As pessoas são sagradas... sempre
Por vezes, nalguma comunicação social e nas conversas informais ou intencionais, surgem questões sobre a ajuda às pessoas mais necessitadas, seja através do rendimento de inserção social (antigo ‘rendimento mínimo’), seja pela distribuição de ‘cabazes’ – vem aí o Natal e tornam-se rituais! – a famílias ou pessoas com (declaradas) necessidades económicas.
Nalgumas situações também a Igreja católica entra ou tem entrado – consciente ou compulsivamente – neste frenesim de estar na acção social – há quem lhe chame pomposamente de acção sócio/caritativa – de ajudar quem mais precisa ou se declara precisado/a: para uns poderá parecer moda, para outros ‘torna-se necessidade’ de fazer coisas e para outros tantos – talvez demasiados poucos – uma exigência da sua fé e do compromisso evangélico... simples e activo.
No entanto, será sempre importante reflectir sobre a razão mais profunda de ser do cuidado de assistência da Igreja católica àqueles que dela se abeiram para que, um simples gesto de ajuda, não reverta em mero acto solidário e não em atitude de autêntica caridade.
De facto, não podemos confundir nem sermos (minimamente) confundidos: solidariedade é muito diferente de caridade. Como humanos, fomos obrigados a seremos solidários, dada a nossa configuração com os demais, enquanto a caridade – essa que dá sem esperar nada em troca nem sequer o agradecimento – só é possível pela descoberta que eu – no sentido pessoal exigente de conversão – vivo em que aquele/a com quem partilho faço por nele/a ter descoberto que é meu irmão/ã em Cristo, e, por isso, com direitos mais do que reivindicações, na medida em que eu partilho com ele/a e não lhe dou do que me sobra... nem para que ele/a me agradeça.
- Será que as instituições de caridade da Igreja católica – as Misericórdias, os grupos sócio/caritativos... ou com outra denominação em base cristã – não vivem mais a feição solidária do que a composição caritativa?
- Será justo e recto fichar – isto é pôr em fichas – as pessoas na segurança social só para termos qualquer coisa, por eles fornecido, para darmos, sobretudo, quando nos procuram?
- Até onde poderá ir a força de partilha das nossas paróquias para que dignifiquemos as pessoas que querem ajuda sem termos de dar a sua vida a conhecer a certos abutres sociais?
- Teremos, de facto, hoje, a sensibilidade para prosseguirmos a máxima do Padre Américo (do Gaiato): ‘cada paróquia deve cuidar dos seus pobres’?
- A ‘pobreza envergonhada’ como é, efectivamente, entendida, interpretada e cuidada, a começar pelos nossos vizinhos e familiares?
Perante estas perguntas/preocupações, ousamos propor:
* Que os diferentes intervenientes nas acções de ajuda aos outros – sobretudo em aspectos de índole católica – sejam pessoas mais dignas na arte de escutar e menos na de falar, sensatas na observação e correctas na sugestão de soluções.
* Que os promotores de acções de caridade tenham uma espiritualidade de compaixão mais do que uma (certa) mentalidade de auto-promoção ‘explorando’ as necessidades dos outros.
* Que os executores de acções sócio/caritativas possam usufruir do agradecimento fraterno de quem recebe mais do que das compulsões reivindicativas azedas dos agraciados com o pouco, o suficiente ou o bastante de quem dá.
Porque acreditamos que as pessoas são sagradas, deixemos, neste Natal, cair a pretensa máscara da solidariedade (mais ou menos oportunista) e criemos condições para que a caridade de Jesus – Menino feito Deus – se derrame em nossos corações com sinceridade e comunhão... para os outros!
A. Sílvio Couto
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