Jornal de Opinião

São muitos os textos enviados para a Agência Ecclesia com pedido de publicação. De diferentes personalidades e contextos sociais e eclesiais, o seu conteúdo é exclusivamente da responsabilidade dos seus autores. São esses textos que aqui se publicam, sem que afectem critérios editoriais da Agência Ecclesia. Trata-se de um espaço de divulgação da opinião assinada e assumida, contribuindo para o debate de ideias, que a internet possibilita.

18/12/12

Desafios para aceitar e viver o Natal... deste ano!

A linguagem do Natal cristão é, por natureza, radicalidade e essência, de pobreza: Jesus nasceu num curral – daí a palavra ‘presépio’ – deitado numa manjedoura e tendo por companhia Maria e José, bem como alguns animais, certamente ovelhas e, possivelmente, a vaca e o burro (ou noutro registo o boi e o jumento)... Tentemos de forma simples e sincera colocar diante do presépio a inúmeras situações de pessoas que estão a passar dificuldades: os desempregados, os sem salário, os que têm a casa em risco por falta de pagamento da renda, aqueles a quem foi cortada a eletricidade e a água, os que não têm o essencial para dar de comer à família... os revoltados e os resignados, os que já desistiram e os que ainda lutam, os que acreditam em Deus e os que O rejeitam... os que estão bem na vida e os que esbanjam com futilidades, os que reivindicam e os que se azedam com os problemas, os que têm esperança e os que vivem em angústia... os que têm família e os abandonados, os que são marginalizados e os marginais, os que têm voz e os sós... as crianças e os velhos, os jovens e os adultos, os que compreendem a cultura do Natal e os que a rejeitam mas dela ususfruem consumisticamente... - Como poderemos viver, então, o espírito do Natal, se Deus não fizer parte dos critérios da nossa vida? - Como poderemos desejar ‘bom Natal’, se esquecermos O festejado? - Como poderemos gastam dinheiro em presentes – a maior parte das vezes são, antes, prendas! – se houver quem passe fome ao pé de nós? - Como poderemos tentar iludir a nossa (pretensa) generosidade, se dermos, sobretudo, o que nos sobra? - Como poderemos dizer que há Natal, se nos envergonharmos da raiz da sua celebração? - Como poderemos disfarçar a celebração da vida, se os valores que vivemos – que é muito mais do que defendermos! – são materialistas e se inserem numa cultura anti-vida? = A força do Natal está, por isso, na vivência da partilha, seja de bens materiais, seja de bens psicológicos e espirituais... dos mais simples aos mais elaborados e complexos. = A dimensão profunda do Natal exige-nos espírito de perdão e sinais de construção de concórdia e de paz... tanto na nossa casa, como nos locais de trabalho e até na vivência da fé, em Igreja. = A contínua novidade do Natal estará em sabermos reconhecer os nossos erros e em termos compreensão – que é muito mais do que simples tolerância! – para com os outros, tentando discernir as suas razões em vez de estarmos, constantemente, a acusá-los ou até a julgá-los. Aproveitando a graça do mais recente livro do Papa Bento XVI, Jesus de Nazaré: a infância de Jesus, deixamos uma citação, que poder-nos-á ajudar a situar a celebração correta e atualizada do Natal deste ano: «Aos pastores, o anjo tinha indicado como sinal que iriam encontrar um menino envolto em panos e deitado numa manjedoura. Este é um sinal de reconhecimento, ou seja, uma descrição daquilo que se poderá constatar com os olhos; não é um ‘sinal’ no sentido de que a glória de Deus se teria tornado evidente, de modo a que se pudesse dizer com clareza: este é o verdadeiro Senhor do mundo. Nada disso! Neste sentido, o sinal é ao mesmo tempo também um não-sinal: a pobreza de Deus é o seu verdadeiro sinal. Mas, para os pastores que viram refulgir o esplendor de Deus sobre as suas pastagens, esse sinal é suficiente. Eles veem a partir de dentro, veem isto: o que o anjo disse é verdade. Assim, os pastores regressam cheios de alegria e glorificam e louvam a Deus por aquilo que viram e ouviram (cf. Lc 2,20)» (pp. 69-70). Queira Deus em nós darmos, neste Natal, este espírito de contemplação na vida! António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)

