Ao Compasso do Tempo – Crónica de 10 de Junho de 2011
Não posso deixar de manifestar a minha intranquilidade: um número altamente significativo de compatriotas nossos não votou (não quis, rebelou-se contra, “esteve-se nas tintas”, não sentiu a mínima responsabilidade perante o bem comum). Houve outras razões, porventura. Mas foram muitos e muitos “os desalinhados”!
É a atitude mais corrosiva. O desprezo, o amor ferido, as cicatrizes ocultas, a indiferença, o nihilismo, “o não vale a pena”… E, ao mesmo tempo, há trânsfugas, exilados, gente ferida, decepcionados, ludibriados… levando aos ombros o andor dos sentimentos citados.
Tanto ansiámos mudar a situação! Tanto nos empenhámos em grupos, movimentos, organizações informais, etc, etc! Tanto até nos zangámos com reacções e equilibrismos!
Tantos amigos e correligionários fizeram parte da nossa teia de afectos e de valores! E, depois, de um instante para o outro, tantos se esconderam, se desinteressaram, se mostraram traídos, perdendo a alma e o ânimo. E lá aparece o cortejo dos ciúmes feridos, das aspirações contrariadas, dos “boys” que adejam como abutres em qualquer campo de carnificina, dos deprimidos pela quebra da imagem… E não ponho mais na escrita. Não sei se a democracia foi fecunda na gestação de uma família numerosa e convicta! Entre nós!
Teve e tem filhos de uma integridade única. Mas irmãos desta família, tão diferentes e numerosos são, no tocante aos mesmos gostos e às mesmas paixões. Gosto e paixão em ordem a que outros cheguem ao ponto da realização e da dignidade, ambicionadas por peritos sociais e por edificadores de uma sociedade outra.
Mas na política, na Igreja, na família, nos nossos sentimentos mais íntimos, nos partidos ou movimentos cívicos… há multidões postas de parte, pessoas que não contam, gente que não é parente do universo… O mundo não é casa sua.
Pela liberdade e por um novo fascínio, que bom seria se regressassem!
MDN – Capelania Mor, 10 de Junho de 2011
Januário Torgal Mendes Ferreira
Bispo das Forças Armadas e de Segurança
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