Presente e futuro dos partidos políticos e da democracia
Perante a situação crítica que se está vivendo e o comportamento público de muitos políticos em cena, a interrogação e reflexão sobre o presente e o futuro das associações partidárias, não é apenas um tema pertinente, mas actual e urgente, se orientado para ajudar os cidadãos a reflectir, decidir e optar conscientemente.
Não falta já quem se interrogue sobre se este é o melhor regime, dado que está sendo posto em causa em muitos países, não apenas da Europa. As democracias respondem às ditaduras, mas quando elas próprias perdem o sentido e o rumo de serviço à comunidade, são sempre porta aberta para novas ditaduras. A história recente vai-nos abrindo páginas novas para que assim se possa ler com objectividade e proveito. Também, entre nós, a experiência acentuada de uma democracia de interesses multiplica os nostálgicos de tempos passados, mas recentes.
Em Dezembro de 1998, por motivo dos 50 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em Carta Pastoral, os bispos portugueses deixaram dito: “A partidocracia, levada ao extremo, é um caminho propício para o desrespeito dos direitos humanos fundamentais, mesmo que se advogue a liberdade pessoal e o pluralismo cultural e religioso”. E prosseguem: “Tratando-se de matéria com tantas repercussões na vida da comunidade e das pessoas, julgamos que os partidos políticos devem ter especial cuidado na escolha dos seus candidatos para que se possa dotar o país com leis que não lesem, antes defendam e promovam os direitos da pessoa, as condições de bem comum, os valores universais, a cultura tradicional do povo, o favorecimento da convivência sadia”. Na altura, alguns políticos de renome, manifestaram o seu apoio à Carta Pastoral dos bispos, pondo apenas reticências ao que nela se dizia dos partidos políticos. No entanto, à medida que o tempo passa, mais fica a claro como este é um problema nacional a que não se tem dado especial importância.
A liberdade de associação é um direito consignado na Constituição. A democracia exprime-se através do pluralismo de opiniões, propostas e intervenções. Porém, isto exige que seja exercido por gente que não se considere única nem indispensável, que não despreze os outros, nem as suas opiniões legítimas. O caminho das melhores soluções para os problemas da comunidade constrói-se com todos, com as propostas válidas de todos e no respeito para com todos. Não têm lugar na democracia os ditadores que pensam ser os únicos capazes. Nem os orgulhosos que não respeitam os outros. Nem os avessos ao diálogo que julgam que o país lhes pertence. Todos estes contribuem para um resvalar progressivo que só para no abismo.
Os que julgam ter sempre razão, pelo que não há que aceitar mais as razões dos outros, são psicologicamente doentes e, quando exercem cargos públicos, seja a que nível for, são também perigosos. Por vezes, parece que a actividade política se vai realizando num manicómio aberto, onde todos são adversários, as opiniões se desvirtuam, a mentira é moeda corrente, o poder pelo poder é o grande objectivo, o medo de perder um lugar confortável e honroso se sobrepõe ao cuidado de prevenir o país de crises sociais e morais, económicas e políticas. Quem na política pensa mais em si e nos interesses do seu partido, não tem lugar que legitime o que ganha. Alguns partidos, de há muito deixaram de falar no bem comum dos cidadãos, o grande objectivo da governação, e falam só do “estado social”, interpretado segundo a sua cartilha e caminho de conquista do povo interesseiro e amorfo.
Falta a muita gente da classe política a cultura que permite entender, pela positiva, os objectivos nacionais e o modo de os realizar. E a candidatos que se perfilam para se tornarem políticos profissionais, falta-lhes ainda a experiência de serviço aos outros, a maturidade e o bom senso para lerem o país real e o que deles se pode esperar.
A situação do país é grave. Os políticos não podem brincar, pensar só em vitórias pessoais e partidárias, levantar muros que dividem, quando a hora é de dar as mãos sem preconceitos. Serão eles capazes de pensar neste país gravemente doente? De alguns que teimam permanecer no poder, já sabemos que não são capazes de abdicar de si. Dos outros, perceberemos, nos tempos próximos, pela sua linguagem e atitudes, qual é o seu horizonte de vida e por onde navegam os seus interesses.
Os cidadãos têm amadurecido, olham a vida com outros olhos, começam a intervir à margem dos partidos. Não são menores necessitados de tutela, nem crianças que se enganam com rebuçados ou promessas fáceis. A anestesia do povo está perdendo o efeito e surgem, felizmente, gritos, antes não gritados. Será que os políticos já se aperceberam?
A democracia não prescinde dos partidos, mas os partidos não esgotam a participação democrática. Outras forças devem ser reconhecidas, respeitadas e promovidas, sem o que o país fica sempre mais pobre. Os ditadores incomodam-se com o que não sai deles e a eles não torna, como coroa de glória. Portugal já disse que não quer ditadores e o povo depressa descobre os que se disfarçam para ganhar o poder.
D. António Marcelino
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