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14/12/12

Eles (o burro e a vaca) representam a humanidade

1. O Natal é a festa do nascimento de Jesus? Sem dúvida. Mas, pelos vistos, não falta quem Lhe dispute as atenções. Há uns anos, era o Pai Natal que competia com Ele em protagonismo. Agora, parecem ser a vaca e o burro que com Ele rivalizam em popularidade. Acresce que na origem desta última contenda está uma figura de peso: o próprio Papa. Teria sido, de facto, Bento XVI a desaconselhar que se colocassem estes dois simpáticos animais no presépio. 2. Por exemplo, o site da RTP colocava em título: «Papa retira vaca e burro ao presépio». Do mesmo modo, o site da TVI referia que «afinal, vaca e burro não fazem parte do presépio». Quase todos os jornais alinharam por igual registo. E não foi só em Portugal. Veja-se o caso do Diário de Pernambuco, no Brasil: «Papa acaba com os animais do presépio». O mais curioso é que o Papa, num livro que escreveu sobre a infância de Jesus, afirma precisamente o contrário. Ou seja, não só não retira a vaca e o burro do presépio como diz, expressamente (p. 62), que «nenhuma representação do presépio prescindirá do boi e do jumento»! 3. Que se terá passado então? Só pode ter sido uma leitura apressada do texto, um olhar enviesado sobre o livro ou, então, uma tomada de posição a partir de comentários distorcidos sobre a obra. Nada, pois, como ir à fonte. Refira-se, desde já, que Bento XVI não inclui qualquer novidade. O que ele diz não tem dias, tem anos: dois mil anos! Na verdade, o Papa limita-se a anotar (p. 61) que, «no Evangelho, não se fala de animais». 4. Acontece que, como o mesmo Papa explica, «a meditação guiada pela fé, lendo o Antigo e o Novo Testamentos correlacionados, não tardou a preencher esta lacuna reportando-se a Isaías 1, 3: “O boi conhece o seu dono e o jumento o estábulo do seu senhor, mas Israel, Meu povo, nada entende» (p. 61). Estes dois animais aparecem como «representação da humanidade, por si mesma desprovida de compreensão, que, diante do Menino, diante da aparição humilde de Deus no estábulo, chega ao conhecimento e, na pobreza de tal nascimento, recebe a epifania que agora a todos ensina a ver» (p. 62). E o certo é que as representações mais antigas do Natal já incluíam a vaca e o burro! 5. Na parcimónia de elementos que nos traz, o Evangelho aponta que Maria deu à luz o Menino, «envolveu-O em panos e recostou-O numa manjedoura, por não haver lugar para eles na hospedaria»(Lc 2, 7). Como é sabido, a manjedoura é o lugar onde os animais comem. «Agora, porém, jaz na manjedoura Aquele que havia de apresentar-Se a Si mesmo como o verdadeiro pão descido do céu». Neste sentido, a manjedoura passou a ser vista «como uma espécie de altar» (p.61). 6. Sigamos, então, o conselho do Papa. Deixemos ficar no presépio a vaca e o burrinho. E, como eles, façamos companhia a Jesus já que, em Jesus, é o próprio Deus que vem fazer companhia a cada um de nós. 7. Feliz Natal! João António Pinheiro Teixeira teólogo

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Natal em Ano da Fé e de relativismo

