Jornal de Opinião

São muitos os textos enviados para a Agência Ecclesia com pedido de publicação. De diferentes personalidades e contextos sociais e eclesiais, o seu conteúdo é exclusivamente da responsabilidade dos seus autores. São esses textos que aqui se publicam, sem que afectem critérios editoriais da Agência Ecclesia. Trata-se de um espaço de divulgação da opinião assinada e assumida, contribuindo para o debate de ideias, que a internet possibilita.

06/08/09

Ao Compasso do Tempo – Crónica de 07 de Agosto de 2009

Leitura semanal dos problemas do Mundo e da Igreja
Tinha-me despedido em 1 de Agosto por motivo do repouso tão necessário para cada um e para todos. Tem o nome de férias…
Mas, quando várias personalidades me fazem chegar a inquietação por um caso de pedofilia no Colégio Militar, não desejava eu que a Igreja Católica, pela minha responsabilidade, envergasse o uniforme do silêncio…
Tomei conhecimento do facto pelo “Correio da Manhã” e, em 31 de Julho, senti os protestos da Senhora Dr.ª Catalina Pestana, que muito estimo, quando não se pode rever na mudez das “Igrejas”, conforme hoje escreve no semanário “Sol”.
Da parte da Igreja Católica, presente no sector militar e policial, prometo não alienar o peso da seriedade e da verdade.
Pedi a quem de direito me informasse e me ajudasse a entender o barulho e o silêncio(s). Da minha parte, nunca os réus serão as vítimas. As vítimas nunca serão os Réus!
Obrigado a quem me alertou, testemunhando a maior confiança na Cadeia do Comando militar, que nunca permitirá que “o que deve ser”, “deixe de o ser”, pelas conveniências do medo e do interesse.

Lisboa, 07 de Agosto de 2009

D. Januário Torgal Mendes Ferreira
Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança
http://castrense.ecclesia.pt

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Viver na ignorância ou saber aprender... humildemente?

Era grande a multidão, na expectativa de ver os andores – feéricos, deslumbrantes e belamente enfeitados – quando escutei – o que é muito mais do que ouvir! – a seguinte observação de alguém num quase desabafo:
- Quem pensa que sabe tudo é o pior ignorante!
Ao que o interlocutor respondeu:
- Temos sempre qualquer coisa a aprender... uns com os outros!...
Partindo deste breve e incisivo diálogo poderemos (como que) tentar desmontar muitas ‘sabedorias’, que não passam de disfarces de ignorância mal encoberta, tanto pela inépcia dos argumentos, quanto pela arrogância dos condimentos. Com efeito, todos permanentemente somos confrontados com pessoas que sabem muito dentro da sua especialidade e para tal campo conduzem a conversar por forma a poderem brilhar...à custa da ignorância alheia. Mesmo que de forma enviesada tentamos – e, por vezes, conseguimos durante bastante tempo – enganar quem nos pode conhecer melhor:
* Veja-se certas discussões sobre o futebol – com as arreigadas visões clubísticas a fazerem estrago até na amizade e no convívio – onde cada qual (se) defende atacando os adversários... conjugando uma das tácticas mais básicas do futebolês: a melhor defesa é o ataque!
* Certamente temos convivido com pessoas a quem ainda não dissemos metade da palavra ou da frase e já nos tentam calar com a expressão: ‘eu sei’, deixando logo sem motivação para continuar a conversa, pois quem tudo sabe pouco terá a aprender. Só que esta mesma atitude temo-la também nós para com os outros e, assim, podemos fazer de tantos momentos de partilha uma espécie de batalha monocórdica e sem aprendizagem mútua.
* Também é-nos muito útil reflectir sobre a capacidade de saber corrigir (activamente) sem ofender, pois, se desejamos que tenham essa atitude para connosco, deveremos exercer idêntica posição para com os outros. De facto, a correcção – mútua, fraterna e construtiva – nunca poderá amesquinhar os outros. Na medida em que nos ajudamos a crescer na maturidade, melhor saberemos ajudar-nos a olhar o positivo uns dos outros. Quantas vezes os defeitos que apontamos tão acintosamente aos outros são o reflexo dos nossos próprios defeitos! Quantas vezes acusámos antes que nos acusem! Quantas vezes nos disfarçámos de juízes alheios quando não passamos de réus não assumidos!
Considerando que temos sempre muito a aprender, ousamos propor:
- Cada manhã vá ao espelho e veja-se como é e não como gostaria de ser;
- Em cada pessoa que encontrar tente ver o positivo e não segundo preconceitos;
- Naqueles/as que acha (já) conhecer realce as qualidades e não empole os (possíveis ou reais) defeitos;
- Tente aprender um pouco cada dia sem tentar ensinar nada por imposição;
- Ajude a melhorar este mundo em vez de dizer (preferencialmente) mal de tudo e de todos;
- Mesmo nas horas de maior agrura veja algo de benéfico naquilo que lhe acontece;
- Se for preciso mude de lentes dos óculos... para ver a presença de Deus à sua volta.
Se for o caso, aproveite as férias para acrescentar esta lista de aprendizagens... com a sua experiência humilde e verdadeira.

A. Sílvio Couto

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Mais bébés e mais avós

Passo os meus quinze dias de férias, desde há alguns anos, num ponto de encontro de portugueses e de estrangeiros, estes, sobretudo, casais novos. Durante muito tempo, era a desolação. Praticamente não se viam bebés, nem crianças até aos cinco anos. O panorama foi-se transformando, a pouco e pouco.
Desde há meia dúzia de anos começou a notar-se uma mudança. Hoje é impressionante o número de casais europeus, sobretudo da Alemanha e Reino Unido, que vemos com os seus carrinhos de bebés. E já se encontram casais com dois e três filhos, espelhando-se no rosto dos pais, a alegria de os ter.
Há dias ouvi e li nos meios de comunicação social alguém do partido no poder a anunciar e valorizar do ponto de vista social o donativo do Estado, destinado a abrir conta a cada criança que nasce. Lá foi dizendo como isto constituía um incentivo para os pais e, também, uma garantia de a criança não vir a abandonar a escola. Fiquei à espera de mais alguma razão de esperança que, por fim, apareceu um pouco a medo, dizendo que também esta medida podia favorecer o aumento da natalidade.
A verdadeira pobreza nacional reside na baixa natalidade, favorecida de mil maneiras. Em Portugal de há muito que não está coberta a normal substituição de gerações. A pirâmide inverteu-se Há gente responsável que está convencida desta preocupante realidade e das suas causas, pessoais e sociais. Mas há gente acasalada que, de modo frenético, luta pelo direito, assim diz, de adoptar filhos que outros geraram. Uma criança não é um brinquedo, e adoptar não e um gesto de compaixão. A adopção é um caminho responsável e sério por onde, normalmente, não passam os que dão mais atenção a si e aos seus projectos individuais do que aos outros, por força de um amor verdadeiro.
Favorecer a natalidade não se compadece com uns euros depositados em conta de recém-nascido. Exige mudança profunda do clima humano e social que se traduz em favorecer a cultura da vida, ao arrepio da cultura da morte que, neste aspecto, os países da Europa, e também o nosso, estimulam e pagam. Por lá já se vê que estão acordar, por cá ainda se dorme a sono solto.
Evoca-se Fernando Pessoa, mas esquece-se o seu preciso testemunho, que não é senão fruto da sabedoria e do bom senso: “O melhor do mundo são as crianças”.
Outra observação de férias foi dar-me conta dos muitos avós em serviço. Chegam à praia mais cedo, com os netos e os seus brinquedos. Carregados de amor e paciência. Dispostos a ajudar sem contrariar muito, o que não é coisa fácil com crianças que se vão habituando a mandar muito e a obedecer pouco. E também chegam antes, com os netos pequenos, aos restaurantes, outra tarefa difícil que leva muitos avós homens a fazer aqui e na praia, com os netos, o que não fizeram com os filhos.
Mais bébés e mais avós activos e prestáveis são motivo de alegria e de esperança, um gesto que pode ser enriquecido com casais mais estáveis, consistentes e preparados para enfrentar os desafios do amor de sempre e da vida do dia a dia.
Se os partidos políticos, agora que cozinham e apresentam programas para ganhar votos e eleições, olharem a sério para as pessoas e para o essencial das suas vidas, para as defender a promover, estão a esperança não será vã.
Para tudo isto há que ter força para denunciar e não alinhar, como carneiros de olhos no chão, em muitas das opções e das ordens dadas por uma Europa anémica, onde o desvirtuamento dos valores fundamentais vai sendo regra. e as pessoas concretas pesam cada vez manos, não obstante o aparato mediático que nos quer convencer do contrário.
Ser europeu, cidadão da Europa, pode ser uma mais valia, mas não ser nunca pelo apagar de nós mesmos e dos valores em que se enraíza a nossa identidade. O barco europeu leva ao leme rostos escondidos. Por algo se escondem. Há que destapá-los.
António Marcelino

