Jornal de Opinião

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26/04/11

Novos métodos para expressar verdades eternas: Contexto, quadro global da acção eclesial, estratégias

O contexto sociocultural actual desafia continuamente toda a pessoa, e os agentes eclesiais em particular, a assumirem atitudes criativas, empreendedoras e diferenciadoras. As reais situações contemporâneas de desemprego, de apatia social, de individualismo, de crise de valores e de infelicidade exigem a promoção de experiências inovadoras e significativas que qualifiquem o sentido da vida e que constituam, efectivamente, uma mais-valia para o cristão, tanto considerado individualmente como colectivamente.

As propostas evangélicas e eclesiais fundamentam-se num conjunto de significados capazes de colmatar muitas lacunas na experiência quotidiana do Homem contemporâneo. Para isso há que, com lucidez e coragem, identificar o essencial da identidade cristã e realizar, com método, experiências significativas que qualifiquem os pensamentos, as emoções e os comportamentos de quem procura na Igreja respostas para as suas inquietações existenciais.
A Igreja, na sua essência, ao colocar-se ao serviço do Reino de Deus, procura satisfazer, em todos os tempos e em todos os lugares, a utopia do coração humano. Esta utopia refere-se ao desejo profundo do ser humano experimentar em pleno a vida, a felicidade, a paz, a liberdade, a unidade e a comunhão. Por isso, a Igreja torna-se sinal eficaz da união de todo o género humano, tendo, para isso, como ponto de partida, a comunhão da pessoa com Deus. Como mediação e expressão visível da concretização deste desígnio de vida em plenitude, quatro exigências se colocam continuamente a todo o cristão de modo a expressar o mistério da Igreja: realizar um serviço, viver a comunhão, proclamar a vida através do testemunho e celebrar a existência através da liturgia.
Tendo em conta o contexto sociocultural e psicossocial da realidade global, considerada tanto ao nível internacional como nacional, interessa identificar experiências que satisfaçam as quatro dimensões da essência da identidade cristã e da acção eclesial:
• SERVIÇO: Caridade, Promoção Humana, Educação, Libertação, Solidariedade;
• COMUNHÃO: Fraternidade, Reconciliação, Unidade, Comunicação, Partilha;
• TESTEMUNHO: Anúncio, Profecia, Evangelização, Catequese, Pastoral Juvenil;
• LITURGIA: Eucaristia, Sacramentos, Orações, Devoções, Celebrações.
Quando este quadro global da acção eclesial é vivenciado de um modo integral e equilibrado temos uma presença fecunda da Igreja junto das crianças, dos adolescentes, dos jovens, dos adultos e dos idosos. Se, porventura, a vivência do ser cristão se centra exageradamente numa destas quatro dimensões, a expressão das verdades eternas e dos valores perenes fica esbatida, tornando-se pouco credível e questionável. Assim, interessa identificar experiências concretas a serem realizadas sistematicamente pelas comunidades eclesiais que expressem a interdependência entre o serviço dos cristãos, a comunhão experimentada, o testemunho dado individual e comunitariamente e a celebração desse serviço, dessa comunhão e desse testemunho.
A fim de serem activadas mudanças que visem responder efectiva e adequadamente aos desafios e sinais dos dias de hoje, interessa revitalizar o ser cristão de modo a ser possível interiorizar novos conhecimentos, assumir novas atitudes, experimentar novas emoções, encetar novos comportamentos, promover novas experiências.
Estas mudanças só serão eficazes e sustentáveis se houver envolvimento do maior número possível de pessoas na busca, cultivo e implementação da renovação. Para isso, é de privilegiar uma reflexão e acção na lógica comunitária, a qual exige debate e participação ao nível dos pequenos grupos e das comunidades. Daí surgirá uma intervenção com efeitos significativos na busca e concretização do bem comum. Apesar de esse ser o melhor método de reflexão, a título exemplificativo e ao sabor da pena, apresento de seguida algumas pistas para a promoção de experiências significativas.
Ao nível do SERVIÇO, interessa responder às necessidades dos desempregados, capacitando-os e formando-os para assumirem uma atitude empreendedora na resolução das suas problemáticas profissionais. Perante estes e muitos outros necessitados, há que responder rápida e eficazmente. Este é um dos modos evidentes da opção de sempre da Igreja pelos mais pobres, como o bem souberam fazer, por exemplo, a Madre Teresa de Calcutá e o Dom Hélder Câmara.
Ao nível da COMUNHÃO, constata-se actualmente uma enorme sede de criação, desenvolvimento e fortalecimento de laços humanos. Num período dominado pelo individualismo, pelo vazio e pela fragmentação, a Igreja tem a proposta de uma experiência altamente significativa para a vivencia da comunhão, da ligação a Deus e, a partir d’Ele, a toda a Humanidade. Para isso há que trabalhar o acolhimento, a superação de conflitos, a maximização das potencialidades humanas e a minimização das fragilidades das pessoas, a liderança para a construção de pontes e desenvolvimento de um relacionamento maduro e a longo prazo.
