Jornal de Opinião

São muitos os textos enviados para a Agência Ecclesia com pedido de publicação. De diferentes personalidades e contextos sociais e eclesiais, o seu conteúdo é exclusivamente da responsabilidade dos seus autores. São esses textos que aqui se publicam, sem que afectem critérios editoriais da Agência Ecclesia. Trata-se de um espaço de divulgação da opinião assinada e assumida, contribuindo para o debate de ideias, que a internet possibilita.

10/03/12

Ao Compasso do Tempo – Crónica de 19 de Março de 2012

No diálogo com a Sociedade, a Igreja é um elemento. O outro, nasce desse mundo, do qual os batizados não devem fugir.

Na celebração dos cinquenta anos do Concílio Vaticano II, (estudado este acontecimento em muitas dioceses do país) vem-me á consciência uma pergunta de um jovem, há algum tempo expressa: mas onde estão leigos e leigas de há cinquenta anos? Por onde pairam? Por que não permaneceram no silêncio/barulho da comunidade eclesial? Se são, tantos deles, figuras marcantes da cultura, da política, da administração, do progresso social, da sensibilidade humanizadora… por que se distanciaram? Ficaram dececionados, desconsolados, traídos, pela menos fraternidade, pelas infidelidades à arte de pensar, pela intolerância, pelo azedo beato que enxameia instituições viradas para si e de costas para as grandes questões da vida, pelos escândalos e pela incoerência e desequilíbrios de toda a ordem…? Por que razão mudaram da ares? A culpa não será toda da comunidade que enjeitaram. Os exilados transportaram também pó na sola dos sapatos. Mas por que não falarmos disto e de tantos incidentes, em lugar de cada um, de alguns, de todos, se situarem em trincheiras, sem vontade de descobrirem a face e encararem o outro, de quem se diziam gémeos? Não acontecem destes conflitos e destas sensibilidades feridas em todas ou em quase todas as famílias?
As pessoas não se cumprimentam. Mudam de passeio, para não se reencontrarem. Guardam na memória tristezas e ressentimentos. Alimentam cicatrizes de traição. Transportam as más horas. Os maiores desencantos são frutos dos maiores amigos e mestres de outras eras. Já não são as ideias que dividem. São a insensatez, o contraditório de conveniências, a forma de refletir sem convicção, os novos amigos, os novos salões, os novos clubes, as novas importâncias de dinheiro e distinções sociais, os amores trocados, a despersonalização… E tantos e tantos outros ingredientes do mundo! Vive-se como se nada se passasse à nossa porta. Os lugares de vulto e exibição estão repletos.
A mediocridade enche o palco e alimenta a publicidade de idêntico jaez. E, em mistura social, lá perpassam os heróis, os santos, os profetas, os inconformistas, os indispostos com “a desordem estabelecida”…
Por que não falamos entre nós? Por que catalogamos quem nos parece ser de clube diferente? Por que não nos expomos a ventos e marés, sufocando o mau feitio e o azedume habitual? E tantas interrogações a formular! E tudo isto a propósito de uma Igreja que deve dialogar com o mundo! Só que os problemas graves aí estão com expressões da maior tragédia. Mas tocar nessas questões, nunca.
Por esses e outros problemas, tantos e tantos deixaram a Igreja sozinha a falar consigo.
Por onde andarão esses profetas e irmãos?
Daí a pergunta a Júlia Kristeva; citando Arendt: “O que significa para nós, europeus, hoje, encarar a crise duma forma não preconceituosa?” (Passos, Fevereiro 2012, p.25).
Ou a afirmação: se os cristãos mudassem de atitude, não haveria pobreza em Portugal (Professora Isabel Allegro Magalhães, Público, 29 de Fevereiro de 2012, p.9)

MDN, Capelania Mor, 09 de Março de 2012
D. Januário Torgal Mendes Ferreira
Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança


0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial