Jornal de Opinião

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26/10/09

"O Rei vai nu"!...

Conhecemos certamente a história do “rei nu”. Para alguém que a desconheça, apresento-a em poucas palavras.

Conta-se que um certo rei, muito vaidoso, se passeava nu pela cidade.
O alfaiate a quem o rei tinha encomendado um vestuário muito especial, não se julgando capaz de corresponder às sua altíssimas e reais exigências, tinha-o convencido de que o traje de nudez que lhe aconselhara, era tão belo e aprimorado que só podia ser visto por quem fosse muito inteligente. Os tolos não o podiam ver. Como ninguém queria passar por tolo, todos os que assistiam à passagem do rei, achavam que o rei ia… simplesmente magnífico!... Mas um miúdo, que estava a assistir ao cortejo no varandim da sua casa, astuto, sincero e espontâneo, ao ver o rei assim na rua, começou a gritar, rindo à gargalhada: - O rei vai nu!... O rei vai nu!... O rei vai nu!...

A história vem a propósito do seguinte:
Há anos, quando o escritor Saramago foi contemplado com o “Prémio NOBEL” pela Academia Sueca, tentei ler um ou outro dos seus livros, mas não consegui levar a leitura por diante. Os textos eram chatos e cansativos, eu não tinha tempo para ler e voltar atrás, uma e outra vez … e desisti. Nessa altura, pensei que a culpa era só minha: que não tinha capacidade para entender ou saborear a escrita do famoso Nobel.
Há uns tempos, porém, nuns dias de férias que consegui arranjar, adquiri numa livraria o “Memorial do Convento”, com a intenção de verificar se já era capaz de ler e de gostar. Insisti, teimei e consegui…mas não gostei.
Antes de continuar, e como parêntesis, quero deixar bem expresso o meu respeito sincero por todos os que gostam ou admiram a escrita de Saramago. Quem sou eu para ter razão… e os outros não?! Permitam contudo que eu possa dar o meu parecer, ao jeito da criança que gritava da janela. É um direito que me assiste e que ninguém certamente me negará.
Para mim, o texto de cada página é um emaranhado de ideias embrulhadas umas nas outras, sem ordem, sem nexo, sem ritmo e sem beleza literária. A gente lê, perde-se, tem de voltar a ler…a ver se consegue entender alguma coisa. Falta-lhe a beleza, o sabor, a simplicidade e a clareza dos textos deliciosos da nossa melhor literatura. Ler Saramago, para mim, é um martírio! Um suplício!
Ao escrever, Saramago não respeita as regras fundamentais de uma língua culta. A sua escrita parece português arcaico. Quase tão difícil de ler como os escritos dos hagiógrafos e dos cronicões medievais. Quanto a sinais de pontuação, o autor só conhece as vírgulas (que se repetem continuadamente), e os pontos finais (de longe a longe). Os períodos (frases entalhadas umas nas outras, sem nexo e sem sentido muitas vezes) são tão grandes e complexos que ocupam páginas inteiras. Chegando-se ao meio, a gente já não sabe o que lera no princípio. Perdeu-se o sentido do texto, a compreensão da mensagem, o prazer da leitura e a vontade de ler mais.
O vocabulário também é baixo. Por vezes, soez, reles e ordinário. Para o autor, os personagens do romance (rei, rainha, pajens, fidalgos, padres, frades, freiras e frequentadores das igrejas) são todos uns sabujos, uns tarados sexuais. Não há nenhum que seja íntegro ou respeitador de si e dos demais. O escritor, não respeita nada nem ninguém. Para além do mais, troça e achincalha tudo o que é religioso ou sagrado : Cristo, e tudo o que a Ele se refere ou relaciona. No romance em causa, o autor não passa de um sebáceo que não vê mais nada senão “porcaria”, em tudo, e em todos.
Só um período, para poderem constatar: Referindo-se à “Procissão do Corpo de Deus”, em Lisboa, e pondo D. João V a falar, diz o seguinte: ….“Cristo vai dentro dela (da Sagrada Custódia), dentro de mim a graça de ser rei na terra, ganhará qual dos dois, o que for de carne para sentir, eu, rei e varrasco, bem sabeis como as monjas são esposas do Senhor, é uma verdade santa, pois a mim me recebem nas suas camas, e é por ser eu o Senhor que gozam e suspiram segurando na mão o rosário, carne mística, misturada, confundida, enquanto os santos no oratório apuram o ouvido às ardentes palavras que debaixo do céu se murmuram, sobrecéu que sobre o céu está, este é o céu e não há melhor, e o Crucificado deixa pender a cabeça para o ombro, coitado, talvez dorido dos tormentos, talvez para melhor poder ver a Paula quando se despe, talvez ciumento de se ver roubado desta esposa, flor de claustro perfumada de incenso, carne gloriosa, mas enfim, depois eu saio lá lhe fica, se emprenhou, o filho é meu, não vale a pena anunciar outra vez, vêm aí atrás os cantores entoando motetes e hinos sacros, e isso me está fazendo nascer um ideia, não há como os reis para as terem, as ideias, senão como reinariam, virem as freiras de Odivelas cantar o Bendito ao quarto da Paula quando estivermos deitados, antes, durante e depois, ámen”. (1)
Gostaram, os leitores?
É provável que este e os outros livros de Saramago estejam na biblioteca de grande parte dos portugueses, mas eu, entretanto, atrevo-me a perguntar: quantos os lêem?

Post Scriptum
O texto que acabam de ler esteve guardado nos meus “excedentários” quase três anos, por me faltar a coragem de o publicar. Mas agora…e pensando que não estou sozinho…decidi trazê-lo à luz do dia. Dê para o que der. Como não ofendo ninguém…quem não concordar nem gostar, paciência.
A grande escritora Agustina Bessa Luís, ao “ESPECIAL 2 ANOS”, de 4 de Maio de 2006, disse: ---- Não gosto de ler Saramago. É uma escrita elitista!
Vasco Pulido Valente, historiador e comentador bem conhecido, em entrevista ao “Diário de Notícias”, também disse: - Saramago pensa tão mal como escreve. (Revista ” Sábado”, 6 de Julho de 2006)
No “Público” de 20 de Maio de 2006, veio uma crítica publicada no “Financial Times”, onde se afirmava: “…A escrita de Saramago é decididamente frustrante como ficção”; … “os romances de Saramago foram sempre impregnados pelas suas posições políticas”; “A sua tradutora para o inglês fez um trabalho notável, tornando claro, preciso e legível um texto palavroso e enrolado”. Se calhar, quem merecia o Nobel eram os tradutores…
Pela minha parte (espero que não me levem à guilhotina), com toda a humildade e com todo o respeito, mas também com toda a sinceridade, atrevo-me a dizer:
-O REI VAI NU!

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1) .-Saramago, José – “O Memorial do Convento” – Ed. Caminho / Agosto 05, pág. 163
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Resende, 25.10.09

J. CORREIA DUARTE


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