Jornal de Opinião

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13/02/12

Ao Compasso do tempo - 10 de Fevereiro de 2012

Em 13 de Julho de 1958 foi dirigida ao Presidente do Conselho esta consideração: “Se eu pudesse pensar que o espírito de luta e o ódio não estão a subir tremendamente e se não estivesse convencido que essa subida resulta de erros substanciais podia decerto dormir tranquilo (…) Porém (…) as tensões sociais e políticas estão a subir perigosamente (…) Tenho procurado debruçar-me sobre a doutrinação do Santo Padre (…) bem como sobre o ensino dos bispos do mundo (…) Os frutos do trabalho comum devem ser divididos com equidade e justiça social (…).
Um individuo ou (…) uma classe, nunca estarão satisfeitos enquanto não experimentarem (…) que são sujeitos e não objectos (António Ferreira Gomes, Antologia do seu pensamento, I vol., Porto, Fundação Eng. António de Almeida, 1990, pp 129-130).

No Expresso (4.02.2012), o ex-presidente da Assembleia da República, João Bosco Mota Amaral, “Um país triste e assustado”, do qual destaco: “Com um horizonte tão cerrado, ninguém se atreve a anunciar o fim da crise, sob pena de cair no ridículo. Continuaremos a aguardar a necessária agenda para o emprego e o crescimento, única via para cumprirmos os nossos compromissos internacionais”.
E, na óptica do criador da Comunidade de Taizé, Roger Schutz (Violence des pacifiques, Taizé, Les Presses de Taizé, 1968, pp. 195-198):
“Depende dos cristãos que a nova sociedade se edifique com eles, e não sem o seu concurso. Mas nesta sociedade a tensão é muito forte. No seu fanatismo, alguns querem impor uma solução exclusiva (…) Não é inútil lembrá-lo: os mais marcados na sua história pela intolerância tornam-se muitas vezes capazes de uma intransigência próxima da inquisição”.
A efervescência no âmbito das Forças Armadas não resulta da Associação de Oficiais. Decorre, a meu ver, da opinião comum dos militares. Mas esta intranquilidade não vem de hoje. Tem a sua fonte, de que múltiplos capítulos da sua insatisfação são um espelho, em razões de há longos e longos anos. Mas a complexidade do problema reduz-se hoje a um dado elementar: não há dinheiro.
Porque não são mais nem menos, no tocante aos outros cidadãos, e se trata de gente limpa e sã, continua a parecer-me que algumas visões diferentes, no confronto com o Ministério da Defesa, hão-de encontrar solução, se forem sepultadas as arrogâncias e a insensibilidade, praticando-se um honesto exame de consciência sobre as pessoas, os meios e os objectivos. Há gastos em excesso, opulências, sumptuosidades, hábitos imemoriais?
Há retórica e discursos de publicidade? Há unidades a mais? Há panóplias de instrumentos e ferramentas? Há instâncias a “emagrecer”? (colégios, hospitais, números de sítios e espaços, etc, etc?) Há resistências à mudança?
Vem para a opinião pública um tema de discussão, porque não foi devidamente acautelado em diálogo interno e privado. E depois… as pessoas, sempre concretas e com histórias de dignidade e de devotamento, sentem-se defraudadas e diminuídas. Sem corporativismos nem brios sectoriais, com verdade, justiça e fraternidade, é possível alterar situações e comportamentos.
As pessoas são rectas e fiéis ao rigor do que deve ser. Ninguém se propõe como excepção em referência com outros “mártires” de cortes e infortúnios. Mas, quando em outros sectores do Estado, o dinheiro aparece e é gerido sem equidade, um servidor militar sente-se molestado, enquanto instituição.
Estamos a construir um Estado pobre e disforme. E, por via disso, injustificado. Há valores na instituição militar que não brilham na sociedade em geral. Esta moléstica ética tem transformado em “fraca”, a “forte gente” do nosso país.
Os sinais da derrocada são mais do que menos. Por isso, conforme afirmei (e não me alterem a frase…) “isso (a queda do Governo) seria uma tristeza para um país que não sabe consolidar e fomentar a devida estabilidade”. (entrevista à TSF, citada com exactidão no Diário de Notícias em 9 de Fevereiro de 2012). O que eu gostava era de dialogar sobre tudo isto!


MDN – Capelania Mor, 10 de Fevereiro de 2012
Januário Torgal Mendes Ferreira
Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança


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