A pouca independência… até no falar!
Ao Compasso do Tempo - Crónica de 26 de Junho de 2009
Leitura semanal dos problemas do Mundo e da Igreja
Não é por uma questão de “elitismo” mas o português coloquial, na naturalidade das situações, deixa-me, aqui ou acolá, em discordância. Claro… há os tiques, as imitações, os efeitos inconscientes ou mesmo (e sobretudo) conscientes, pelo “ficar bem”. Mas, por todos os motivos, não posso aceitar o “obviamente” (repetido à saciedade), o “é assim”, o “extremamente importante, o “expectável”… Mas ouvir na televisão, (como estou a escutar neste momento, 5.ª feira à noite), alguém de um canal televisivo dirigir-se ao entrevistado: o que se passa “consigo”? (seja um Senhor Ministro ou um qualquer de nós), é de pedir o exílio… À semelhança de alguém que vai consultar um médico ou um empregado da confeitaria e se lhe dirige neste linguajar “lisboeta”:
“Venho aqui falar “consigo”…”!
O “português” de meus avoengos e seus sucessores era bem diferenciado: “Venho aqui pôr esta questão ao Senhor Dr. (ou Doutor), ao Senhor António ou à Amélinha”… Mas… “consigo”? Esse é um produto de pressão social, em que outros me “empurram” a soletrar ou a expressar-me como eles…
É “extremamente importante”, é “bonito”, é “complicado”…
Já não posso. Teve audácia o outro que, falando com personalidade de rara qualidade de saber, a qual, embora sapiente, se “pendurava”naturalmente em “narizes de cera”, tais como “efectivamente” (repetidas vezes no princípio das frases), teve um “português atrevimento” de a aconselhar.
E, com esse à vontade, chamou a atenção (a Sua Exia) que não se firmasse em tal “bengala”… e tantas vezes… Outros iriam, a repetir-se o gesto, “explorar” o incoveniente.
Pois a personalidade citada ficou surpreendida e agradeceu-lhe de coração. Comentando depois o acontecimento, destacou a surpresa e o reconhecimento. Por um simples motivo: nunca ninguém se “atrevera” a rectificá-lo!
Não lhe endereçou um “consigo” da velha Lisboa… Mas teve a lucidez e o à vontade de uma correcção fraterna, em nome da independência e da puridade da linguagem. E se em muitos “dialectos” do português superássemos o menos próprio, em termos de boas maneiras e da independência de pensar e falar?
Hoje vai desta forma o que mais me tem tocado… Tantos sons ouvidos… (televisão, rádio, amigos, conhecidos e desconhecidos). Tantas letras não digeridas (dá muito mais trabalho e esforço…)
O repetitivo e o medíocre é uma senha de consumo. Chegamos a “isto”. Mas não é para dizer mal. É para tratar bem a língua, o seu conteúdo e a independência nacional!
Lisboa, 26 de Junho de 2009
D. Januário Torgal Mendes Ferreira
Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança
http://castrense.ecclesia.pt
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