São as diferenças que distinguem a identidade de alguém. Não há ciência nem conhecimento na confusão, sem distinguir diferenças. Centenas de mensagens sobre eventos e tomadas de posição não são mais que estratégias para confundir e anular os marcos que distinguem a identidade da fé e prática cristã e católica doutras religiões e Igrejas. As táticas de confundir os católicos são contínuas na internete, TV, rádio, jornais e nas conversas de café. Há “cérebros” apostados na lavagem dos cérebros dos católicos; mantem agendas anti-cristãs de separar o Natal da celebração do nascimento de Cristo; e de separar esta quadra do próprio nome de Natal. O palavra Natal deve desaparecer porque leva a pensar n’Aquele que lhe deu origem,e no seu Corpo, a Igreja. Natal seria termo a não dizer. Na internete, em várias línguas, os votos de Natal já são muitas vezes“votos de época” ou de “estação” (season, saison, stagione), não de Natal. Os secularistas, ateus ou não, pela mesma razão querem também abolir o antes e depois de Cristo (a.C. e p.C.) nas datas. Para eles o nome de Cristo é perigoso. Muitos católicos estão pouco atentos e inconscientes perante este tsumani anti-cristão que insidiosamente cria o vazio da fé, de decorações sem o Menino e festas sem Jesus, pondo no seu lugar alguma banalidade ou alguma religião mais açucarada da “Nova Idade”. A banir não são apenas os crucifixos dos locais onde sempre estiveram; os nomes, temas e eventos cristãos católicos são também a ofuscar e banir de tudo quanto é noticiário e mensagem; a não ser que sirvam para denegrir a Igreja e o Papa. A lei do relativismo confuso e difuso do tanto faz esta religião como qualquer outra ou nenhuma; tanto faz uma Igreja como outra, e tanto faz ser como só parecer católico, está a “fabricar” nova categoria de católicos sem fé cristã católica, sem fidelidade a Cristo, sem participação plena na vida da Igreja Católica e sem costumes cristãos. Os militantes laicistas e maçónicos promovem-na em encontros e grupos onde o aborto, o chamado “casamento” aberrante de gays, a hostilidade metódica contra Bento XVI, este ou aquele bispo católico e suas mensagens ocupam lugar central. Neles lançam a armadilha de levar os católicos a pensar que é vergonhoso defender a sua fé e vantajoso acobardarem-se perante a diatribes e disparates ouvidos. Usam as táticas de enaltecer de forma superlativa todos aqueles, mesmo católicos e padres, que têm na sua história alguma posição hostil à Igreja Católica: pro-aborto, pro-educação sexual abortiva, pro casamento gay, pro adultério e divórcio, etc. Os que têm a coragem de dizer “eu por aí não vou” são silenciados e envergonhados. Onde estão os leigos católicos corajosos e esclarecidos para desmontar esta pseudociência manipuladora? Será que a defesa da fé cristã e do Evangelho envergonha? Será que vamos deixar que a Europa fique mais favorável às crenças, rituais e leis muçulmanas que às católicas? Mais favorável ao Budismo que à fé da Igreja católica? Não basta dizer fé cristã se queremos ser claros na identidade do que falamos. Não faltam “cristãos” desta ou daquela igreja que já não aceitam Jesus Cristo, como Filho de Deus; não aceitam que tenha alguma coisa a ver com a maneira como os cristãos devem ou não devem viver. Para alguns as palavras de Jesus contam menos do que as de qualquer letrado ou falador da esquina. Alguns votaram ao esquecimento a prática cristã, aceitam tudo na indistinção e confusão da sua fé. Aceitam o relativismo da confusão que nivela o razoável e o irracional, o que tem valor moral e o que o não tem. A tudo chamam religião. Afinal a religião e as religiões não estão a acabar, como os “iluminados” ateus apregoam há mais de dois séculos, com desejo e sem convicção a morte da Igreja Católica. Afinal a ciência das religiões já reconhece que as religiões estão a regressar em força mas mais quase só as velhas religiões animistas, agora com o nome do New Age sincretista. Dizem-se unidos às “almas”, “intenções” e poderes demiurgos, bons ou maléficos, às árvores, aos rios, aos animais, ao caos, aos astros, à terra e ao mar. E propõem rituais para adorar estes deuses, adorando-se a si mesmos a eles unidos. Para os “novos religiosos” todos os seres vivos e mortos são deuses aceitáveis e dignos de culto. Assim, o relativismo paradoxal propõe que se abrace qualquer religião desde que ela afaste os católicos da participação plena na Igreja. Em tempo de Natal o Ano da Fé convida a refletir e a libertar-se das armadilhas deste relativismo insidioso. Funchal, Natal 2012 Aires Gameiro

