Eu gostava de ver o Papa...
Mas se eu vou ser, como espero, dos privilegiados que, em Fátima, vou estar perto do Papa, concelebrar com ele, almoçar com ele, participar na reunião destinada só aos bispos, como venho aqui dizer que gostava de ver o Papa?
Bento XVI, sou testemunha disso, gosta de perguntar, de escutar, de sentir a vida real na comunicação directa, de se abrir a todos, como irmão mais velho que tem alguma coisa de importante a comunicar, de não fugir aos problemas difíceis e incómodos que lhe são postos, sempre com o grande respeito que tem às pessoas e à verdade que liberta,
Assim o conheci eu em dois sínodos da Europa (1991 e 1999), nas visitas dos bispos a Roma, e, de modo ainda mais gozoso, na recepção pessoal com o meu sucessor, em 2007. Quando pela primeira vez o cumprimentei como Papa, na Praça de S. Pedro, ele quis saber o que me tinha levado a Roma. Quando lhe disse o motivo – o encontro de responsáveis das Escolas Católicas nos diversos países da Europa – porque não pôde receber os participantes devido ao Sínodo que então se realizava, logo ali quis saber, com perguntas concretas, como tudo se tinha passado, acrescentando, ainda, que lhe falasse também da situação das mesmas escolas em Portugal. Parece que não havia mais ninguém à espera. Falava sem olhar ao tempo.
E pensar eu que um guarda do Vaticano não me deixava aproximar do Papa, porque não ia de batina e solidéu, mas apenas vestido à homem, embora com cruz e anel. Forcei a entrada e a aproximação. Guardo, numa bela fotografia do momento, a recordação de encontro tão rico e pessoal.
Eu sei bem que, na visita que o Papa faz a um país, como agora a Portugal, a partir de determinada altura, mais tem de fazer o que as circunstâncias exigem, que aquilo que ele mesmo, bispo e pastor, gostaria.
Já se fala mais por aí da sua condição de Chefe de Estado do Vaticano, que da sua missão espiritual, como primeiro Bispo da Igreja Católica. A comunicação social já está mais interessada na cadeira do Papa, no que come e no talher que usa, no quarto onde dorme, nos presentes que vão dar, nas audiências devidas e nas intrometidas, na sua comitiva, na publicidade que se gerou à sua volta… Ser só Papa, parece ser pouco…
Eu sei que as visitas pastorais do Papa, também dos bispos nas suas dioceses, tanto podem servir para abafar com um programa que não deixa respirar e semeia ilusões, como para proporcionar momentos privilegiados de encontro com os cristãos nas suas comunidades, com as realidades sociais e religiosas, com os doentes e os mais pobres, os que não podem ir ao encontro de um visitante que também lhes diz respeito, dando tempo para escutar, animar e dialogar serenamente. O bispo ainda pode organizar nesta óptica as suas visitas, mas o Papa, depois de dizer que vai, mais tem de ser obediente que decisor, perante programas propostos e negociados com colaboradores que gostam talvez mais de espraiar os olhos em multidões, que dar rosto aos problemas das pessoas e aos gritos do tempo. Mas ele não pode discordar? Poder pode…
Já se entende agora o que digo quando escrevo “ Eu gostava de ver o Papa…”. Vê-lo de outro modo, sem estar pressionado e esmagado pelas horas e pelo tempo disponível, para que se possa sentir ao perto o seu olhar de esperança e escutar a sua palavra corajosa de defesa da verdade, testemunho de serenidade e indicadora de rumos. Algo se acautelou agora de meritório com encontros com o mundo da cultura, os agentes da pastoral social, os presbíteros, diáconos e consagrados. E, também, terão consolo os jovens e as multidões numerosas que o aguardam em Lisboa, no Santuário de Fátima e no Porto. Mas ainda por aqui, quem mais tem, é sempre quem mais pode e manda. Cristãos que amem o Papa e testemunhem Jesus Cristo na Igreja e no mundo estão por todo o país…
Impressionam-me menos os ataques de fora, que nestes tempos se multiplicam em relação ao Papa, que a repetição menos inovadora nestes acontecimentos. Deviam ser mais ocasião privilegiada para mostrar um novo rosto da Igreja e da sua missão, dos seus problemas e desafios, das suas preocupações e caminhos, e o empenhamento real das pessoas que a servem.
Seremos nós capazes, ao menos, de escutar, guardar e tornar vida tudo o que o Papa nos vai dizer a todos?...
António Marcelino
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