Dirigentes emparedados rodeados de burocratas e de aspirantes de poder
António Guterres, um governante com militância cristã e horizontes largos e que, por isso mesmo, não podia ir longe no ambiente que o circundava, disse que a educação era a sua paixão e a preocupação do seu governo.
Uns riram-se, outros incomodaram-se, outros logo afiaram espadas para o poderem ver pelas costas. Mas que outra paixão mais verdadeira e urgente pode ter o governante de um país como o nosso, senão a promoção integral de todos as crianças e jovens, a sua preparação para a vida activa, a sua capacidade de relação e de agir em qualquer circunstância, a aquisição de valores perenes que orientem a sua vida, o recto exercício da liberdade na verdade e na tolerância, o exercício livre de uma democracia plural e participativa, o desprezo por todas as formas de manipulação e de falta de respeito pelos outros, o não querer subir ao colo de outros e negar-se àquilo para o qual não está preparado?
Há dias, José Sócrates, em Braga, ao inaugurar uma escola reconstruída, disse de Portugal que “este é um país que aposta tudo na educação. Este é um projecto de muita ambição para o país e é a aposta maior na educação de que há memória”. E reafirmou que se trata de “uma aposta de conjunto, que vai do pré-escolar ao ensino secundário”. E disse ainda mais que “o país vai ter sucesso no futuro”, e que será palavra de aval para um cidadão: “Mostra-me a tua escola e dir-te-ei que nível de desenvolvimento tens”. Tudo mito certo e bonito se significasse mais do um discurso inflamado de uma festa de inauguração. Mas não podemos deixar de o ler e de o ouvir num contexto que o contradiz, porque se refere a edifícios com melhores condições, e a educação não se contenta com paredes bonitas. Acima de tudo exige alicerces que a sustentem e horizontes abertos que a norteiem.
A escola vale pelo projecto educativo que procura servir, ao lado de outros projectos nacionais, porque nem só na escola e com bons professores se aprende. Também é escola a “casa dos pais”, respeitados e ajudados, o testemunho público dos adultos e dos que têm posição social mais saliente, o ambiente que se procura perseverar dos inquinamentos malsãos, os estímulos normais que se dão aos alunos para que se interessem, estudem e preparem para a vida activa, as perspectivas de trabalho que se abrem a quem estudou, o clima de verdade e de justiça que se propicia na vida pública, o respeito pelas iniciativas legítimas dos cidadãos e das instituições… Um programa educativo para o país também não pode menosprezar, nem esquecer propostas válidas e testadas de projectos educativos inovadores, de avaliação dos resultados não apenas dos exames, mas do desempenho social daqueles em que o país investiu ao longo de anos nas escolas.
Um governante, porque tem de servir a todos e no respeito por todos, é um dirigente que não se pode deixar emparedar por interesses pessoais e partidários, e que se alguma ideologia política o domina, ela não pode orientar-se senão para o bem comum, democraticamente entendido e procurado, tal como não se deve rodear, se de tal for capaz, de burocratas inquinados e de jovens invertebrados, ansiosos de um poder, rápido e fácil, que ou manipulam chefe, ou outra palavra não têm senão o “sim” que sempre lhes agrada.
Certamente que é necessário melhorar muitos edifícios escolares, mas a escola é mais que o edifício. Quando numa política, vazia e suja, e por isso mesmo injusta, não se respeitam as escolas privadas, os seus alunos, professores e pais e projectos educativos, começa-se por menosprezar os seus edifícios, construindo ao lado de outros não necessários mas que terão placas de inauguração, com dados e nomes enviados do ministério… É por estas e por outras que duvido, e não apenas eu, das proclamações do primeiro-ministro em Braga, e dos outros governantes que, a seu mando, repetem o seu discurso por esse país fora.
D. António Marcelino
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