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10/12/12

A esperança (ainda) não desistiu de nós

1. Na sua infatigável peregrinação pelo mundo, a esperança ainda não desistiu de chegar a todos os lugares nem de visitar todos os corações. Todos passamos pela esperança e a esperança passa por todos. Mas quem repara nela? Quem lhe dá acolhimento? Afinal, onde vive a esperança hoje? Todos a querem. No fundo, quem não quer ter esperança? Mas facilmente a trocamos pelo abatimento, pelo torpor, pela apatia, pela desesperança. 2. A esperança seduz, cativa, encanta, motiva, mas não encontra quem lhe dê guarida por muito tempo. E o mais espantoso é notar que é quando ela se torna mais necessária que ela mais se afasta. Ou é afastada. 3. Nesta altura, todos parecemos órfãos de esperança. Sentimos que ela se ausentou de nós ou que nós nos ausentamos dela. E o mais preocupante é que a sua perda parece gerar perdas em cascata. Ao perder a esperança, perdemos a capacidade de intervir, a vontade de mudar, a determinação em resistir. Ao perder a esperança, verificamos que começamos até a perder a fé. 4. É assim que este Ano da Fé tem de ser também um Ano da Esperança. Quando não se espera não se acredita. Quando não se acredita não se espera. A fé alimenta a esperança e a esperança ilumina a fé. A fé faz aterrar a esperança e a esperança faz voar a fé. A esta luz, percebe-se que, juntamente com a Caridade, a Fé e a Esperança constituam um todo a que denominamos virtudes teologais. 5. O Advento evoca a longa espera e a prolongada esperança na chegada de Deus ao mundo. Como se pode ver na Bíblia, a esperança não nos isenta da dor. A esperança é precisamente o que leva a não desistir na dor nem a soçobrar perante o aperto da dor. 6. Há momentos em que só parece ficar a esperança. Nessas alturas, há quem a veja como um expediente. Há quem aponte a esperança como a atitude dos passivos, daqueles que não agem, que se resignam. 7. A esperança não é, porém, um analgésico ou um mero tranquilizante. A esperança é um despertador, um alerta. A esperança, habitualmente, não está em sintonia com a evidência. Há muitas evidências que são desmentidas pela esperança. 8. É certo que a realidade tem muita força. Mas a esperança é o que nos leva a não abdicar de a transformar. A esperança não é, por isso, própria dos pusilânimes. A esperança é a âncora dos sonhadores, dos lutadores, dos persistentes. 9. Há quem pretenda agir apenas quando tem garantias de êxito. O cálculo, para muitos, degolou a esperança. Outros, no pólo oposto, substituem-na pela mera ilusão. Sucede que a esperança não é calculismo e é muito mais do que ilusão. A esperança é aventura, é exposição ao perigo. A esperança não nos inibe da possibilidade de naufrágio. Mas nem essa possibilidade nos há-de obstruir. Só chega ao alto quem se dispõe ao risco da queda. 10. A esperança está, pois, em condições de tingir de azul estas noites de breu. A esperança costuma acenar-nos com maior intensidade nas horas de provação. É ela que nos faz ver que, como dizia Sto. Agostinho, «é quando parece que tudo acaba que tudo verdadeiramente começa». É por isso que — alertava Vergílio Ferreira — «quando a situação é mais dura, a esperança tem de ser mais forte». Daí que o Ano da Fé seja uma oportunidade para reaquecer a esperança. Que, tantas vezes, deixamos arrefecer! João António Pinheiro Teixeira teólogo

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Sinais de fé popular ou a fé como sinal de vida?

