Semente lançada que acolhe o tempo do fruto
Bento XVI regressou a Roma. Não veio a Portugal como turista, nem à conquista de simpatias, nem a procurar ou evitar proventos de manifestas diferenças. Veio como peregrino e profeta, como irmão mais responsável numa obra apostólica - a missão evangelizadora - que a uma grande maioria dos portugueses diz respeito.
O leque abriu-se: uns sentiram-se conquistados e emocionados; outros continuaram a olhar para trás e a fazer comparações; para outros, vir ou não vir, era e foi indiferente; outros, poucos mas livres para opinar, não deixaram de protestar pelos incómodos causados à sua ideologia, ao trânsito ou à economia débil do país; muitos, finalmente, acolheram com alegria a visita e a mensagem de Bento XVI e têm agora na sua mão a sorte do futuro com a semente lançada e acolhida no terreno preparado do coração.
A verdade é que ele veio, esteve e partiu. Diz a comunicação social que partiu muito contente. Falou a grupos e a multidões, a crentes, a menos crentes e a descrentes. Cada qual o ouviu a seu jeito Não polemizou com ninguém. Não atacou ninguém. Não desfiou verdades abstractas. Não fez imposições, mas propostas
Prisioneiro dos protocolos, sujeito a seguranças exageradas e vistosas que não desejou. Como primeiro responsável espiritual da Igreja realizou a sua missão, mas também foi capaz de se sujeitar ao que lhe foi imposto. O Papa era um visitante qualificado a um país tradicional e sociologicamente católico, que, pelos seus responsáveis o quis acolher e guardar, longe de perigos e sobressaltos. Esteve à vista. Eu desejava de outro modo, mas não era de mim que se tratava, nem tinham que me pedir opinião.
Teve a coragem de dizer, em cada lugar, a verdade em que acredita, com realismo e sem orgulho. De falar da Igreja a que preside e da sua realidade, santidade e mazelas, com realismo, sem triunfalismo, nem complexos de culpa.
Apontou caminhos a seguir, deixando-os em aberto para gente corajosa. Suscitou opiniões, provocou aplausos, desencadeou críticas, inquietou consciências, estimulou seguidores.
Pôs Cristo no centro e convidou ao seu conhecimento. Falou de esperança e exorcizou medos. Aliou o passado ao presente para quem procura e quer ter futuro. Enalteceu o diálogo sem ambiguidades. Realçou o valor de cada pessoa. Disse que “um povo que não sabe a sua própria verdade, perde-se nos labirintos do tempo e da história, sem valores claramente definidos, sem grandes objectivos claramente enunciados.”
Deu valor na liturgia ao silêncio orante. Disse que a Igreja tem de entrar no diálogo com o mundo. Sublinha a importância e a actualidade do Vaticano II e como este Concilio “ pôs em evidência os pressupostos de uma renovação do catolicismo e de uma nova civilização - a “civilização do amor” - como serviço evangélico ao homem e à sociedade.”
Para Bento XVI, assim o disse expressamente, se Deus é Amor “ então a lei fundamental da perfeição humana e, consequentemente, também da transformação do mundo é o novo mandamento do amor”.
Realçou o papel dos cristãos leigos na acção social e política, chamados a “promover organicamente o bem comum, a justiça, e a configurar rectamente a vida social”. Pediu às instituições sociais da Igreja que “procurem o bem das populações carenciadas, seja clara a sua orientação, deixem bem patente a sua identidade na inspiração dos seus objectivos, na escolha dos seus recursos humanos, nos métodos de actuação, na qualidade dos seus serviços, na gestão séria e eficaz dos meios”.
Disse isto tudo e muito mais. Uns ouviram bem. Outros com olhos tortos e ouvidos retorcidos. A mensagem ficou e agora é tesouro para fazer render.
Falou aos bispos. Palavras que fazem pensar. Mas como é mensagem para toda a Igreja, a ela voltaremos.
António Marcelino
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