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O necessário rosto da verdade

Diz-se que são demasiadamente clericais os meios de comunicação social da Igreja. Logo se diz, também, que é esse, ainda hoje, o seu rosto mais visível e, por isso, não é de estranhar que assim seja e assim apareça. Não falta quem teime, dentro e fora, em continuar a identificar Igreja com bispos e padres, por preconceito, por falta de formação e de informação, por restos históricos que tardam em se apagar.
Na Igreja, continua a ser difícil e lenta a passagem de uma classe restrita, mas dominante, o clero, a um povo diversificado, alargado e plural, a comunidade dos crentes. A Igreja de Cristo é Povo, é comunidade. Não é grupo, nem elite, nem classe.
Pode acontecer, e em diversos casos acontece mesmo, que o tom clerical dos jornais, e não só, seja, por vezes, ainda o tom que prevalece. A verdade, porém, é que o trabalho que se vem fazendo, por todo o lado, com os leigos e para lhes dar consciência da sua dignidade e missão, é significativo. O seu protagonismo, em muitas comunidades paroquiais, tem crescido sempre mais. Por caminhos não reivindicativos, mas de fé.
O Ano Paulino, iluminado pela Palavra de Deus e conduzido pela vida de Paulo e das suas comunidades, com suas fraquezas e méritos, foi uma lufada de ar fresco na Igreja. Muitos leigos acordaram para novos rumos, ao longo deste Ano. Pelo caminho da Palavra se vai à fonte que não deixa que a Igreja se clericalize. Um caminho que ajuda todos os membros da Igreja, leigos, clérigos e consagrados, a sentir a alegria e a graça de serem, acima de tudo, Povo de Deus, “nação santa e povo resgatado”, com uma missão comum no mundo.
Resta muito para fazer, é certo, e, desta realidade, todos devem estar conscientes.
Mais difícil é o caminho, quando se trata de capacitar os leigos para o compromisso nas estruturas sociais - familiares, profissionais e políticas, onde muitos ainda não se situam, nem se declaram e, frequentemente, se escondem e se omitem. Uma situação que não pode deixar descansados os responsáveis das comunidades. Os leigos, quando passam pelo templo e aí descobrem a sua vocação específica e o seu lugar na Igreja, devem sentir-se estimulados para as tarefas a realizar na sociedade. Essas é que lhes são próprias. A sua vocação do leigo é ser “cristãos no mundo”. Esta condição prevalece sobre outras actividades na comunidade cristã, se não as pode realizar, sem prejuízo da sua missão no mundo.
Uma comunidade cristã bem organizada, mas de costas voltadas para a sociedade e para o que nela se passa com repercussão na vida das pessoas, está fora do sentido e do âmbito evangélico, que a devem caracterizar.
As batalhas mais duras da vida não se passam no templo, mas sim na casa de família, no lugar de trabalho, sempre e onde se joga o rumo das actividades sociais e políticas. Os seus protagonistas devem ser, ao lado de outros, os leigos cristãos que estão no campo de luta. Têm, por isso, direito a sentir o apoio de retaguarda na sua comunidade de referência, que lhes propicia meios de reflexão e formação, para que a sua participação se processe e se decida, com sentido evangélico e em liberdade, pelos caminhos da justiça, humanização, verdade, solidariedade.
Um mundo diferente, sujeito cada dia a mudanças que tocam na vida das pessoa e das comunidades, um mundo com problemas humanos e sociais de grande monta, não pode permitir a ninguém, e muito menos à Igreja, que se lhe passe ao lado. Os problemas não se resolvem automaticamente, mas com a participação activa nos dinamismos que os provocam. O caminho não pode ser outro senão aprender a viver numa sociedade em mudança. O diálogo Igreja – Mundo, cada vez mais exigente e urgente, não é um diálogo clerical e não se fará nunca sem leigos activos, preparados e apoiados.

António Marcelino

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Não está fora de prazo: um paradoxo

A preocupação com produtos fora de prazo tornou-se quase uma obsessão cultural do nosso tempo. Vivemos o tempo do efémero, dos produtos que duram pouco, produzidos para durar pouco: de usar, e sem sequer usar, e logo deitar fora. Vai-se tão longe que há seres humanos que já são considerados fora do prazo antes de nascer e já se fabricam máquinas perfeitas para destruir produtos perfeitos. E pior: máquinas perfeitas para destruir pessoas não fabricadas mas criadas, decretando que estão fora do prazo de validade. “O homem é antiquado” é o título de Gunthers Anders que deixou páginas de alerta neste sentido.
Há cerca de dois séculos esta atitude de considerar produtos fora de prazo já tinha avassalado culturas, crenças, tradições, valores e instituições. E não demorou que Deus, reis, papas e logo, até hoje, muitas outras autoridades e categorias de pessoas fossem sendo declaradas fora de prazo, mortas ou destruídas. Mas há realidades e instituições como as religiosas e a família que mesmo esmagadas resistem e vão durar.
No pós-concílio a tendência de considerar fora do prazo muitos conteúdos de fé cristã deu sinal em muitas áreas da Igreja. Estou a escrever no dia 4 de Agosto de 2009 durante a orientação de dias de reflexão espiritual e fui surpreendido por uma intuição de paradoxo que me assaltou. Um santo cuja vida conheci nas leituras de refeitório do meu convento, (estas agora fora de prazo), e cuja paróquia de Ars visitei no pré-concílio, ocupa este ano as atenções de toda a Igreja, e isto quando havia impressão bastante geral de ser um santo sacerdote e pároco de perfil antiquado, de segundo plano e, para alguns, já fora de prazo. E agora…o paradoxo de ser revalidado.
Já a nomeação dele para uma paróquia “impossível”, com antecessor ajuramentado da Revolução Francesa e pouco depois “défroqué”, foi talvez um atestado de o arriscar em lugar que ninguém queria porque já então era considerado um pouco fora de prazo. Basta lembrar que era um camponês pouco dotado impróprio para altos estudos e só aceite à ordenação desde que não confessasse por falta de nível. Só para alguma paróquia insignificante serviria. Hoje seria olhado mais fora de prazo ainda por recorrer a métodos demasiado simples, e, para alguns, antiquados que até têm vindo, por vezes, a ser postos de lado por espíritos “superiores” desde há 40 anos para cá. Nada tinham de programa grandioso marcado para a eficácia.
Oferecer a sua vida para converter os pecadores da paróquia? Que ideia! Não será dolorismo masoquista? Confissão? Pessoas “superiores” confessam-se a Deus, não precisam de se ajoelhar diante de padres confessores. Oração? Só quanto baste e ali se sentirem bem. Nem é preciso ir à igreja. A prática do yoga também dá. Missa? Uma vez ou duas no ano nalgum funeral, casamento de amigos e quando não causar transtorno pessoal. Adoração ao Santíssimo Sacramento e de joelhos? Tantas igrejas já nem sequer têm genuflexórios. E até se diz, como alguns protestantes, que a Eucaristia é apenas o símbolo de Cristo. Devoção a Nossa Senhora? Nem é bom pensar nos métodos sem programação adequada das suas aparições a pessoas analfabetas.
Fora de prazo, João Maria Vianey?
Graças a Deus que o Papa veio dizer alto e bom som: o santo está mais dentro do prazo que nunca. Foi avalisado por Jesus Cristo e o Evangelho, os quais não perdem a validade. O exemplo de fé vivida de S. João Maria Vianey e o seu método de muita oração, adoração do SS Sacramento, do valor da Missa e comunhão, o mais importante da vida humana, a confissão sacramental; devoção, rosário e consagração das paróquias à Imaculada Conceição, são métodos válidos hoje e sempre. Com dois mil anos, são e serão sempre novos, próprios e indispensáveis para manter a vida humana recta e ancorada na fé cristã, na caridade e vida divina.
A minha atitude espontânea neste ano é a de dar graças a Deus pelos dons concedidos a ao Santo Cura de Ars; e a este Papa para reabilitar e declarar válidos tantos tesouros do património vivo da fé da Igreja que já estavam a ser abusivamente dados como fora de prazo. Para tantos sacerdotes este ano vai ajudar a preparar jubileus revitalizados de 25, 40 e 50 anos de sacerdócio, tal como para mim. Este Ano Sacerdotal é um dom inestimável e um estímulo para todos, bispos, presbíteros e leigos viverem sempre mais entregues a Cristo.
Fátima, 4 de Agosto de 2009
Aires Gameiro

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