«Sucede não poucas vezes que os cristãos sintam maior preocupação com as consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé, considerando esta como um pressuposto óbvio da sua vida diária. Ora um tal pressuposto não só deixou de existir, mas frequentemente acaba até negado. Enquanto, no passado, era possível reconhecer um tecido cultural unitário, amplamente compartilhado no seu apelo aos conteúdos da fé e aos valores por ela inspirados, hoje parece que já não é assim em grandes sectores da sociedade devido a uma profunda crise de fé que atingiu muitas pessoas». Este excerto da ‘Porta da fé’ n.º 2 do Papa Bento XVI como que nos pode servir de temática de reflexão, em tempo de Advento, numa perspetiva de caminhada runo à celebração do Natal. Com efeito, nalgumas situações de matiz popular – dentro ou fora do espaço da Igreja católica – como que parece que estamos mais interessados em atender às ‘consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé’. De fato, certos tiques de tradição parecem mais atender às questões sociais e culturais da manifestação duma certa fé do que à verdadeira fé. Efetivamente, corremos o risco de usar ingredientes mais ou menos ousados e/ou consensuais, mas distraímo-nos do verdadeiro celebrado no e pelo Natal, que é Jesus Cristo, o Verbo encarnado e redentor. = Num tecido social de cristandade profana Embora esta expressão ‘cristandade profana’ seja de meados do século passado – de Jacques Maritain, em 1950 – ela está – mais do que nunca no ativo do nosso comportamento pessoal, familiar, social, cultural religioso (atendendo às implicações católicas em particular) – com incidência em inúmeros campos da nossa atividade humana. Continuamos, efetivamente, a usufruir de regalias de índole religiosa, mas como que abjuramos – inconscientemente – as causas, embora saboreando as consequências, como por exemplo no caso dos feriados de âmbito religioso e ainda as festas de teor cristão e até as implicações de sabor popular sem as raízes que lhes deram origem nem as sustentam, como são, por vezes, as festas regionais e os festejos na maior parte dos concelhos... onde a coberto do/a santo/a se faz o que apetece mesmo que não se respeitem os promotores das mesmas... Vivemos numa espécie de cultura envernizada por tonalidades de religiosidade profana, mas cujo cerne está corroído pela traça do consumismo e onde o verme da imagem que se quer dar suga a possibilidade de questionar as razões daquilo que se faz e quanto menos ainda se interroga sobre a incoerência e o oportunismo... social, político ou intencional. = Como testemunhar a fé cristã neste Natal? Mesmo que, por entre lamúrias e impropérios, contra tudo e para com todos – sobretudo invetivando o falido Estado providência – por certo não deixaremos de idealizar a vivência nostálgica do Natal – da família, da tradição, das comidas e das bebidas, do já vivido e do ainda ansiado – onde muitos dos mitos e ritos pessoais e familiares, culturais e sociais, religiosos e quasi-pagãos como que se soltam das amarras do nosso «eu coletivo» e reclamam espaço e tempo, senão na vida pelo menos na memória... Nas recordações de infância tem um largo campo de saudade o presépio de onde emerge como que em reminiscência uma cultura que se pretendia cristã, senão no total conteúdo, pelo menos numa certa forma mais ou menos diluída de ver e talvez de querer viver... Agora que estamos em contenção de gastos – uns assumidos, outros tolerados e outros ainda indesejados – pode ser a oportunidade de vivermos a comunhão com a radicalidade de Jesus nascido no curral de Belém por não haver lugar para Ele na hospedaria. Agora podemos dar espaço e tempo à escuta e à partilha. Agora podemos e devemos tentar esvaziar-nos de tantas inutilidades (ditas) necessárias com que nos entretemos. Agora podemos, devemos e necessitamos de viver a pobreza do Evangelho no discernimento do nosso dia a dia. Queira Deus que o vivamos e o testemunhemos com humildade e verdade, já! António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)

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Será que a França vai perder turistas?

