neste país, os políticos já aprenderam a orquestrar.
Há depois uma questão muito sensível que é a inclusão na Constituição dos tribunais islâmicos como parte do sistema judicial do país. Esta inclusão é por si só privilegiar um determinado grupo de pessoas em detrimento dos demais cidadãos do país. Mais ainda, os magistrados dos ditos tribunais islâmicos são pagos pelos impostos de todos os cidadãos quenianos: muçulmanos, cristãos, hindus ou simplesmente ateus.
Isto ainda quando a mesma Constituição afirma que nenhum cidadão será beneficiado ou prejudicado em função do seu sexo, língua, modo de vestir, tribo, estado civil ou religião professada.
Há ainda outras razões de foro mais político que estão a dividir o país.
Uns querem fazer crer que a nova Constituição é “tábua de salvação” de um país inundado pela corrupção e pelos interesses particulares que ao longo dos anos teimam em prosseguir impunes.
Outros, como a grande maioria das Igrejas no país (não só os católicos, mas também os anglicanos e demais pentecostais), querem fazer ver aos cidadãos que questões de fé e valores humanos como o da vida não podem ser votados por maiorias nem sujeitos à vontade popular. Por isso dizem não a esta Constituição e pedem mais diálogo ao governo para tirar “as maças podres” de uma Constituição que deveria dar ao país um respiro mais democrático, mais justo e mais humano.
Veremos o que se irá passar no próximo dia 4 de Agosto. Porque o Quénia pode estar à beira de uma nova onda de violência ou, contrariamente, uma nova era de futuro risonho, peço-vos uma oração especial durante este mês por este povo que também é amado por Deus e que já sofreu o suficiente em anos muito recentes. Pedimos o dom da paz e da harmonia.
Vemo-nos em breve!

Pe. Filipe Resende
Kacheliba Catholic Parish – North Pökot - Quénia


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