Jornal de Opinião

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06/06/11

Solidariedade cresce (mesmo) na proporção da crise?

Decorreu no fim-de-semana de 28 e 29 de Maio passado, a campanha de recolha do Banco Alimentar contra a Fome (BA), tendo recebido mais de 2.300 toneladas de alimentos.
Percorrendo vários distritos do país esta iniciativa do BA – que contou com mais de 30 mil voluntários – dará ajuda a cerca de mil e novecentas instituições de solidariedade social, que, por seu turno, farão chegar suporte alimentar (cabazes e refeições) a mais de 390 mil pessoas.

De referir ainda que, este ano, decorre uma outra forma de participação através da doação de alimentos pela internet, convertíveis em pagamento – para leite – pelo multibanco.
No ano de 2010, os catorze centros do BA distribuíram mais de 26 mil toneladas de alimentos, num valor calculado de 37,7 milhões de euros, numa média estimada de mais de noventa toneladas por dia.

Num tempo em que diz mal de tudo e de (quase) todos, esta onda de solidariedade terá algum significado mais do que estatístico? Num país descrente em si mesmo e (particularmente) naqueles que o conduzem, esta onda solidariedade valerá como projecto no nosso futuro próximo? Num momento assaz confuso e (razoavelmente) controverso, esta onda de solidariedade revelará o nosso coração ou a nossa razão... colectiva? Nesta época de miserabilismo, esta onda de solidariedade pode ser (verdadeiramente) um sinal profético para uma nova crença patriótica e cristã?

= Dar sem esperar em troca?
Nós, portugueses, somos dos povos da Europa que mais fortemente têm a capacidade de reagir às desgraças alheias. Às vezes damos até mais do que nos pedem. Somos um povo solidário, sobretudo, nas desgraças dos outros. Da mesma forma que vivemos numa espécie de preguiça acomodada, assim damos largas à benemerência, fazendo saltar a nossa generosidade sem rédeas.
Quantas vezes tentamos dar aos outros para que, quando chegar a nossa hora de precisar, possamos recolher o dado... com juros em boa maquia. Se bem que vivamos ainda da hospitalidade e do sol que nos visita, temos uma noção de partilha com quem sofre quase a roçar a fraternidade mais radical... A desconfiança ainda não assentou – total e definitivamente – arraiais em nossa casa!

= Unidos venceremos?
Muito mais do que as campanhas dos partidos políticos, esta onda do BA pode fazer pelo nosso país o que os nossos emprestadores internacionais do dinheiro não conseguem ver e, tão pouco, viver: o povo português pode ser pobre de dinheiro colectivo, mas é rico de sentimentos de solidariedade... particularmente na desgraça.
Podemos até nem trabalhar muito e tão pouco bem, mas ainda vamos tendo laivos de consideração pelas misérias alheias, sobretudo as que nos são mais próximas. Com efeito, esta cultura da vizinhança é-nos muito útil, embora talvez fosse necessário alargá-la à dimensão do país e não à mera conflictualidade... de maledicência.
Unidos venceremos as agruras. Unidos faremos um país mais próspero. Unidos seremos capazes de voltar a ser ‘bons alunos’ da União Europeia. Queira Deus dar-nos dirigentes à altura desta tarefa nacional, que desenvolvemos, suficientemente, no bairrismo... eleitoral!

= Razão sem coração ou coração com razão?
De facto, razão e coração precisam de estar em consonância... na nossa cultura portuguesa. Ora, na personalidade dos portugueses, estes dois elementos nem sempre se conjugam correcta, harmoniosa e sensatamente. Com efeito, somos – como povo e como nação – dados mais ao exagero: ora exaltando a emoção sem rigor intelectual, ora racionalizando excessivamente sem comoção. Há como que em cada português alguém que tem dificuldade em pensar e em actuar, seja à luz da inteligência, seja na emotividade plena de discernimento e avaliando as consequências dos seus actos.
Esta vaga de solidariedade está como que mais ao ritmo das lamúrias do coração do que ao sabor da lógica intelectual. Como é difícil ser equilibrado como português... cristamente!

= Quando a caridade se faz partilha!
Não se pode esquecer a matriz cristã do BA, pois isso como que seria ofender os seus promotores e até os executores... conhecidos ou anónimos. Este projecto do BA só se compreende à luz da solidariedade cristã e católica em concreto. Para quem usufrui deste serviço, o BA pode e deve ser apresentado como um produto da fé, tornado acção em favor dos mais desfavorecidos...
- Quem duvida de que os milhares de voluntários só o são/vivem porque há uma fé que a isso os impulsiona?
- Quem porá em causa que esse exército de voluntários tem alicerces na Igreja católica – paroquial, de movimentos e de centros paroquiais, etc. – mais activa em favor dos outros?
- Quem pretenderá esquecer ou ofuscar esta força de bem para dar o mínimo de dignidade aos mais pobres?

Por favor: não tentem aproveitar-se da fé com caridade, pois a caridade só é possível com fé.
Obrigado BA pela vossa força de caridade feita partilha de fé, hoje!

A. Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com)




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