Ao nível do TESTEMUNHO, o contexto de infelicidade e de crise exigem um repensar o modo de proclamar a força do mistério pascal. Por vezes, fica-se mais pela paixão e pela morte do que pelo essencial, que é a ressurreição que resulta do processo de sofrimento e de morte de Jesus Cristo. É a força de Cristo ressuscitado que é capaz de dar um significado para as frustrações, erros, mágoas, dificuldades da vida, levando a pessoa a se auto-transcender. Além disso, é tempo de anunciar as bem-aventuranças, num tom como somente Jesus o sabia fazer: mostrando a evidência de que quem o procura é feliz, apesar das situações pessoais e históricas mais miseráveis que esteja a viver. Além disso, como sempre, tem credibilidade o anúncio feito pelo exemplo de vida, que é constituído fundamentalmente pelo modo de pensar, pelas atitudes e pelos comportamentos quotidianos.
Ao nível da LITURGIA, interessa dar-lhe vida, de modo a ser efectivamente a expressão das alegrias e das tristezas de quem participa num acto litúrgico. Por princípio, uma celebração é significativa quando contribui para a pessoa e a comunidade gerarem vida nova, suscitarem esperança e darem mais sentido à vida. Simultaneamente, a liturgia deve ser a celebração do serviço, da comunhão e do testemunho dado pelos membros de uma comunidade cristã. Nesse sentido, a Eucaristia torna-se o momento central de um grupo de pessoas que vivem aglutinadas à volta de Cristo. Por isso, há que promover novas experiências na liturgia, de modo a que haja mais envolvimento e partilha da vida quotidiana de quem participa numa celebração, dando-se mais atenção aos presentes do que aos ausentes.
Assim, há que pensar e implementar novos modos e novos métodos de vivenciar e expressar estas acções fundamentais do ser Igreja. Por método entende-se a selecção e organização dos recursos disponíveis e das acções praticáveis a fim de ser atingido um determinado objectivo tendo em conta a situação de partida. Os elementos desta definição podem inspirar o desenvolvimento de uma metodologia que faculte uma adaptação da Igreja aos dias de hoje.
• São muitos os recursos da Igreja, nomeadamente os humanos, que são sempre o maior bem de uma organização. Há que valorizá-los, reconhecer que são capazes de ser e fazer muito mais do que aquilo que pensam que são capazes.
• Também são muitíssimas as acções realizadas no âmbito das comunidades cristãs. Há que enquadra-las numa unidade devidamente planificada e integrada, de modo que todos os recursos humanos sintam que actuam em conjunto.
• O objectivo a atingir é sempre o da salvação, que se refere à experiência de vida em plenitude. Este objectivo permite encetar, realizar e avaliar todas as acções. Se porventura alguma acção não contribui directa ou indirectamente para esta finalidade há que repensá-la.
• A situação de partida é a actual, que constitui o hoje de Deus e da Humanidade. Efectivamente, este é o nosso tempo, que deve ser abraçado por nós, como também Deus abraça continuamente a História. As características deste tempo são sobejamente conhecidas, uma vez que diariamente são disseminadas informações mais do que suficiente para a compreensão da realidade humana. Segundo uma lógica da espiritualidade da encarnação, há que conhecer, aceitar e mudar aquilo que for possível transformar.
• Finalmente, um elemento essencial da supracitada definição refere-se a seleccionar e organizar, de um modo inovador e perspicaz, esses recursos e acções. Assim, expressarão sinergicamente os múltiplos tipos de acções realizadas, as modalidades de relacionamentos experimentados, os padrões de pensamentos anunciados e os paradigmas de festas vividas.
Com método é possível fazer mais e melhor. Mesmo tendo a certeza que é a graça divina que actua, a nós compete, através de empenho e dedicação, criar as melhores condições para que Deus actue na História hodierna. Nesse sentido, não podemos deixar que a metodologia seja o parente pobre da pastoral.
Concluindo. As verdades e os valores eternos vivenciados e anunciados pelos cristãos têm potencial para ecoar no coração e na mente dos nossos contemporâneos, satisfazendo os seus anseios mais profundos e as suas necessidades mais imediatas. Para isso há que vivenciar e expressar as verdades evangélicas de um modo positivo, criativo e significativo, o que exige lucidez e coragem para activar novos métodos e promover experiências inovadoras que suscitem pensamentos, atitudes e comportamentos na lógica do serviço, da comunhão, do testemunho e da festa. Assim, será mais evidente o facto de expressarmos hoje as verdades e os valores eternos.

Jacinto Jardim


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