Ainda há dias ouvi dizer que Portugal e a Madeira não podem apertar as leis que permitam reduzir o consumo destrutivo de bebidas alcoólicas e os deus danos porque iam perder turistas. Agora a França surge com um aumento considerável do preço das bebidas alcoólicas e continuará a ser um dos países com mais turismo. Aumentou os impostos sobre a cerveja em 160% em favor da saúde pública. No seu orçamento para 2013 não hesitou, entre outras medidas, a aumentar os impostos em 160% à cerveja, (5cts em 330 ml); e a aplicar uma taxa especial de 50 euros por hectolitro às bebidas enérgicas, as que têm pelo menos 0,22g de cafeína e 0,3 de taurina por litro, para que os jovens reduzam as misturas destas bebidas com álcool e não se tornem explosivos com elas. Mas também aumentou em 30% os impostos sobre o tabaco de pacote e 60% do tabaco de enrolar. A crise e a saúde obrigam. Não é novidade para os especialistas que a medida de aumentar as taxas reduz os danos do álcool, como ficou claro no Forum Económico da OMS (2011). Outros estudos evidenciam que são indicadores do aumento de consumo o número de mortes rodoviários e de ferimentos graves e as cirroses do fígado. EUROCARE (European Alcohol Policy Alliance) pela sua secretária geral, Mariann Skar, congratula-se com o governo francês por ser líder nesta área. Em tempo de crise aumentar as taxas sobre o álcool é duplo ganho, para equilibrar o orçamento e para reduzir os danos do álcool. Esperemos que outros governos europeus, incluindo Portugal, sigam o exemplo da França. Ao aumentar os orçamentos com novos impostos sobre o Álcool reduz-se o fácil acesso ao álcool que não tem cessado de aumentar nos últimos 12 anos, e reduzem-se os seus danos. Aires Gameiro Com dados de Presse Release de EUROCARE (7.012.2012)

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05/12/12

Não há fé só na fé,só há fé no amor

1. Ainda nos seus começos, o Ano da Fé presenteia-nos, desde já, com duas certezas. A primeira é que a Fé não há-de ser apenas para este ano. E a segunda é que este ano não pode ser apenas de fé. 2. A fé é para toda a vida e não somente para um ano na vida. E este ano, para revitalizar a fé, tem de nos ajudar a perceber que a fé nunca pode ficar só pela fé. A fé nunca é fé só na fé. A fé só é fé pelo amor. A fé será sempre fé no amor. 3. A fé não nos remete unicamente para a existência de Deus. A fé remete-nos sobretudo para o ser de Deus. E o ser de Deus é amor. Só amor. Nada mais que amor. Para falar de Deus, Sto. Agostinho nunca saiu deste registo. Para ele (e para muitos com ele), o Pai é o amante, o Filho é o amado e o Espírito Santo é o amor. 4. Crer em Deus é muito mais do que acreditar que Deus existe. Crer em Deus é acreditar que Deus ama, que Deus existe porque ama, que Deus existe para amar. Crer em Deus é acreditar que Deus é amor (cf. 1Jo 4, 8.16). No fundo, crer em Deus é crer no amor. Consequentemente, crer é amar e amar é crer. Quem não crê raramente ama e quem não ama dificilmente crê. Entende-se, assim, que a profissão de fé do povo eleito não seja introduzida pelo verbo crer, mas pelo verbo amar. «Amarás o Senhor, Teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças» (Deut 6, 4-9). 5. A fé reclama a totalidade do ser. Exige a razão, mas requer muito mais que a razão. Nem sempre a razão tem amor. Mas o amor acaba sempre por ter razão. O amor consegue ver mais do que a razão. Pertinente foi Óscar Wilde quando escreveu que «o amor é mais sábio que a sabedoria». 6. S. Paulo reconhece — e proclama — que o lugar da fé é o amor (cf. Gál 5, 6). É por isso que, como lembrava Hans Urs von Balthasar, «só o amor é digno de fé». É o amor que torna credível a fé. 7. Enzo Bianchi avisa: «O crente não deveria levantar apenas o problema dos motivos do seu crer, mas também o problema dos seus frutos». E o maior fruto da fé é o amor. Daí que este Ano da Fé tenha de ser também (e intensamente) o Ano do Amor. Como refere Pedro Laín Entralgo, a fé desagua necessariamente no amor: num amor constante e num amor instante. É o amor que nos faz ver que cada homem está rodeado de «outros como ele» e não apenas de «outros para além dele». 8. Passa por aqui o maior legado daquele que Bartomeu Benassar denominou «o Deus humaníssimo de Jesus». E o certo é que o amor fez mais pela difusão do Evangelho do que os maiores tratados de Teologia. Tertuliano, um dos escritores cristãos mais antigos, notava que os outros, olhando para os cristãos, diziam: «Vede como eles se amam»! Ou seja, vede como eles vivem o que crêem. 9. O amor é o ápice da fé. É pelo amor entre as pessoas que se autentica o amor a Deus. Como recorda Karl Rahner, «o amor para com o próximo é o modo concreto de pormos em prática o amor para com Deus». 10. No seu recente livro O triunfo do Cristianismo, o sociólogo da religião Rodney Stark pergunta: «Como foi possível que uma obscura seita judia se tenha tornado na maior religião do mundo?» E a resposta é inequívoca. O sucesso do Cristianismo deveu-se sobretudo à vivência do amor. Daí que Juliano, ao abandonar a Igreja, tenha declarado que da religião cristã só queria conservar uma coisa: o amor! E deste modo não estaria, afinal, a manter a fé? João António Pinheiro Teixeira teólogo

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03/12/12

Boi e jumento... no presépio?

«Na singular conexão entre Isaías 1,3; Habacuc 3,2; Êxodo 25,18-20 e a manjedoura, aparecem os dois animais como representação da humanidade, por si mesma desprovida de compreensão, que, diante do Menino, diante da aparição humilde de Deus no estábulo, chega ao conhecimento e, na pobreza de tal nascimento, recebe a epifania que agora a todos ensina a ver. Bem depressa a iconografia cristã individuou este motivo. Nenhuma representação do presépio prescindirá do boi e do jumento» – Joseph Ratzinger/Bento XVI, Jesus de Nazaré: a infância de Jesus, Cascais, Principia, p.62. Foi com alguma perplexidade e razoável estupefação que ouvi e, posteriorrmente, li a reação a estas palavras do último livro do Papa. Nota-se pelas declarações que a maioria não leu o que Bento XVI escreveu, limitando-se a reproduzir frases feitas, servindo-se de preconceitos mais ou menos ideológicos – senão na forma pelo menos no conteúdo – de quem está contra... mesmo que não saiba qual a razão! Desde logo surgiram-me questões simples que parecem ter mais a ver com uma certa religiosidade cristã: será que a presença da ‘vaca e do burro’ são tão essenciais para a crença de certas pessoas? Tirar estes adereços mexe assim tanto com a valorização do presépio? Onde terão lido estes defensores da ‘vaca e do burro’ a sua presença nos textos bíblicos? Como podem fazê-los tão imprescindíveis se eles nem estão presentes na narrativa canónica? A quem interessa este ruído sobre questões de lana caprina? Reparemos no texto do Papa citado e reportemo-nos também à narrativa lucana (Lc 2, 1-20) onde poderão incluir-se os ditos ‘boi e jumento’, traduzindo ainda por ‘vaca e burro’. ‘Presépio’ significa: curral, estábulo... daí podermos incluir alguns animais nesse contexto. Qual a razão de vermos o boi ou a vaca nesse estábulo? Talvez seja mais uma projeção do tempo em que surgiu o difusão do presépio na cultura ocidental europeia com São Francisco de Assis, na Idade Média, ou ainda com a ruralidade em que se quis colocar ou se pode ver o contexto do nascimento de Jesus entre animais... possivelmente mais ovelhas do que outro gado. Talvez o burro/jumento tenha sido o meio de locomoção de José e de Maria entre Nazaré e Belém, a cidade onde se foram recensear. Com efeito, as distâncias eram grandes e os recursos materiais e humanos não seriam mais do que esses de terem um burro para poderem viajar. Daí colocá-lo no contexto do presépio poderá ser tão natural quão difícil de harmonizar animais de diferente estirpe e razoável teimosia... Só quem não os conhece é que se admirará desta alusão à proximidade simples de antagónicos! Não deixa ainda de ser significativo que o Papa diga no texto supra citado que aqueles animais – o boi e o jumento ou a vaca e o burro – são ‘representação da humanidade’. Será, então, que a nossa – humana, racional, psicológica e espiritual – simbologia está caraterizada por aqueles dois espécimes? Ou será que, recorrendo aos textos referidos na citação, se pretende fazer uma conjugação dos diferentes humanos, pois se até os animais se entendem e se relacionam em harmonia junto do Deus-Menino, quem somos nós, afinal, para não nós entendermos? Bastará parar um pouco diante do presépio para vermos como são fúteis as nossas jactâncias de orgulho: ali está um Deus que Se humilhou e que teve por companhia animais amansados pela pobreza dum Menino que Se fez próximo desde dentro da nossa condição humana e em projeção humanizada. Bastará perceber a força de despojamento de um Deus que nasce e é acolhido entre animais porque não havia lugar para Ele na estalagem das ocupações humanas... tais eram (e são) as pretensões de sermos importantes à custa dos direitos dos outros. O boi/vaca e o jumento/burro continuarão a ter espaço e oportunidade nos nossos presépios, enquanto andarmos atarefados com inutilidades que nos fazem perder o sentido da vida e a qualidade da existência? Que o burro e que a vaca exalem um hálito de ternura sobre este mundo, que rejeita Deus e esquece Jesus! António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)

