Jornal de Opinião

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08/09/09

Enlace de turismo contemplativo

O VI Simpósio do Clero de Portugal (1-4.09.09), com cerca de 1000 padres, tornou-se enlace e presente de contemplação. Na abertura, dia 1.09.09, e nos outros dias a contemplação foi dada como dimensão fundamental do sacerdote unida à formação permanente. Esta focagem ecoou de imediato em mim as ressonâncias de contemplação dos dias anteriores.
Em passeio, com familiares, para ir colaborar em sessão cultural à volta do Patrono da Casamata de S. João de Deus da Praça de Almeida, tinha contemplado dias antes cumes da serra do Açor com visões de paisagens deslumbrantes, salpicadas agora por centenas de eólicas (e nesse dia sem qualquer incêndio), de vales cavados e represas sigmoideias do Zêzere, das alturas da Serra da Estrela. A própria sessão sobre S. João de Deus e as Casamatas de Almeida realizou-se na Igreja da Misericórdia também ela um lugar de contemplação. Seguiram-se dois dias a contemplar planícies áridas de Castela; do vale do Jerte com miríades de pomares de cerejeiras em descida para Plasencia.
Houve celebração em lugares da grande densidade contemplativa nos Carmelos de Alba de Tormes e de Avila. Nuns viveu, morreu e está sepultada a “Contemplativa”; noutros nasceu no que é agora uma capela deslumbrante. Mais uma vez observei que os lugares que mais atraem visitantes, turistas e peregrinos por essa Europa são lugares de contemplação cristã e de oração. Por aqui grupos contínuos vêm recordar o “nada te perturbe, nada te espante; quem a Deus tem nada lhe falta; só Deus basta” (Santa Teresa). E a coincidência da celebração com o dia de Santo Agostinho (dia 28) convidava a ponderar: “o nosso coração está inquieto enquanto não repousa em Deus”, contemplando e adorando, porque só ele enche o coração do homem e a- nula o stresse corrosivo da agitação.
Os turistas da contemplação procuram também os lugares de S. João da Cruz, outro grande contemplativo da “noite escura”; e procuram, como eu, catedrais, suas obras de arte cristã, os seus quadros, os seus museus. Que força de atracção diferente cativa as pessoas nesses lugares de contemplação! Uma Europa sem os monumentos e lugares de contemplação perdia 70-80% da sua arte e da sua cultura. E lá vão eles, aos grupos, para a Catedral de Nossa Senhora da Assunção no “casco” antigo de Cáceres. Ali, caso curioso, o museu de peças de arte eucarísticas valiosíssimas: cálices, custódias, patenas, galhetas, turíbulos, está exposto e guardado na sacristia onde como tantos sacerdotes há séculos, me preparei para celebrar o mesmo mistério da presença de Jesus para quem esses objectos foram lavrados por artistas contemplativos que ornamentaram também a capela do Santíssimo e o belo retábulo de Nossa Senhora Elevada ao Céu em Corpo e Alma. Ali se ficam muitos a contemplar e a adorar (isto é, ad-orem (-boca), presos às palavras mudas da “boca” divina). Nós celebrámos nesta capela Eucarística o martírio daquele (João Baptista, dia 29) que anunciou com três anos de antecedência que Jesus é o Cordeiro de Deus a ser sacrificado pelo pecado do mundo e contemplado na cruz. E João no sacrifício da sua vida foi também seu precursor.
A indicação do secretário na abertura do simpósio do clero dava a recuperação da contemplação como a chave mestra do crescimento vocacional e do aumento do número dos sacerdotes. E sugeriu que seria tempo de suspender alguns métodos estatísticos e usar mais os contactos directos de sacerdote a jovens. Então e o marketing vocacional? Não foi falado. O dia 1 de Setembro coincidia, ainda, com a festa de outra grande contemplativa, Santa Beatriz da Silva, que na dimensão contemplativa do cárcere, onde a rainha a fechara, foi orientada por Maria, a concebida sem pecado, na vocação de fundar uma congregação monástica dedicada Àquela que contemplava todas essas coisas sobre Jesus no seu coração. Até indicou a Santa Beatriz as cores do hábito, azul e branco, aquelas cores que ficaram conhecidas como as da Imaculada e com as quais Ela, em Lurdes, foi contemplada por Bernardete. E a propósito, imagino que me levaram de vestido de branco com algum azul neste mesmo dia, em data distante, à pia baptismal no dia do meu Baptismo o qual me fez (com)templo em divinização, agraciado para poder contemplar.
Fátima, 4 de Setembro de 2009
Aires Gameiro

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