Jornal de Opinião

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29/04/11

Bento Menni, 150 anos depois: vocações como os santos hospitaleiros

Hoje é o dia de S. Bento Menni. Este Santo nasceu há 170 anos. Celebrei a sua festa com as Irmãs das Casas da Madeira e vieram-me alguns pensamentos sobre o dia das vocações.

A Europa estava toda num furacão que soprava em mil ondas de desassossego e de tempestades desde os finais de 1700. E não podia haver vida religiosa legalizada… Na Itália havia guerras e batalhas e feridos e foi com esses feridos que o jovem Hércules, era o seu nome, começou a mostrar o que já era, um coração e uma cabeça excepcional. No único emprego tido, num banco de Milão despediu-se por o quererem aliciar para a corrupção na colaboração em negócios menos éticos. Há 150 anos fez a sua consagração ao Senhor, três anos depois escrevia ao Superior Geral que o enviasse para onde achasse mais conveniente. Em 1866 já estava com o Superior Geral em audiência com Pio IX a receber a missão de restaurar a Ordem em Espanha e Portugal. E o Papa recomendou: “com companheiros de vida perfeitamente comum, muito pobre, muito casta, muito obediente”. 50 anos depois era destituído de Geral e exilado; “grão morto”, Ordem observante.
De facto este Santo passou por sofrimentos, perseguições, difamações, tribunais, mantendo sempre os pilares da sua consagração: amar a Deus sobre todas as coisas, mesmo no sofrimento injusto, e amar os mais necessitados e indigentes. Viveu sempre uma firme entrega ao Coração de Jesus, à Eucaristia e a Nossa Senhora do Sagrado Coração de Jesus. Cumpriu a sua consagração ao Senhor, cumpriu a missão que o Geral e o Papa Pio IX lhe confiaram e ultrapassou-a: fundou a Congregação da Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e teve a iniciativa na fundação de dezenas de instituições.
Há um quase paralelo profético entre ele e S. João de Deus: o director espiritual deste não queria que ele se dedicasse ao apostolado e reabilitação espiritual das mulheres da prostitição, não viesse a perder-se; e o Superior Geral fez advertências a São Bento Menni que era preferível não se dedicar à fundação e direcção espiritual das Irmãs pelo risco de se desviar da sua missão. A união com Cristo e confiança total nEle era o segredo dos dois santos.
Com os Irmãos na profissão religiosa, como está patente nos arquivos, seguia as recomendações de observância de Pio IX, exigindo que além da profissão dos votos, assinassem a declaração de que se comprometiam à “observância da perfeita vida comum e aceitavam ir para qualquer casa para onde os superiores os enviassem”. Seria interessante ver quando acabou esta prática na Província e na Ordem, e também se esta declaração era feita pelas Irmãs.
O Santo passou pelas provas de fogo da kenosis da morte do grão de trigo, quando foi destituído de Superior Geral da Ordem e “desterrado” duas vezes: para Paris e para Dinan. Foi viver os seus últimos anos não longe dos locais fundacionais de Santa Joana Jugan, fundadora das Irmãzinhas dos Pobres a quem um Padre esperto roubou a Congregação confinando a santa numa casa quase incomunicável. A vida entregue totalmente a Deus na oração não o impediu de se entregar totalmente à hospitalidade. Pergunto-me como é que agora que se procuram caminhos de renovação espiritual na fé, não nos inspiramos mais nos modelos de espiritualidade e hospitalidade dos nossos santos hospitaleiros, antigos e mais recentes: João Grande, Bento Menni, Ricardo Pampuri, José Eulálio, Eustáquio Kugler, os Mártires, William Gaston, Magallon… Deram provas; e não será tempo de os descobrirmos? O carisma refundacional de Bento Menni, 50 anos depois, 1911, estava no auge apesar de novos furacões; 100 anos depois, 1961, terá começado a arrefecer com as tubulências. Será que 150 anos depois, nos anos de crise de fé e oração que vivemos, está em cuidados paliativos? Desde os anos 1970 se faz renovação. Não teremos que pedir que o Senhor suscite refundadores como os nossos santos?
Funchal, 24 de Abril de 2011 / Aires Gameiro


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