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A Imaculada Conceição e o Dia Mundial dos Santuários Marianos

Quando os portugueses começaram a lançar as caravelas e as naus pelos mares das descobertas e da conquista de novas terras transportavam marcos ou padrões com o escudo de Portugal, a cruz e a data para os implantar nas terras descobertas. O sentido era claro. Isto aqui é do rei de Portugal porque o descobriu e conquistou. João de Barros é muito claro sobre isto nas sua Décadas da India. Ao seguir-se com atenção a história do Cristianismo encontramos evidências de que Nossa Senhora desde os primeiros séculos também marcou os seus territórios e aceitou que os seus devotos o fizessem com sentido análogo e ainda mais real. Portugal perdeu muitas dessas conquistas ou só delas conserva posse simbólica (lusofonia). Nossa Senhora com o seu Filho Jesus têm marcas de propriedade e conquista em todo o mundo e ninguém lhes arrebatará o seu domínio: são milhares de santuários. Dezenas de países têm estas balizas no terreno e documentadas em livros. Por ocasião da solenidade da Imaculada Conceição seja-me permitida uma sugestão. Um Dia Mundial dos Santuários Marianos deveria ser celebrado para assinalar esta conquista. Quando vivi em Fátima cheguei a sugerir por tele-carta esse dia ao Padre Cristino do departamento de documentação do Santuário. Estou firmemente convencido, como exprimi nessa altura, que uma luz de amor irradiaria por todo o mundo nesse quando milhares de Santuários Marianos celebrassem A Mulher vestida de sol, grávida do seu Menino Jesus. E até outros santuários não marianos iriam querer aderir. Continuo convencido que não seria difícil escolher um dos dias mais solenes para o Coração Imaculado de Maria, por exemplo, a Assunção de Nossa Senhora, a Imaculada Conceição ou outro adequado para este Dia Mundial. Seria maravilhoso: milhões e milhões de peregrinos em mais de uma centena de países e em milhares dos santuários nacionais da Virgem Maria, a Imaculada Conceição, a proclamar as palavras de fé de Maria, e outras da Bíblia, sobre Ela: «eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra»; «fazei tudo o que Ele vos disser», «daqui em diante todas as gerações me chamarão bem aventurada». Ou então: «Ave Maria cheia de Graça, o Senhor está contigo», «bendita és tu porque acreditastes no que te foi dito da parte do Senhor», «mais felizes são os que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática», «Mulher, eis aí o teu filho». Nesse dia seriam muitos milhões de fiéis a repetir essas e outra palavras de fé, a rezar o Rosário, a adorar e consagrar-se a Jesus na Eucaristia; a confiar-se ao Coração Imaculado de Maria, com as suas famílias, instituições e seus países, em atos de confirmação da sua vassalagem à Rainha da Humanidade. Maria, a Mulher vestida de sol e coroada de doze estrelas, com o seu Filho vence todas as forças do mal, mesmo a Serpente do Génesis, o Dragão e as Bestas do Apocalipse. E também as de hoje: do mal do relativismo, laicismo, destruição da família, promoção do aborto e do mercado de vidas humanas. Este Ano da Fé ao vigorar a fé pode alimentar a esperança de se vir a celebrar esse dia. Não é sonho. Com a oração de muitos é possível. O Dia Mundial dos Santuários Marianos pode tornar-se uma realidade. Funchal, Novena da Imaculada Conceição, 2 de Dezembro de 2012 Aires Gameiro

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